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A queda do Império Romano

by Lucas Gomes

A chegada dos hunos e a ameaça visigótica

As antigas crônicas chinesas mencionavam um povo nômade e guerreiro das estepes asiáticas, denominado Xiong-Nu os hunos. Parentes dos turcos, os hunos ganharam a fama de guerreiros invencíveis. Com seus inseparáveis cavalos, eram também considerados os mais hábeis cavaleiros do mundo. No século IV, apesar da Grande Muralha chinesa, os hunos conquistaram o norte da China. Enquanto isso, outro grupo, o dos hunos ocidentais, rumava para o oeste. Em 370, depois de atravessarem os rios Volga e Don, esses hunos entraram em contato com os ostrogodos, no sul da Rússia, e derrotaram-nos em 375. Os ostrogodos que não aceitaram submeter-se fugiram para o Ocidente e se juntaram aos visigodos. Mas estes, pressionados pelos hunos, inimigos que julgavam incapazes de vencer, suplicaram ao imperador da parte oriental do Império Romano, Valente (364 – 378), a permissão para ingressar em seus domínios. Perto de 200 mil visigodos atravessaram o Danúbio, com autorização imperial, para se instalar no território romano da Ilíria. Foi um erro do imperador. Uma vez em segurança, os visigodos marcharam em direção ao Mediterrâneo, pilhando o que encontravam pelo caminho. Valente deu-se conta do erro e, confiante, resolveu enfrentar os visigodos em Adrianópolis, em 9 de agosto de 378, mas teve seu exército aniquilado pela cavalaria visigótica e ele próprio foi morto. Felizmente para os romanos, Teodósio (379 – 395), sucessor de Valente, impediu que os visigodos tomassem Constantinopla, forçando-os a fazer um acordo pelo qual deveriam instalar-se na Trácia como federados.

Saque de Roma por Alarico (410)

Com a morte de Teodósio em 395, os visigodos, chefiados por Alarico, reiniciaram os ataques, ameaçando Constantinopla. Mediante negociação diplomática, foram desviados para a Grécia, que saquearam e destruíram durante anos, sobretudo Corinto e as cidades do Peloponeso. Em 401, após novas negociações diplomáticas, as autoridades de Constantinopla fizeram com que Alarico fosse para a Itália. Lá chegando, depois de duas tentativas, os visigodos cercaram a cidade de Roma, nela penetrando na noite de 24 de agosto de 410. Durante três dias Roma foi saqueada e incendiada. No dia 27, Alarico evacuou a cidade, levando consigo reféns, entre os quais a irmã do imperador. Tomando a direção sul, destruiu Cápua e atingiu o estreito de Messina. De lá pretendia passar para a Sicília e tomar depois o rumo da África, onde pretendia se fixar. Porém, sua morte súbita, ainda naquele ano, fez os visigodos mudarem de plano.

Enquanto o Império estava ocupado em defender-se dos visigodos, uma série de ondas invasoras se iniciava no norte, o que acabaria resultando na queda do Império Romano Ocidente.

A primeira onda: a grande invasão de 406

No dia 31 de dezembro de 406, em meio a um rigoroso inverno, uma federação informal de tribos germânicas, composta pelos suevos, vândalos e alanos, pressionada pelos hunos, atravessou o Reno e devastou a Gália. Pela brecha aberta entraram em seguida os burgúndios, que se instalaram entre Worms e Spira, na Alemanha atual, e os alanos, que ocuparam a Alsácia.

Em 409, os germânicos daquela federação informal passaram para a Espanha. Essa província era mais pobre do que a Gália e, submetida à pilhagem, nela espalhou-se a fome, que dois anos depois atingiu também os invasores. Sem alternativas, os germânicos viram-se obrigados a negociar com o Império e aceitar a condição de federados. Os suevos se estabeleceram ao norte do rio Douro, os vândalos na região de Sevilha e os alanos no planalto central da Espanha.

A reconciliação dos visigodos

Alarico teve como sucessor Ataulfo, seu cunhado, que procurou reconciliar os visigodos com o Império. Depois de demonstrar sua lealdade aos romanos combatendo um rival de Honório (395 – 423), imperador do Ocidente, os visigodos foram admitidos como federados na Aquitânia, no sul da Gália. Ataulfo foi assassinado por um de seus criados em 415 e sucedido por Wallia, que reafirmou lealdade a Roma.

