Home EstudosSala de AulaGeografia Demografia – Imigração Japonesa: 5. Paraná: o lado oriental do sul do Brasil

Demografia – Imigração Japonesa: 5. Paraná: o lado oriental do sul do Brasil

by Lucas Gomes


A celebração anual do Bon-Odori, em Assaí, Paraná

O norte do Paraná tem algumas características marcantes: altas temperaturas
no verão, uma terra fértil e densa que tinge as roupas brancas de
vermelho e a forte marca da cultura japonesa, estabelecida a partir dos anos 1930,
quando os imigrantes começaram a chegar ao Estado. São várias
as cidades da região que exibem olhos rasgados em grande quantidade, mas
Assaí, a 49 quilômetros de Londrina, é especial. Surgiu unicamente
em função dos imigrantes e, ao lado de Bastos (SP), é o município
com maior proporção de japoneses, porcentual que chega a 15% da
população.
A ampliação da colônia no Paraná está diretamente
relacionada às restrições do plantio do café no
Estado de São Paulo. Embora desde 1913 a região de Cambará
já contasse com uma Vila Japonesa, foi somente após a queda da
Bolsa de Nova York, em 1929, que as companhias de imigração começaram
a olhar para fora do território paulista.

Com o incidente financeiro internacional, o governo paulista proibiu o plantio
de pés de café e os grandes capitalistas japoneses que investiam
em atividades agrícolas começaram a comprar terras no Paraná
e a revender aos imigrantes. Assim, em 1932, surge Assaí, inicialmente
batizada como núcleo Três Barras. A opção pelo novo
nome não poderia ser mais apropriada: Assaí quer dizer sol nascente.

Assim como encontraram dificuldades ao chegar a São Paulo, os imigrantes
do norte do Paraná também tiveram de exercitar a alma de desbravadores.
Logo de início, o caminhão que a Companhia de Imigração
Bratac utilizava para transportar pessoas, ferramentas e mantimentos foi solicitado
pelo governo paulista, por conta da Revolução de 1932. A única
saída era usar carroças e carros de boi, que tornavam tudo mais
lento e cansativo.

Entre os anos de 1932 e 1939, chegaram 365 famílias de imigrantes a
Assaí, mas não eram pessoas vindas diretamente do Japão.
A grande maioria já conhecia o modo de vida brasileiro e tinha um histórico
de trabalho em fazendas de São Paulo.

Esse é o caso, por exemplo, dos Koguishis, que desembarcaram no Brasil
em 1930, ficaram cinco anos trabalhando nas fazendas de Cafelândia (SP)
e depois foram para Assaí, precisamente para a comunidade rural do Palmital.
“Meus pais nasceram em Mie-Ken, mas eu nasci aqui. Todos os meus sete irmãos
e eu. No começo a vida era difícil, tinha de caminhar 10 quilômetros
até o comércio mais próximo. E na mata tinha onça”,
recorda Cairo Koguishi, de 65 anos. “Meu avô guardava a espinha de
peixe para cozinhar com o arroz, pois só tinha carne seca para comer.”

Costume

A família Koguishi mora até hoje na zona rural e mantém
os costumes japoneses. Na geladeira da casa não faltam moti, o bolinho
de arroz tradicional do ano-novo, nem peixe para Nair Yoko, de 65, mulher de
Cairo, fatiar o sashimi. Ao conversar ao telefone, o casal mistura o japonês
e o português. Sem falar que Nair é uma grande artesã da
jardinagem, outro forte costume do Japão.

Cairo também acompanhou a tradição da família japonesa,
cursou agronomia para dar continuidade aos negócios do pai – e dois dos
quatro filhos do casal seguem o mesmo rumo e atuam na propriedade. “Mas
aquela coisa de japonês quieto e que não pergunta não é
comigo. Eu sempre fui curiosa e tomava muita bronca dos meus pais”, recorda
Nair, realmente falante e enérgica.

Juventude

Manter a tradição não depende apenas dos mais velhos.
Não é difícil encontrar na cidade adolescentes dispostos
a perpetuar a cultura japonesa. Todos os domingos, Anderson Watanabe, de 19
anos, ajuda a coordenar os ensaios do grupo de Taikô, a percussão
milenar japonesa.

“Eu nasci aqui, fui para o Japão e morei lá até os
5 anos. Tenho a cultura japonesa muito forte em mim”, explica Anderson.
“O Taikô é uma filosofia de vida, tem de sentir o som para
fazer sentido.” Fã de mangá, animê e J-Pop, a música
pop japonesa, ele também prefere manter a tradição na hora
de escolher as namoradas. “Não tenho nada contra as brasileiras,
mas sempre olho primeiro para as japonesas.”

Londrina: a cidade de madeira


Kumata e sua casa, construída pelos antigos mestres

Nos anos 1940, Londrina era uma cidade de madeira. Explica-se: com a derrubada
das árvores para a expansão da agropecuária, matéria-prima
não faltava. E a chegada dos imigrantes japoneses, muitos deles mestres
da carpintaria, tradicional ofício no Japão, só veio a
facilitar a construção desse tipo de residência.

As casas foram ornamentadas com elementos nipônicos, como a ranma, um
enfeite rendilhado de madeira. E ganharam espaços típicos das
construções japonesas, caso da varanda cerimonial e da guenkan,
onde os visitantes deixam os sapatos antes de entrar.

“A pré-numeração de peças e os vários
encaixes fizeram surgir a lenda de casas sem pregos, construídas em instantes”,
conta o arquiteto Humberto Yamaki, professor da Universidade Estadual de Londrina
(UEL).

Com a alvenaria e a modernização das residências, as construções
típicas dos imigrantes foram derrubadas e hoje são raras na cidade.
O arquiteto agora se esforça para salvar o que ainda sobrou dessas residências.
Tanto que uma das casas tradicionais será desmanchada e remontada no
câmpus da universidade, aumentando o acervo que vem sendo organizado pelo
professor sobre essa intrincada arte japonesa.

Yamaki já conseguiu recolher inúmeras ferramentas dos antigos
mestres carpinteiros. Entre as peças estão o nokoguiri, o serrote,
e a tyouná, desbastador de madeira, que tem o sentido de corte oposto
ao das ferramentas ocidentais. “Dizem que o número de ferramentas
utilizadas pelos carpinteiros chegava a 180”, explica Yamaki. “Essas
ferramentas foram essenciais na adaptação de técnicas milenares
japonesas, baseadas em complexos encaixes.”

Original

A vizinha cidade de Assaí ainda exibe algumas residências construídas
pelos carpinteiros japoneses. Uma delas pertence ao dentista Yukio Kumata, de
74 anos. “Há, tempos, teve uma lei que garantia isenção
de IPTU para quem mantivesse a fachada original”, conta Kumata. “Hoje,
isso não existe mais, mas resolvi manter a casa assim. É mais
bonito.”

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