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Os chineses: 1. Do início até a Dinastia Shang

by Lucas Gomes


Trecho das Muralhas da China, em Badling

A história da China tem mais de quatro mil anos. Durante a Idade Média, a ciência e as artes chinesas eram
mais avançadas do que as européias. Os chineses inventaram o papel, a impressão, a pólvora, e tinham grande
talento para a poesia, pintura, teatro e cerâmica. Depois, sua grandeza caiu, e por muitos anos sofreu com
pobreza, revoluções e guerras.

Na Europa, os estudos sobre a China foram bastante imprecisos até o início da Era moderna. Antes disso,
versões históricas como a de Marco Pólo, atualmente bastante discutíveis, eram utilizadas e aceitas como
adequadas.

A virada nessas concepções veio com o impacto das navegações mundiais realizadas no século XVI. Ao se
depararem com uma realidade bem diferente daquela concebida pelos seus antecessores medievos, portugueses e
espanhóis tiveram que por mãos à obra e iniciaram uma pesquisa maior sobre as civilizações do Oriente,
ainda que sobre o seu prisma colonialista e essencialmente cristão. A iniciativa lusa, em especial, rendeu
frutos, já que os missionários por eles levados para as colônias orientais foram, por muito tempo, a fonte
principal de informações que toda Europa recebia. Com grande sucesso, os mesmos conseguiram se instalar nas
cortes chinesas, possuindo uma significativa influência na assessoria aos assuntos estrangeiros até o
século XVIII.

Vejamos a Cronologia tradicional que coloca a cultura chinesa como uma das mais antigas do mundo, junto com
as da Índia e do Médio Oriente:

Períodos Tradicional Moderna Arqueologia
3 patriarcas e 5 soberanos: 2852 –
2205 a.C.
Período Proto-Histórico
Imperador Yao: 2356 – 2255 a.C. Cerâmica Preta e Pintada
Imperador Shun: 2852 – 2205 a.C. Cultura Yang Shao e Long Shan
Dinastia Xia: 2205 – 1766 a.C. Fase de Transição
Dinastia Shang: 1766 – 1122 a.C. 1500 -1028 a.C. Bronze 1
Zhou anterior:1122 – 650 a.C. 1027 – 650 a.C. Bronze 2
Zhou posterior: 650 – 221 a.C. 700 – 221 a.C. Bronze Tardio e Ferro
Período Qin: 221 – 206 a.C. 221 – 206 a.C. Teoria dos 5 Elementos
Han anterior: 206 a.C. – 9 d.C. 206 a.C. – 9 d.C.
Han posterior: 22 – 220 d.C. 22 – 220 d.C.

Período dos Três Patriarcas e Cinco Imperadores

Os Três Patriarcas e os Cinco Imperadores foram líderes mitológicos da China durante o período aproximado
de 2850 a.C. a 2205 a.C., que é o tempo que precede a Dinastia Xia.

Os Três Patriarcas, conhecidos também como os Três Soberanos, são considerados reis-deuses ou semi-deuses
que usaram seus poderes mágicos para melhorar a vida das pessoas. Devido a sua grande virtude, eles teriam
vivido até idade extremamente avançada, e governaram durante um período de grande paz e prosperidade.

Eles são colocados sob diferentes identidades dependendo do documento. O famoso livro Registros do
Historiador
, por Sima Qian apresenta os seguintes nomes:

• O Deus Celestial, que governou por 18.000 anos

• O Deus Terreno, que governou por 11.000 anos
• O Deus Humano, que governou por 45.600 anos

O Yundou shu e Yuanming bao os identifca como: Fuxi, Nüwa e Shennong.

O deus Fuxi e a deusa Nüwa são considerados marido e mulher e ancestrais da humanidade após uma devastadora
enchente, e Shennong é o deus que teria inventado a agricultura e foi o primeiro a ter utilizado uma planta
para uso medicinal.

O Shangshu dazhuan e Baihu tongyi substitui Nüwa por Suiren, o criador do fogo. O Diwang shiji substitui
Nüwa pelo Imperador Amarelo, o lendário ancestral de todo o povo chinês.



