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O ataque das superbactérias

by Lucas Gomes

Não se pode perceber, mas somos um ecossistema ambulante. Noventa trilhões
de micróbios habitam nosso corpo – na maioria das vezes, harmonicamente.
Só existe saúde e energia onde existem muitas, muitas bactérias
do bem. Uma pop star como Madonna, por exemplo, não teria músculos
invejáveis nem seria capaz de dar tantas piruetas se não estivesse
colonizada por exércitos desses microorganismos. Em seu corpo bem cuidado,
Madonna carrega 2,4 quilos de bactérias. Quer saber qual é a população
que mora em você? Basta dividir seu peso por 20. Os habitantes invisíveis
ocupam a pele, a boca, o estômago, os genitais – o corpo todo.

MOSAICO VIVO
Coloridas artificialmente, as bactérias que mais ameaçam a
humanidade são até fotogênicas. Mas não se engane:
elas podem ser fatais

Desempenham inúmeras funções, entre elas vencer bactérias
maléficas. Nos últimos anos, no entanto, a vida das bactérias
do bem tem ficado mais ameaçada. O uso irracional de antibióticos
levou ao surgimento de uma nova geração de bactérias do
mal capaz de resistir a todas as armas. Essas superbactérias matam as
bactérias benéficas e não podem ser contidas pela maioria
das drogas. Às vezes, por nenhuma delas. Infecções causadas
por bactérias resistentes podem afetar qualquer um – os jovens
e os velhos, as pessoas saudáveis e as cronicamente doentes.

As superbactérias costumam ser encontradas primordialmente nos hospitais.
É um ambiente propício a elas porque lá os organismos em
que vivem (nossos corpos) estão debilitados por doenças e, portanto,
são menos capazes de lutar contra elas. Além disso, o ambiente
fechado favorece a contaminação – apesar dos cuidados extremos
de limpeza. O problema, agora, é que elas deixaram de ficar restritas
aos hospitais. Nos Estados Unidos, já foram identificadas em ginásios
de esporte, academias, universidades, prisões. Os surtos provocados por
uma única bactéria, a Staphylococcus aureus resistente à
meticilina (MRSA), afetaram centenas de milhares de pessoas e mataram 19 mil
no país apenas em 2006. O ataque das superbactérias continua.

O mesmo pode ocorrer no Brasil? A resposta, simples e direta, é sim.
O Brasil está preparado para enfrentar uma praga como essa? A resposta
é não. “Há dez anos, quase todos os casos de MRSA
ocorriam nos hospitais. Agora ela está em todos os lugares”, disse
Robert Moellering, professor da Harvard Medical School, à revista The
New Yorker. A bactéria destrói a membrana dos glóbulos
brancos, danificando as defesas primárias do corpo contra o micróbio.
Surgem erupções na pele e inúmeras inflamações
internas. O que no início pode parecer um simples resfriado revela-se
uma doença fatal, capaz de matar a vítima por infecção
generalizada em poucos dias. Cerca de 50% dos infectados atendidos no Hospital
da Criança da Universidade de Chicago morrem. Quando o microorganismo
não é sensível à meticilina, à oxacilina
e a outras drogas semelhantes, os médicos têm uma única
opção. É a vancomicina, uma droga intravenosa considerada
como último recurso. Ela pode salvar o doente. Mas o custo total de tratamento
de um paciente nessas condições pode chegar a US$ 40 mil.

Recentemente foram relatados vários casos de MRSA parcialmente resistente
até mesmo à vancomicina. E o pior: há no mundo pelo menos
sete casos documentados de total resistência à droga. Essa bactéria
resistente parece ter saído dos hospitais pegando carona nas mãos
e nas roupas de médicos e visitantes. Pacientes dispensados do hospital
e tratados da infecção em casa também podem disseminar
a bactéria.

Mais de 2 mil casos de infecção por MRSA adquirida fora dos hospitais
foram registrados no Uruguai. Alguns casos esporádicos já foram
relatados em cidades gaúchas próximas à fronteira. “Ninguém
pede passaporte para as bactérias. Se vou ao Uruguai e troco um aperto
de mão com uma pessoa infectada, posso trazer a bactéria comigo
na volta ao Brasil”, diz Flávia Rossi, diretora do laboratório
de microbiologia do Hospital das Clínicas em São Paulo.

Nem todas as pessoas que têm contato com a bactéria adoecem. O
risco é maior em crianças e idosos porque eles costumam ter o
sistema imune menos fortalecido. Pela mesma razão, outros grupos podem
adoecer gravemente se forem infectados: portadores do HIV, pessoas em tratamento
contra o câncer, transplantados ou doentes crônicos, como diabéticos.

Outro exemplo é a Klebsiella pneumoniae. Ela tem formato oval
e uma camada externa dura e cheia de açúcar. Essa cápsula
dificulta o trabalho dos glóbulos brancos, que não conseguem engolfá-la
e destruí-la. Pessoas saudáveis podem viver muito bem com a bactéria.
Os que estão debilitados, no entanto, costumam adoecer gravemente. Em
2000, uma cepa da bactéria foi isolada de um paciente da UTI do hospital
da Universidade de Nova York. Ela resistia à maioria dos antibióticos.
Nem amônia e desinfetantes poderosos conseguiam eliminá-la das
instalações do hospital. Vários pacientes foram infectados.
Além de pneumonia, sofreram infecções sanguíneas
e no trato urinário provocadas pela Klebsiella. Dos 34 pacientes
infectados no hospital naquele ano, quase metade morreu.

Fonte: Revista Época

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