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Brasil – A abdicação de D. Pedro I

by Lucas Gomes


Pelo porto saíam os produtos, que apesar dos baixos preços,
sustentavam a base da economia nacional.

A oposição contra a política autoritária de D. Pedro I não cessou desde a Confederação do Equador. Os críticos questionavam, por exemplo, a opressão representada pelo Poder Moderador – instituído pela Constituição outorgada de 1824 – e o predomínio do Partido Português junto ao imperador, situação que contrariava muitos interesses.

Somavam-se ainda problemas econômicos e financeiros. Alguns remontavam aos primeiros momentos do recém-criado Estado, como o reconhecimento no exterior da emancipação política e a instalação do aparelho estatal necessário em todo o território. A guerra contra as Províncias Unidas do rio da Prata também aguçou a crise com gastos militares significativos, sustentados por novos empréstimos externos.

Neste período de dificuldades, segundo o economista Celso Furtado, (…) “num país sem técnica própria”, internamente a situação da agricultura era pouco promissora. Embora ao longo dos anos 20 do século XIX a empresa cafeeira “em gestação”, no dizer de Celso Furtado, tenha aumentado suas exportações, o mesmo não aconteceu com produtos tradicionais como o açúcar, o algodão e também com o fumo, os couros, o arroz e o cacau.

A baixa de preços no mercado internacional – que nos anos trinta e quarenta alcançaria o próprio café – ocorria devido às possibilidades de abastecimento, dos mercados externos, em outras regiões produtoras. A Comissão de Fazenda, em parecer, alertava, preocupada, para o fato de a agricultura estar (…) “ameaçada de repentina privação de forças”. Em um país de economia primário-exportadora a terra deveria ser fator de produção abundante.

Neste contexto, a principal fonte de arrecadação seriam as tarifas alfandegárias sobre produtos importados. Entretanto, a Inglaterra impôs, em agosto de 1827, um acordo comercial que limitava a cobrança destas tarifas ao máximo de 15%, conforme o valor do produto. Isto era muito pouco ante as grandes despesas que o Governo imperial enfrentava.

Para contornar a crise econômico-financeira buscou-se obter empréstimos externos, o que desagradou Martim Francisco de Andrada que entendia ser esta atitude (…) “um abismo, em que mais cedo ou tarde deviam ser precipitadas todas as nações; que os governos nunca adotariam, senão para oprimir mais facilmente os povos”.

Liquidação do Banco do Brasil em 1829 e o Agravamento da Crise

Como o Banco do Brasil achava-se também em dificuldades desde 1821, quando o rei D. João VI retirara todo o ouro nele depositado, pouco antes de retornar para Portugal, D. Pedro I ordenou a emissão de mais papel-moeda, o que causou a desvalorização da moeda e a elevação dos preços. O historiador Bóris Fausto assinala que nesta época não se usava a palavra “inflação” mas que (…) “o deputado mineiro Bernardo Pereira de Vasconcelos já falava em algo parecido quando aludia à ‘inchação’ do meio circulante”. A oposição parlamentar de contestação à política do imperador cresceu significativamente. Considerado “culpado” nesta história o Banco do Brasil teve determinada a sua liquidação em 1829.

O agravamento da crise, que deu origem até a falsificações de moedas de cobre – atingia especialmente a população urbana que, intranqüila, dirigia seus protestos contra os comerciantes que controlavam a maior parte do comércio varejista. Uma parte destas reclamações vinha das elites que viam encarecer inúmeros bens de consumo, oriundos das nações “civilizadas” européias, devido às sucessivas desvalorizações da moeda brasileira frente à libra inglesa na década de 1820.


A Corte Brasileria apoiava D. Pedro I temendo
perder os privilégios políticos adquiridos.

Oposição e Apoio ao Governo de D. Pedro I

Pelas ruas das cidades, em meio à circulação de escravos e homens livres e pobres que perambulavam ocupando-se de trabalhos nem sempre lícitos, ouvia-se “mata português” e “mata marinheiro”. Estes gritos de contestação também eram dirigidos a D. Pedro I, encarado como protetor daqueles comerciantes reinóis. Na imprensa, a pessoa do imperador não era menos poupada. O jornalista Borges da Fonseca chamava-o de “caríssimo”, não no sentido de ser querido, mas no de ser dispendioso para o Tesouro.