O Imperador Amarelo

Os
Cinco Imperadores são lendários reis-sábios de moral perfeita. De acordo com Registros
do Historiador, eles eram:

• O Imperador Amarelo
• Zhuanxu

• Ku

• Yao
• Shun

Yao e Shun são também conhecidos como os Dois Imperadores, e, junto com Yu, fundador da Dinastia Xia, são
considerados posteriormente por confucionistas como modelos de líderes e exemplos de moral na história
chinesa. O Shangshu xu e Diwang shiji incluem Shaohao entre os Cinco Imperadores em vez do Imperador
Amarelo.

A Canção de Chu identifica os Cinco Imperadores como deuses ligados aos pontos cardeais:

• Shaohao (Leste)
• Zhuanxu (Norte)

• Imperador Amarelo (Centro)
• Shennong (Oeste)
• Fuxi (Sul)

O Livro das Sagrações combina os Cinco Imperadores com as Cinco Linhagens, o que compreende:

• Youchao-shi
• Suiren-shi

• Fuxi

• Nüwa

• Shennong

O primeiro imperador chinês historicamente registrado e oficialmente considerado pela historiografia
ocidental é Qin Shi Huang.

Período Xia



Bronze da Dinastia Xia

A
história chinesa documentada possui um certo espaço na passagem entre o
seu período proto-histórico e aquela que seria considerada a sua primeira dinastia
organizada, a Dinastia Xia, cujas datas tradicionais a colocam entre 2205 – 1766
a.C.

As culturas primitivas, como de Yangsho e Longshan dão-nos alguns testemunhos do processo formativo da
civilização chinesa, mas as conexões com uma possível organização política de caráter real ainda são
incertas. No entanto, as verosimilaridades permitem-nos inferir que haja uma relação cultural entre as
mesmas, ou até um movimento de continuidade.

Igualmente incertos são os antecedentes da cultura Yangshao, que hoje é generalizadamente reconhecida como
a génese da cultura chinesa por causa da influência permanente que a sua agricultura auto-suficiente
exerceu sobre as tribos que a partir daí se consideraram o povo chinês. Fisicamente, os habitantes das
aldeias Yangshao são parecidos com os atuais chineses das províncias do Sul, mas isso não deixa de fazer
sentido se nos lembrarmos como, durante a era imperial, a invasão dos Nômades transformou a China do Norte
em um cadinho de mistura de raças. Mas, mesmo a partir da era dos Zhou, em que se passou a dispor mais
facilmente de fontes literárias, é óbvio que o critério para definir quem pertencia ao mundo chinês passava
mais pela consciência duma herança cultural comum do que pela afinidade étnica. Antes de se ter esgotado o
período de cultura Yangshao surgiu outra cultura, chamada Longshan por ter sido descoberta em 1929 perto de
Longshan ou “Montanha do Dragão”, na localidade de Chengziyai, província de Shangdong. Com efeito, os
baluartes rectangulares de terra amassada antecipam a longa tradição de cidades fortificadas que em breve
seriam inauguradas pelos Shang; além disso, a área de implantação que eles abrangiam era mais de cinco
vezes maior do que a que se acolhia dentro do fosso defensivo de Banpo. Outras semelhanças com os tempos
posteriores eram, por exemplo, as técnicas de adivinhação, as formas das peças de olaria e, o que não deixa
de ser interessante, uma série de tabuletas de oleiros que são idênticas a caracteres descobertos em
inscrições de oráculos de Shang. Seja uma evolução da cultura Yangshao, seja uma tradição oriental distinta
com pontos de contacto que se estendem para nordeste até à Sibéria oriental, a de Longshan caracteriza-se
essencialmente pela sua olaria avançada, uma louça fina, muito polida, cinzenta ou preta, que mostra sinais
de ter sido feita com roda. Esta cultura floresceu até ao princípio da idade do bronze, pouco depois de
1800 a. C., e os seus vestígios aparecem por baixo dos dos Shang, na província de Henan, sede desta
dinastia.

A considerações feitas pelos autores da década de 80, porém, não permitiam ainda confirmas a existência dos
Xia. A ausência de vestígios arqueológicos só se deu recentemente, e poucos manuais tiveram oportunidade de
reproduzir esta atualização das descobertas históricas chinesas.