A partir de 415, o Império se conformou com a presença germânica em seu território e procurou incorporá-los, colocando-os a seu serviço, como outrora fizera com tanto sucesso nas províncias.

A desintegração do Império Romano do Ocidente

A partir de 406, com a grande invasão, a unidade do Império Romano do Ocidente encontrava-se seriamente comprometida. Depois de se instalarem na Espanha e serem admitidos como federados, os vândalos romperam o tratado com o Império e reiniciaram seu movimento expansionista. Chefiados por Genserico, um rei enérgico, os vândalos – os únicos bárbaros que possuíam uma frota – cruzaram o estreito de Gibraltar em 429 e chegaram dez anos depois a Cartago, estabelecendo um extenso domínio no norte da África.

Os visigodos, que haviam ocupado a Aquitânia, expandiram o seu domínio para a Espanha (418). Os burgúndios (nome do qual veio Borgonha) penetraram na Gália, no rastro da grande invasão de 406, e se estabeleceram na Sabóia, incorporando a partir de 458 os vales do Saona e do Ródano, fundando aí o seu reino.

Esses invasores germânicos, teoricamente federados e obedientes a Roma, haviam estabelecido, na realidade, domínios soberanos e independentes. A unidade imperial do Ocidente tornara-se, de fato, uma ficção.

Contudo, essa primeira onda invasora germânica foi levada a cabo por povos que haviam sofrido forte influência romana. Não tinham, por esse motivo, o objetivo de destruir o Império. Esse fato foi demonstrado por ocasião dos perigosos ataques desferidos pelos hunos.

A invasão dos hunos no Ocidente

Depois de terem atacado os germânicos na Europa oriental, provocando a grande invasão de 406, os hunos se estabeleceram na região atual da Hungria, na bacia do Danúbio. O Império do Oriente temia ser atacado e, para prevenir essa eventualidade, Constantinopla comprou a paz, literalmente a peso de ouro, entregando 6 mil libras desse metal aos hunos, em 443. Em 450, tendo à frente um imperador com maior firmeza, Marciano (450 – 457), Constantinopla recusou-se a renovar o pagamento daquele tributo.

Desde 439, os hunos eram governados por um rei de forte personalidade, chamado Átila. Por razões desconhecidas, sob sua liderança os hunos renunciaram às suas pretensões no Oriente e decidiram invadir o Ocidente. Assim, pela segunda vez, o Império Romano do Oriente se salvou à custa do Império Romano do Ocidente.

Contra esses invasores asiáticos formou-se no Ocidente uma forte coligação romano-bárbara. Quando os hunos chegaram à Gália, em 451, eram esperados por esse exército de forças conjugadas, que incluía alanos, burgúndios, francos, saxões e visigodos – os aliados bárbaros de Roma.

Repelidos da Gália, os hunos, depois de refazer as suas forças, voltaram à Itália, em 452, sitiando, destruindo e saqueando suas cidades. Caminharam diretamente para Roma, cujos habitantes entraram em pânico. Para incredulidade geral, o papa Leão I, o Grande (440 – 461), tomou a iniciativa de negociar com Átila, ao qual ofereceu uma enorme riqueza para abster-se do ataque a Roma. Para surpresa de todos, Átila aceitou a oferta e se retirou da Itália. Dois anos depois, quando se preparava para novas campanhas no Oriente, sofreu morte súbita na noite de núpcias de mais um de seus casamentos. Com a morte de Átila, a unidade dos hunos se desintegrou.

A queda de Roma

A união temporária romano-bárbara contra os hunos não eliminou a instabilidade interna em que se encontrava a parte ocidental do Império. Em 476, um grupo de bárbaros composto por hérulos e godos, que serviam como mercenários em Roma, estava reivindicando o estatuto de federados, o que lhe daria o direito de obter terras e, aos chefes, o direito de receber tributos. Diante da negativa imperial, um desses chefes, Odoacro, um hérulo, tomou a iniciativa de derrubar o fraco imperador Rômulo Augústulo (475 – 476) e assenhoreou-se da Itália, coroando-se rei. Desaparecia, assim, o Império Romano do Ocidente.

