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Os persas: 2. Organização política e social

by Lucas Gomes

Como já visto, era enorme a extensão territorial do Império
Persa, desde o Hindus até além do Bósforo, compreendendo
o Egito. Estava dividido em províncias, denominadas satrápias,
governadas por sátrapas.

Os soberanos dotaram o império Persa com muitas vias de comunicação,
porquanto tinham necessidade de se comunicarem em situações difíceis.
Havia também um sistema de correios, muito bem organizado.

Os reis não confiavam muito nos sátrapas. Por isso é que
colocavam junto aos sátrapas um espião, que era o próprio
secretário destes. Estes secretários eram recrutados na aristocracia,
e tinham o caminho aberto para o cargo de sátrapa. Sendo nomeado pelo
rei, este era por eles informado de tudo quanto fazia o sátrapa.

Os persas praticavam uma política de tolerância, deixando aos
povos conquistados todas as suas leis, costumes etc. Os impostos eram cobrados
pelos naturais do país. Esta política era benigna, e por isso
o Império Persa teve muito mais duração do que o dos caldeus.
Os persas unificaram o Oriente sob o seu domínio.


Cilindro de Ciro, cujas inscrições são consideradas por
muitos como a
primeira declaração de direitos humanos da história,
em razão de sua
referência à tolerância religiosa

Governavam com relativa brandura, apesar de os seus soberanos terem por vezes
rasgos de crueldade, como por exemplo o seguinte: Ciro, o grande persa, tendo
vencido os Lídios, aprisionou Creso, rei da Lídia, condenando-o
à fogueira. Mas o filho deste, que era mudo, falou pela primeira vez,
implorando a vida de seu pai, no que foi atendido.

Quando Creso já se achava no alto da pira, onde devia ser queimado,
começou a bradar: Sólon, Sólon! Ciro, intrigado, perguntou
a Creso o que significavam tais brados. Creso disse então a Ciro que
Sólon, legislador ateniense, certa vez lhe dissera que não havia
no universo reino imperecível. Ciro então perdoou a Creso, e ainda
nomeou-o seu ministro. Ciro não errou nesse procedimento, porquanto Creso
auxiliou-o muito, ajudando-o a governar a Lídia com benignidade e brandura.

Os soberanos persas deixaram também, a exemplo dos caldeus, narrações
de bravuras.

Entre os persas, muitas vezes os filhos pagavam pelos pais, como em caso de
alta traição, em que eram punidos também todos os parentes
do traidor.

Quanto à organização da sociedade, podemos distinguir
na Pérsia antiga quatro classes: sacerdotal, guerreira, agrícola
e artesã. A classe guerreira era muito importante, porquanto fornecia
o exército, e os guerreiros eram recrutados na nobreza.

Os povos incorporados ao império não tinham direitos iguais.
Em primeiro lugar vinham os persas verdadeiros, seguidos dos medos, depois vinham
os bactrianos etc; enfim, os povos que mais haviam resistido ao domínio
dos persas tinham menos direitos. O critério da distribuição
dos direitos obedecia ao nascimento da raça, sendo que a raça
vitoriosa se impunha à vencida. Os povos conquistados mais recentemente
ficavam sob a tutela dos povos conquistados anteriormente.

Assim, em quase todas as sociedades da antiguidade havia a divisão em
classes sociais. Foi o Cristianismo que extinguiu esse costume de distinção
entre o vencido e o vencedor, e fez com que um homem de uma classe mais baixa
pudesse atingir, por seus méritos, outra classe mais elevada.

O critério aceito para a distribuição das riquezas não
tinha por base o mérito, mas exclusivamente a raça de que havia
nascido a pessoa. Por isto é que era extremamente difícil uma
pessoa gozar de direitos maiores do que os que as leis do império facultavam
às pessoas de sua raça. E a hierarquia das raças, dentro
do império, tinha como único critério a força.

Os persas venceram os medos, e por isso tinham mais direitos que estes. Medos
e persas, aliados, venceram juntos os outros povos que compunham o império,
razão pela qual os medos eram o segundo povo do império. Assim,
portanto, os povos eram colocados em posição superior à
destes últimos, e portanto o único critério que vigorava
para estabelecer a hierarquia dos povos, dentro do império, era a força.

Quanto ao exército, havia nele um núcleo formado pela guarda
dos 10.000 imortais, todos persas, constituindo a medula do exército,
e todos eles fidelíssimos ao rei. Isto prova a instabilidade do Império
Persa, pois se os reis tivessem confiança nos povos conquistados, formariam
esse corpo de guarda com soldados recrutados entre os povos vencidos.

Família

A família era indissolúvel, havendo porém raras exceções,
como no caso de esterilidade da mulher, em que, se a esposa quisesse, o marido
poderia abandoná-la. A família era muito sólida e estável,
tendo o pai muita autoridade.

Arte


Escribas com oferendas, arte persa em relevo

Como já visto, a Pérsia elaborou uma civilização
de síntese, assimilando-a à dos vários povos de que se
compunha o seu império. Este caráter heterogêneo da civilização
persa se nota acentuadamente na sua arte, que em grande parte se inspirou nos
princípios artísticos caldaicos.

Mas além da influência caldaica nota-se também na arte
persa, com menor intensidade, a influência dos egípcios e dos gregos.
Encontramos também na arte persa particularidades que lembram a arte
egípcia. Portanto, eles elaboraram uma arte de síntese, em que
entraram elementos artísticos de várias procedências (assírios,
gregos, egípcios etc).

Um dos motivos de decoração dos persas era o touro alado, como
o dos assírios. Eles eram useiros no encimar os capitéis das suas
colunas com cabeças desses animais.