Pouco ainda se sabe sobre eles, e muito provavelmente sua história está intimamente ligada as dos Shang,
cuja sobrevivência política e documental permite-nos definir melhor seu quadro de existência. As
descobertas arqueológicas apontam, no entanto, para a imensa riqueza técnica e artística dos mesmos:

Na Idade do Bronze, que durou cerca de 2 mil anos na China, a dinastia Xia é o período inicial no
desenvolvimento da tecnologia do bronze e que lançou sólidas bases para a sua prosperidade. Os objetos de
bronze da última fase da dinastia desenterrados na relíquia de Erlitou podem ser classificados em
categorias de serviços de vinho, serviço de cozinha, armas, instrumentos musicais, ferramentas e adornos.

Dinastia Shang

A civilização Shang é conhecida, também, como Idade do Bronze Chinês ou Época da Realeza Palaciana. No
entanto, ambos os termos são um tanto quanto imprecisos.

Na época Shang, a metalurgia do Bronze desenvolveu-se tecnicamente de forma rápida e avançada,
ultrapassando em muito as conquistas do Ocidente. No entanto, houve também um relativo domínio do ferro,
que, no entanto, conviveu muito tempo com o bronze sem substituí-lo. E, quando o ferro passou a ser
utilizado mais amplamente, na época dos Qin-Han, uma das etapas de transição (a do ferro martelado para a
do ferro fundido) parece não ter existido, conquanto as técnicas do bronze possam ter sido utilizadas como
substitutas para tal fim. Os Shang também dominavam a construção de carros de combate, com os quais
guerreavam e eram enterrados: e até a época Han estes foram utilizados de forma ampla.

Os Shang pareciam ser um grupo étnico fortemente vinculado a cultura Longshan, evidenciado por algumas
semelhanças em suas culturas materiais: uso de muros de terra batida em torno das cidades, utilização de
ossos e tartarugas em artes divinatórias, e um estilo artístico próprio que aparecia nas cerâmicas antigas
(preta e pintada). Há um hiato, no entanto, entre o surgimento dos Shang e a civilização Longshan; a
primeira surge, nos depósitos arqueológicos, longe dos tempos ceramistas, dominando uma avançada técnica de
emprego do bronze; como os homens da cultura Longshan e os da cerâmica cinzenta, os Shang fizeram grande
uso da madeira para as suas construções e a sua baixela. Toda uma série de vasos de bronze – aqueles cujas
formas são angulares – seriam cópias de vasos de madeira. Por outro lado, a arte dos Shang é uma arte
animalista, não apenas na decoração como nas formas, dando provas, num tal domínio, de uma fantasia e um
gênio inventivo surpreendentes (vasos em forma de carneiros, de corujas, de rinocerontes, de elefantes).
Só pela sua arte, a civilização chinesa da época dos Shang apresenta-se já, praticamente, tanto como uma
civilização de caçadores e criadores como de agricultores’. O Bronze, aliás, é a grande marca dos Shang:
inúmeras coleções de recipientes dos mais variados tipos e funções são normalmente encontradas nas tumbas
deste período. O estilo artístico empregado em sua confecção (já nesta época realizada em pré-moldados)
manifesta os elementos identificadores da cultura Shang. Sua composição étnica é comprovada pelo estilo
inconfundível dos vasos rituais trípodas e pela máscara Tao Tieh, motivo decorativo vulgar (e aparentemente
estatal) que identificava o grupo. Soma-se a isso a escrita, que aparece nos cascos de tartaruga e ossos
animais para realização de presságios e oráculos. Este sistema de inscrições está parcialmente decifrado, e
possui conexões com os ideogramas que comporiam a escrita chinesa tal como conhecemos hoje.



