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Os persas: 3. Cultura e produção literária

by Lucas Gomes

As produções literárias no Império Persa começaram
muito cedo, e ainda hoje tem-se obras elaboradas nos mais antigos períodos
da civilização dos medos e persas. Cumpre notar que nessas obras
encontram-se muitas tradições, que coincidem bastante com as da
Bíblia, principalmente no que concerne aos primórdios da humanidade.

O
maior dos pensadores dessa raça foi Zoroastro, cuja existência
está aquém de todas as dúvidas, havendo porém discussões
sobre o lugar e a data de seu nascimento. Consta que o seu nascimento se teria
dado entre os anos 6.000 e 6.600 a.C.; teria sido persa, medo, bactriano ou
assírio.

A filosofia de Zoroastro enraizou-se profundamente em sua terra. Ainda hoje
há cerca de 500.000 adeptos de sua doutrina. Ela parte da observação
de que, quer no mundo moral, quer no mundo físico, há luta incessante
entre fatores favoráveis à vida ou à ordem, contra fatores
favoráveis à morte ou à desordem.

Para explicar a existência desse fato, Zoroastro afirmou a existência
de um antagonismo irredutível entre Ormuzd, que é um ser imensamente
poderoso e bom, e Arimânio, que é um ser imensamente poderoso e
mau. Tendo Ormuzd criado o homem e todos os fatores que concorrem para a sua
saúde física e moral, Arimânio, com o intuito de combater
a obra de Ormuzd, começou a se utilizar, nessa luta, de todos os fatores
nocivos ao homem. Por isso é que há animais bons e daninhos, climas
amenos e ásperos, alimentos saudáveis e venenosos. Enfim, por
toda parte, auxílio ou agressão para o homem, representando tudo
isto a luta entre Ormuzd e Arimânio.

Para Zoroastro, havia de um lado o exército favorável ao homem,
tendo por chefes os ameshapentas (eles eram os gênios do bem), e por chefe
supremo Ormuzd; e de outro lado os daevas (que eram os gênios do mal),
chefiados por Arimânio, os quais procuravam destruir a obra de Ormuzd.
O homem faria então o papel de um pêndulo, oscilando entre um e
outro partido, tendo porém, por dever, combater a favor de Ormuzd contra
Arimânio.

O homem que combatesse a favor do bem, ao morrer a sua alma iria para o paraíso.
Ao fim de certo tempo, um homem nascido de uma virgem viria ao mundo, e salvaria
a humanidade. Depois haveria um choque de uma estrela com o nosso planeta, aparecendo
então um mar de metais derretidos, onde todos os homens se haveriam de
banhar. Para os que tivessem sido bons, o banho seria um prazer, constituindo
um tormento para os que não tivessem auxiliado a obra de Ormuzd. Porém,
como todos eram criação de Ormuzd, logo o mar se acabaria, indo
todos gozar num paraíso eterno, junto de Ormuzd, que aniquilaria os daevas
junto com Arimânio, e depois os homens viveriam sempre bem.

Pode-se notar aí certa semelhança com a doutrina católica.
Devemos porém frisar que, na doutrina católica, há um só
Deus, ao passo que na outra há dois deuses. Na religião católica,
o demônio não é um deus, ao contrário do que ocorre
na doutrina de Zoroastro. A tradição do salvador existe em muitos
outros povos antigos, como por exemplo na China.

O império persa baseou toda a sua moral na doutrina de Zoroastro. Havia
entre os povos que estamos estudando um profundo horror à mentira, porque
o deus do bem deveria ser também o deus da verdade (o amor da verdade
originou o culto da luz, porque a luz é uma imagem da verdade).

Os persas divinizaram e cultuaram a luz, e tinham o respeito à verdade
como dever fundamental do homem, desprezando por isso o povo grego (que era
muito mentiroso). Por tal fato é que não havia (?) em todo o império
persa, ao contrário do que ocorria na Grécia, onde os mercados
eram muito numerosos, e constituíam centro de intrigas e de perfídias.
Tinham também penas muito severas para o adultério, que é
uma espécie de perjúrio.

Era também proibido: 1) atirar um cadáver à água,
porquanto era contaminar um elemento favorável ao homem; 2) limitar a
prole, porque seria cercear o desenvolvimento do exército de Ormuzd;
3) o assassínio era considerado falta grave, e era severamente punido,
principalmente quando o assassinado era um homem bom, pois Zoroastro dizia que
o homem só devia exterminar os seres prejudiciais.

O homem que ferisse de morte a um cão, era condenado a receber oitocentas
chicotadas, que não eram aplicadas no culpado, mais num ser daninho,
porquanto isto seria muito mais útil à defesa da causa de Ormuzd.

As formigas prejudicavam a agricultura, e por isso era um ato de benemerência
o seu extermínio. Por isso muitos mártires cristãos da
Pérsia deixaram-se martirizar, por não quererem matar formigas.
Matá-las era interpretado como aceitação da religião
persa.

Eles confundiam a noção da pureza moral e da pureza física,
porquanto acreditavam, como já foi visto, que um banho em metais liquefeitos
faria desaparecer as impurezas morais. Aproximar um cachorro de um moribundo
afugentava a morte, porque, se o cão afugentava os ladrões, montando
guarda aos bens do seu dono, deveria também afugentar a morte.

Quando alguém morria, extinguia-se o fogo em sua casa, para que este
não fosse contaminado pelo cadáver. O cadáver era então
levado para um lugar onde não havia nem água nem árvores,
e era abandonado às aves de rapina, que o devoravam. Era proibido enterrá-lo,
porque seria contaminar a terra, criação de Ormuzd. Pelo mesmo
motivo, era pecado cuspir na água. Em caso de falecimento, o fogo era
reacendido na casa do finado só nove dias depois.

Quase todos os seres favoráveis ao homem eram sagrados. O fogo sagrado
era levado em enorme consideração. Era aceso no alto de altares,
em recipientes chamados piras, aos quais se tinha acesso por meio de escadas.
Nesse fogo sacrificavam-se animais sagrados, porém destituídos
das entranhas, que haveriam de contaminar o fogo. Havia fogos para diversas
classes sociais, e eram mantidos por uma espécie de monges, que se alimentavam
com queijos e hortaliças, viviam em casas muito originais e habitavam
províncias em que mandavam. Estava generalizado entre eles o hábito
da confissão a um sacerdote.

*Transcrição das apostilas do curso de História da Civilização
utilizada as aulas no Colégio Universitário da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo.

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