Toda esta intranqüilidade visível nas ruas da cidade inquietava igualmente aquela parcela da população, livre e proprietária, que pressentia uma desordem ameaçadora.

Os descontentamentos iam aprofundando os abismos e liquidando o pouco que restava de simpatia pelo imperador entre os brasileiros.

D. Pedro I, contudo, não estava sozinho para enfrentar a oposição movida pelo Partido Brasileiro. Contava com o apoio do Partido Português, que ampliara sua influência, bem como dos proprietários de escravos e de terras, beneficiados com vantagens e títulos honoríficos fartamente concedidos.

Na Corte comentava-se muito a influência exercida na direção dos negócios públicos, de um “gabinete secreto” conduzido pelo conselheiro Francisco Gomes da Silva, o Chalaça. Falava-se também que José Clemente Pereira tramava a restauração do absolutismo. A sociedade secreta Coluna do Trono também pretendia o absolutismo, contando com o apoio dos portugueses que nela viviam. A impopularidade de D. Pedro I se expandia. No Nordeste, na surdina, revelava-se em versos que diziam:

(…) “Acabamos assim,
Morram todos os corcundas
Do Icó, Crato e Jardim”.

Pretendendo contornar a oposição, em fevereiro de 1829, o imperador chamou o Marquês de Barbacena para organizar um novo ministério. Apesar de parecer, agindo assim, que cedia aos que desejavam um governo parlamentar, D. Pedro I não se afastara dos interesses dos que o apoiavam. Enviou à Europa o Marquês de Santo Amaro com a missão de obter o apoio da Santa Aliança para reconquistar a Província Cisplatina e para restaurar os direitos ao trono de Portugal de sua filha Dona Maria da Glória, usurpados por seu tio e esposo D. Miguel.

Em meados de setembro de 1830 chegava ao Rio de Janeiro a notícia de que, na França, uma revolução de caráter liberal derrubara Carlos X do trono, dando lugar ao Governo de Luís Felipe. Este fato repercutiu no Brasil animando a oposição na imprensa e na Câmara. O jornalista Evaristo da Veiga escreveu na Aurora Fluminense que aquele ano era “o da liberdade não já na Europa, mas no mundo inteiro.” Na Câmara, Bernardo Pereira de Vasconcelos afirmava que a França salvara (…) “a liberdade do mundo civilizado”. Acrescentava também que iria pedir (…) “ao povo para que resista em massa contra toda a invasão que houver em dano das suas liberdades e dos seus direitos e também para derribar as cabeças que ainda tentarem sujeitá-lo à escravidão.” O gabinete do Marquês de Barbacena foi demitido em meio a estes acontecimentos.


Libero Badaró no seu leito de morte,
aquarela de Hércules Florence

A Morte de Líbero Badaró e o Agravamento da Crise

Os distúrbios cresceram com a morte do jornalista italiano Giovanni Baptista Líbero Badaró, fundador em São Paulo do Observador Constitucional, que refletia na Província, o clima tempestuoso que irradiava da Corte. Os acontecimentos se precipitavam. Os componentes do Partido Português exigiam, cada vez mais, o imperador sem as Câmaras.

Em dezembro de 1830 o jornalista Borges da Fonseca escrevia (…) “O Brasil quer ser monárquico-constitucional e jamais sofrerá que um ladrão coroado se sente no trono que a Nação ergueu para assento de um monarca constitucional”.

Em fevereiro de 1831, o imperador visitou Minas Gerais. Ao chegar em Barbacena e em outras cidades da Província, por concidência ou não, os sinos repicavam o toque de finados pela morte de Líbero Badaró. Parte da população hostilizava o imperador havendo até quem murmurasse que (…) “quando sai das vilas, leva pedradas as casas em habitou e têm sido assobiados alguns dos que mais o obsequiaram.” A situação chegara a tal ponto que, segundo o historiador inglês John Armitage, (…) “bastava alguém aceitar cargo no Governo para ficar impopular.”

