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Carnaval, de Manuel Bandeira

by Lucas Gomes

Manuel Bandeira publica em 1919 o seu segundo livro de poemas intitulado Carnaval.
Nessa obra já faz uso do verso livre. Por isso, os modernistas viram em Manuel
Bandeira um precursor do movimento Modernista.

Nessa obra percebermos que o poeta vai mais e mais se
engajando com os ideais modernistas. Em Carnaval temos ainda o início da
libertação das formas fixas e a opção pela liberdade formal, que se tornaria uma
das marcas registradas de sua poesia.

Poema escolhido

OS SAPOS

Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
– “Meu pai foi à guerra!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: – “Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas…”

Urra o sapo-boi:
– “Meu pai foi rei” – “Foi!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
– “A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quando é vário,
Canta no martelo.”

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
– “Sei!” – “Não sabe!” – “Sabe!”

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No porão profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio…

1918.

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