Mapa na Dinastia Shang

O aspecto ritual e religioso desta sociedade é de suma importância, tendo em
vista a quantidade de achados do gênero: sacrifícios constantes de carne e vinho
de arroz eram feitos aos deuses (que tinham características transitórias entre
o Zoomorfismo e o Antropozoomorfismo) e depositadas em urnas especiais, das
quais muitas sobreviveram graça a sua qualidade. Por vezes, os mesmos ritos
buscavam atrair reis mortos e grandes antepassados. As tumbas Shang demonstram
que havia a prática da servidão e do escravismo, já que eram feitos holocaustos
maciços de condenados, presos e pessoas dedicadas em vida (e também, na morte)
ao nobre falecido. Este era enterrado com seus pertences materiais, armas, animais
e os mesmos servidores degolados, cuja cabeça era depositada em separado do
corpo. Os primeiros indícios da escrita também surgem através da prática religiosa:
ideogramas primitvos aparecem, gradualmente, em ossos e carapaças de tartaruga
utilizados com fins oraculares. Estas inscrições são a chave para compreender
as origens do sistema logográfico chinês, situando como a mais antiga escrita
viva em todo mundo.

Os Shang não eram também um grupo disperso: apesar da vida organizada em cidades
semi-autônomas, parece ter havido a ascensão de reis responsáveis pela administração
dos interesses coletivos das comunidades. Três são os motivos que nos levam
a crer nisso: primeiro, a construção de cidades centrais (capitais), dentre
as quais se destaca Anyang, responsável pela articulação e reprodução do poder
Shang; parecem ter-se organizado como uma forma de cidade-Estado sob uma monarquia
que, no início, foi muito forte. Havia aldeias-satélites não muito longe da
capital central e o Estado tinha meios de controlar as comunidades a uma grande
distância. Mais de 50 sítios com restos dos Shang, nove deles de grande, importância,
foram identificados na região do rio Amarelo e da planície da China setentrional.
A localização da capital murada sofria mudanças, e dois dos mais importantes
sítios foram Zhengzhou (provavelmente a antiga capital de Ao), fundada durante
o reinado do décimo monarca e ocupada desde c. 1500 a 1300, e Anyang, também
conhecida como Grande Shang, que data do tempo do 19º rei, em 1300, até a queda
da dinastia em 1027 a.C.; em segundo lugar, a necessidade existente de resistir
às invasões daqueles que eles julgavam ser “bárbaros”, na verdade povos nômades
ou mesmo outros reinos que conviveram com esta dinastia no espaço físico da
China Antiga; por fim, o fato de existirem listas com as gerações reais que
coincidem, com precisão razoável, com as apresentadas por Sima Qian no Shi Ji.

O domínio dos mesmos se restringiu bastante à região norte, e suas fronteiras
viviam em constante tensão e conflito. Seu modo de vida, essencialmente agrícola,
apresenta uma certa inclinação pecuária que se refletia nos hábitos alimentares
e nos sacrifícios.

Existem indícios de que a agonia dos Shang, em torno do século XI, se deu pela
fragmentação de seu poder interno, aliado ao contexto de invasão externa que
teria sido promovido pelos grupos constituidores da dinastia posterior, os Zhou.
Os elementos que denotam a diferenciação entre estes estrangeiros e os Shang
estão presentes, por exemplo, nas questões religiosas. Uma das primeiras medidas
Zhou foi acabar com a prática dos sacrifícios humanos quando da morte de nobres:
estes foram substituídos por estátuas de pedra ou madeira. Os Zhou aparecem
como mais guerreiros, dinâmicos, mas com uma mentalidade aberta o suficiente
para absorver os elementos culturais e técnicos que mais lhes interessavam dos
Shang. É o caso dos estilos artísticos e da manutenção do Bronze. No entanto,
ocorreu uma transformação no sistema político e social, já que os Zhou instauraram
um novo tipo de regime monárquico feudatário.

Assim sendo, parece-nos que os Shang foram o primeiro grupo organizado, na civilização
chinesa, a partir de uma série de reminiscências proto-históricas que lhes garantem
seu caráter. No entanto, vemos que outros grupos conviveram com os Shang em
seu período de existência, o que nos faz concluir que a construção confucionista
de uma história dinástica e étnica linear não era precisa: os Zhou seriam, em
essência, uma fusão da cultura Shang modificada com os elementos trazidos por
outros grupos étnicos habitantes de um espaço entre noroeste e o alto sudoeste
chinês. E com os Zhou se iniciaria, no imaginário chinês, o “grande período
de Ouro”.

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a Arte Chinesa

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