Na antiga Pérsia não havia templos, porque os persas consideravam
o seu deus como um ser puramente espiritual, que não podia caber entre
as paredes de um edifício. Eles achavam que deviam adorá-lo ao
ar livre, e por esta razão havia as piras nas florestas.

Os persas empregavam muito os ladrilhos, à semelhança dos caldeus.
Entretanto, havia uma diferença entre as figuras artísticas dos
persas e as dos caldeus: as figuras dos assírios e babilônios aparecem
sem relevo, ao passo que as figuras persas nos ladrilhos apresentam-se como
um alto-relevo; são figuras que se destacam sobre o fundo. Essa foi uma
pequena diferença da arte persa, com relação à arte
caldaica.

Não se pode dizer que a escultura dos antigos persas foi grandiosa,
contudo atingiu um grau apreciável de desenvolvimento. Não é
errôneo afirmar-se que a escultura dos persas foi uma cópia servil
da escultura caldaica.

Como tipos mais importantes de arquitetura persa, daria para citar os palácios
e as sepulturas. Os palácios eram muito suntuosos, lembrando os palácios
assírios. Os tetos eram feitos com madeiras preciosas. As sepulturas
reais não tinham o caráter de religiosidade das sepulturas egípcias.
As sepulturas reais persas eram talhadas em rochedos. A entrada representava
a entrada de um palácio, mas para se tomar acesso às mesmas não
há escadas nem rampas. Estão situadas a uma boa distância
do solo.

Costumes

Os judeus viviam sob o domínio dos caldeus. Quando os persas, derrotando
os caldeus, destruíram o Império Mesopotâmico, foram os
judeus restituídos à liberdade, por um decreto de Ciro. Foi encontrado
tal documento, e se conhece o texto do decreto em que Ciro deu a liberdade aos
judeus. Por esse texto, sabe-se que Ciro permitiu aos judeus reconstruir o seu
templo em Jerusalém, fato que é confirmado também pela
Bíblia.

Isto não deve levar a supor que os persas foram um povo de inigualável
benignidade. Fatos como os narrados impressionaram o espírito da maioria
dos povos da antiguidade, que eram em geral dotados de grande inclinação
para a crueldade, e fizeram com que os persas passassem para a História
como um povo benigníssimo. Tal critério pode levar, à primeira
vista, a juízos errôneos a respeito do caráter deste povo.
Convém fixar bem este caráter dos persas, porque por ele se define
toda a antiguidade.

Aliás, se pode ver por isto até que ponto eram considerados pelos
antigos os sentimentos de bondade, solidariedade e misericórdia, que,
pode-se dizer, eram quase inexistentes entre esses povos, e aparecem em toda
a sua pujança com o advento do Cristianismo. Encontra-se entre os persas
fatos que acusam grande crueldade, pois sabe-se que chegaram a mutilar prisioneiros
vencidos, cortando-lhes o nariz, as orelhas, enfim, tudo o que havia de “cortável”
no rosto deles.

Pois bem, este era o povo que tinha fama de “benigno” na antiguidade.
Costumavam os soberanos persas vangloriar-se dos seus feitos, das suas vitórias,
como no famoso rochedo de Bebristum. Uma ou outra vez, usavam de misericórdia
para com os povos vencidos. Entretanto, muitas e muitas vezes, à maneira
dos caldeus, usavam de grande crueldade com os povos que dominavam, como já
se pode ver. Havia entre eles o costume de crucificar os prisioneiros.

Sabe-se que Creso, rei da Lídia, foi condenado à fogueira juntamente
com quatorze crianças da nobreza lídia, e toda aquela história
da invocação de Creso a Sólon etc, é que Ciro pensou
que aquilo que se tinha dado com Creso podia se dar com ele, e então
libertou Creso e nomeou-o seu ministro. Pode-se ver com isto o verdadeiro caráter
da benignidade de Ciro, baseada inteiramente no temor de um infortúnio.

Com referência à crueldade, conhece-se casos muito interessantes
que mostram a existência deste instinto entre os persas. Entre outros,
daria para citar o de Cambises, que tentou a conquista da Etiópia e foi
mal sucedido neste empreendimento. Na volta, sobreveio uma grande tempestade
de areia, que fez com que os persas ficassem sem víveres. Os soldados
persas sofreram então muita fome, e contam os historiadores que eles
se matavam uns aos outros, para saciarem a fome. Numa ocasião, tendo
Cambises recebido um desacato em Mênfis, no Egito, mandou matar 2.000
pessoas desta cidade, por tal motivo. Este foi o povo que passou para a História
como um dos mais benignos da antiguidade, tendo em vista que naquela época
imperava a lei da força.

Um fato significativo na História, neste sentido, verificou-se na história
romana. Os gauleses, chefiados por Breno, venceram os romanos nas proximidades
do rio Alia, entraram em Roma, e só se comprometeram a retirar-se com
o pagamento de pesada indenização. Tendo os gauleses usado pesos
falsos, os romanos reclamaram contra esta irregularidade. Breno atirou então
a sua espada ao prato da balança, pronunciando a frase que ficou célebre
na História (tudo antes do advento do Cristianismo): “Vae victus!”
— Ai dos vencidos!

Há ainda um outro fato característico, auferido pela sociedade
com o advento do Cristianismo: os hospitais só foram fundados após
o advento do Cristianismo. Os doentes, que eram inferiores fisicamente, eram
por isso votados ao desprezo. Haja vista o caso dos espartanos, que matavam
as crianças nascidas com físico inferior.

*Transcrição das apostilas do curso de História da Civilização
utilizada as aulas no Colégio Universitário da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo.

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