Os fatores da queda de Roma

Desde a morte de Teodósio, em 395, as duas partes do Império ocidental e oriental foram se diferenciando. Essa diferença era particularmente notável em relação à capacidade de defesa diante das ameaças germânicas. Exemplo disso foi a incapacidade do Ocidente romano de livrar-se da crescente importância dos germânicos nas forças armadas. Constantinopla conseguiu afastar os germânicos do comando e retomou o controle sobre o exército. Em Roma, ao contrário, o exército permaneceu estruturalmente germanizado, apesar dos esforços em contrário.

Um dos fatos decisivos para a queda de Roma foi a amplitude das fronteiras do Ocidente romano, o que impossibilitava que fossem totalmente guarnecidas. Para sua infelicidade, ocorreu também que as migrações germânicas tomaram clara e decididamente a direção ocidental. Nesse ponto, a divisão do Império consumada por Teodósio foi altamente negativa para o Ocidente, pois a defesa dos ataques germânicos contra o Ocidente não contou com uma ação coordenada diante de um inimigo comum. Para piorar a situação, a parte oriental, encabeçada por Constantinopla, usava meios diplomáticos para desviar os germânicos para o Ocidente, como aconteceu com os visigodos.

Desde o tempo de Teodósio (378 – 395), a pressão germânica sobre o Ocidente não parou de crescer. Naturalmente, para fazer frente às ameaças externas, Roma viu-se na contingência de assegurar a arrecadação de impostos. Porém, a sua base econômica debilitada suportava cada vez menos o ônus da defesa. Como conseqüência, o peso da situação foi minando gradualmente a parte ocidental, acarretando um grave processo de decomposição. Assim, Roma viu-se num terrível círculo vicioso: as incursões germânicas desorganizavam a economia, reduzindo a capacidade dos romanos de pagar impostos e, em conseqüência, enfraqueciam o poder militar do Estado. Paralelamente, outro fator, não menos importante, atuava contra a parte ocidental: à medida que o Estado se enfraquecia, a nobreza latifundiária, muitas vezes aliada aos chefes militares, reforçava a sua autonomia, aprofunda aprofundando a debilidade do governo imperial. Tudo isso ocorria no exato momento em que as ameaças germânicas requeriam, mais do que nunca, uma ação coesa e coordenada do Estado. Essa desintegração interna do Império Romano do Ocidente contribuiu decisivamente para o êxito dos ataques germânicos. A facilidade com que Odoacro se apossou de Roma, depondo Rômulo Augústulo em 476, mostrou a extrema vulnerabilidade a que havia chegado o Império Romano do Ocidente.

O fim do mundo antigo e o início da Idade Média

A metade oriental do Império Romano sobreviveu até 1453. Desapareceu, portanto, 977 anos depois da queda de Roma e da fundação do reino de Odoacro na Itália, em 476. Nessa última data, segundo os historiadores, terminou o mundo antigo e teve início a era medieval. Esta situa-se entre a queda de Roma (476) e de Constantinopla (1453), isto é, entre o fim do Império Romano do Ocidente e o fim do Império Romano do Oriente, também chamado Império Bizantino.

Quando Roma desapareceu como centro do Império, ainda sobrevivia no Mediterrâneo oriental uma grande civilização da Antiguidade, a dos persas, que a partir de 226 constituiu o Império Sassânida. Este, juntamente com o Império Romano do Oriente, representava a continuidade do mundo antigo.

Já na parte ocidental, com achegada dos germânicos, iniciou-se um longo processo de fusão entre estes e a tradição romana, que só iria ganhar contornos precisos com a constituição do feudalismo, a partir do século IX.

A região do Mediterrâneo, que era o centro em torno do qual girava o mundo antigo, não havia sofrido, apesar da invasão germânica, uma ruptura com a Antiguidade. Esta ocorreu, efetivamente, a partir de meados do século VIII, com a expansão árabe-islâmica. Os árabes representaram um dado completamente novo no cenário mediterrânico. Sua inesperada irrupção levou de roldão o Império Sassânida, pondo fim a uma história de doze séculos da antiga Pérsia, e conquistou também dois terços dos territórios do Império Bizantino. Foram, portanto, os árabes que alteraram por completo o quadro político vigente até então no Mediterrâneo, colocando um ponto final na história do mundo antigo.

Fonte: Cultura Brasil

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