D. Pedro I retornou ao Rio de Janeiro a 11 de março encontrando a oposição nas ruas, tomando espaços, contestando. Os conflitos culminaram na noite de domingo, 13, quando um grupo mais exaltado atacou casas dos “pés de chumbo” – portugueses, que responderam jogando garrafas num episódio que ficou conhecido como Noite das Garrafadas.

O imperador, pressionado por toda a situação – após um manifesto redigido por vinte e três deputados e pelo senador Vergueiro – nomeou, a 19 de março, um novo ministério formado por políticos mais liberais. Entretanto, a oposição não cessou. No dia 25 de março, comparecendo à cerimônia de comemoração do sétimo aniversário da Constituição Imperial, D. Pedro I ouviu gritos de “Viva o imperador enquanto constitucional” e “Viva D. Pedro II.”

A Abdicação de D. Pedro I

Nos primeiros dias de abril as ruas viviam momentos de grande inquietação: grupos exaltados passaram a defender a necessidade de um Governo republicano. A imprensa pregava “o dever sagrado da resistência à tirania”. A pressão continuava e no dia 5 de abril D. Pedro I constituiu um novo ministério – o Ministério dos Marqueses – no dizer do historiador Werneck Sodré, (…) “todos notáveis pela sua impopularidade”. No dia 6, desde o amanhecer, numerosos grupos concentraram-se no Campo da Aclamação – local onde D. Pedro fora feito Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil – onde circulavam boatos de represálias do imperador à oposição. Exigia-se o retorno do gabinete formado por liberais brasileiros. O monarca teria respondido então: “Tudo farei para o povo, mas nada pelo povo.” Às 23 horas, à população ali reunida, vieram juntar-se os corpos de tropa sob o comando do brigadeiro Francisco de Lima e Silva.

Na madrugada do dia 7 de abril de 1831, não conseguindo contornar a crise, D. Pedro I apresentou o ato de abdicação ao trono. Naquela mesma madrugada deixou o palácio sem se despedir do filho de cinco anos, seu herdeiro, mas enviando-lhe posteriormente uma correspondência na qual assinalava que (…) “me retiro para a Europa (…) para que o Brasil sossegue, o que Deus permita, e possa para o futuro chegar àquele grau de prosperidade de que é capaz. Adeus, meu amado filho, receba a bênção de seu pai, que se retira saudoso e sem mais esperança de o ver.”

Entre a data da abdicação e a da partida para Portugal, D. Pedro I enviou algumas outras correspondências como, por exemplo, a José Bonifácio, nomeado tutor do príncipe D. Pedro de Alcântara, em que dizia: (…) “eu delego em tão patriótico cidadão a Tutoria do meu querido filho, e espero que educando-o naqueles sentimentos de honra e de patriotismo com que devem ser educados todos os soberanos (…), ele venha um dia a fazer a fortuna do Brasil de quem me retiro saudoso.”

No dia 8, de abril, D. Pedro I envia uma mensagem à Assembléia em que comunica ter nomeado como tutor de seu filho – segundo a Constituição, capítulo V, art. 130 – José Bonifácio de Andrada e Silva e pede (…) “à Augusta Assembléia Geral que se digne confirmar esta minha nomeação. Eu assim o espero, confiado nos serviços que de todo o meu coração fiz ao Brasil, e em que a Augusta Assembléia Geral não deixará de querer aliviar-me desta maneira um pouco as saudades, que me atormentam, motivadas pela separação de meus caros filhos e da Pátria, que adoro”.

Enquanto isto pelo Rio de Janeiro segundo o historiador Pedro Calmon, circulavam estes versos, “em clima tão ao sabor da Independência”:

“Passa fora pé de chumbo
Vai-te do nosso Brasil
Que o Brasil é brasileiro
Depois do 7 de Abril”.

Fontes: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro – Secretaria da Educação

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