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Brasil – A Era Vargas – Parte 1

by Lucas Gomes



Carreata da Fazenda Itu, no Rio Grande
do Sul, ao Palácio do Catete, na ocasião
da reeleição de Getúlio De colônia cafeeira a país industrial

Getúlio
Vargas

fundou o Estado Nacional Brasileiro e iniciou um processo de desenvolvimento
que levou o Brasil a categoria de país capitalista de maior crescimento durante
quase 60 anos. O Brasil era apenas um fornecedor de produtos agrícolas – principalmente
o café – e um mercado cativo dos produtos industriais ingleses, importados a preços
de monopólio. Diante dos preços baixos pagos pelo café, a oligarquia cafeeira,
para garantir lucros, usava o governo que dominava para empréstimos nos bancos
ingleses e assim comprar a safra – os estoques de café chegaram a 10% do Produto
Nacional Bruto, enquanto o país se endividava e os empréstimos eram pagos pelo
trabalho da população. A indústria era bloqueada, o povo, desempregado, vegetava
na miséria e na fome; cada província era um feudo do poder da oligarquia cafeeira
mantido pela fraude eleitoral e pela violência.

Foi contra essa situação que, com a participação decisiva dos oficiais revolucionários
que anos antes tinham formado a Coluna Prestes, formou-se a Aliança Liberal com
a chapa Getúlio-João Pessoa. Mas a eleição foi fraudada mais uma vez e João Pessoa
assassinado. E então a revolução começou, em 3 de outubro de 1930. O governo da
oligarquia servil aos ingleses foi derrubado em 26 dias.

Getúlio Vargas, comandante da revolução, foi de Porto Alegre ao Rio de Janeiro
em meio ao levante e à aclamação popular. Em todo o Brasil, o povo se ergueu e
ocupou as ruas para garantir e saudar a revolução. Começava uma nova era no país,
durante a qual os brasileiros foram unidos para construir a nação que idealizava:
independente, soberana, com uma poderosa base industrial, com orgulho de suas
riquezas. Seguiu-se um processo de desenvolvimento que levou o Brasil a ser o
país capitalista de maior crescimento durante quase 50 anos. Formou-se uma numerosa
classe trabalhadora, que conquistou direitos como o salário mínimo à altura de
suas necessidades, a jornada de trabalho de oito horas, as férias e o descanso
semanal remunerado, a aposentadoria, a licença-maternidade.

Empresa brasileira cresce e exporta

A política de Getúlio e da Revolução de 30 impulsionou a maior expansão econômica
que o Brasil já teve. A empresa privada nacional foi multiplicada e fortalecida,
com um forte empresariado empreendedor. Os empregos aumentaram e o poder aquisitivo
dos trabalhadores foi garantido pelo salário, criando com isso um mercado interno
para a indústria nacional. Inúmeras empresas foram fundadas nessa época.

Até então, todos os recursos do país eram drenados para sustentar artificialmente
os preços do café no mercado internacional, para importar produtos industrializados
e para pagar uma imensa dívida externa. O resultado era o atraso e a miséria.
No fim de 1929, estourou a crise e a depressão mundial. Getúlio assume a Presidência
com as reservas financeiras do país reduzidas a zero. Baseou sua política de construção
do país na empresa nacional e no mercado interno, ao mesmo tempo em que incentiva
a exportação de nossos produtos. Suspendeu as transferências aos bancos estrangeiros
e dirigiu, através do confisco cambial, uma parte da renda da exportação do café
para a industrialização.

Em 1931, a incipiente indústria de bens de capital – ferro, cimento e aço, algumas
máquinas e equipamentos – começa a crescer; em 1932, sua produção é de 60% superior
a de 1929; em 1935, o investimento líquido nesse setor, apesar das importações
terem caído no mesmo período, ultrapassa a do ano anterior.

Entre 1929 e 1937, a produção industrial cresceu 50% e a produção agrícola para
o mercado interno cresceu 40%. A renda nacional, apesar da depressão mundial,
aumentou entre os mesmos anos, 20%, enquanto a renda per capita cresceu 7%. Era
o começo de um crescimento que nos 40 anos seguintes foi o maior entre todos os
países capitalistas.

Para manter o crescimento econômico e reduzir a importação de insumos básicos
(aço, petróleo, produtos químicos), Getúlio concentrou, através do Estado, os
recursos e os esforços necessários para criar a siderurgia nacional – CSN -, a
indústria petrolífera – Petrobrás – a indústria química – Companhia Nacional de
Alcalis -, e projetou a Eletrobrás. Deu extraordinário impulso à indústria de
máquinas e equipamentos, com a Fábrica Nacional de Motores; fundou a Companhia
do Vale do Rio Doce para colocar os recursos minerais, antes explorados e exportados,
a serviço do povo e do desenvolvimento brasileiros.

O Estado é nacional

Getúlio Vargas fundou o Estado Nacional brasileiro. Até então, o Estado no Brasil,
estivera a serviço dos bancos ingleses e de uma pequena oligarquia submissa ao
colonialismo. Estancou a saída de recursos para o exterior, a título de pagamento
de dívida externa e dirigiu os recursos para o desenvolvimento. Através do confisco
cambial, canalizou parte da renda das exportações de café para a industrialização.
Era o Estado brasileiro a serviço do Brasil e dos brasileiros, mudanças que se
também foram implantadas em outras áreas: acabou com o voto a bico de pena, instituiu
o direito ao voto às mulheres e o sufrágio universal secreto; revolucionou a administração
instituindo o concurso público e a capacitação dos servidores para melhor atender
ao povo.

Com esse turbilhão de mudanças, Getúlio venceu duas vezes a contra-revolução:
em 1932 e 1937. E em 24 de agosto de 1954, novamente derrota mais uma vez o inimigo,
oferecendo a própria vida em sacrifício.

Getúlio integrou o país e levou essa unidade nacional a outro sólido patamar.
Até então, as forças de cada oligarquia em cada Estado tinham mais poder de fogo
do que o próprio Exército. Getúlio mudou o quadro e para a garantia das fronteiras
nacionais, fortaleceu e reequipou o Exército, a Marinha, e criou a Aeronáutica.

Com a Rádio Nacional transmitindo para todo o país, a diversidade da cultura popular
e da própria língua não era mais barreira para a unidade brasileira, embora as
peculiaridades regionais tenham sido preservadas. A literatura e as artes foram
preenchidas por um conteúdo nacional e popular. Pela primeira vez o país teve
um sistema escolar público, gratuito, universal. Tanto o ensino básico obrigatório
quanto as universidades federais foram criados por Getúlio.

Igualmente o sistema nacional de saúde pública foi construído nesse período. O
controle de endemias e epidemias foi estendido a todo o território nacional; ergueram-se
hospitais e o atendimento às necessidades da população era uma prática comum.
A ciência e a tecnologia foram incentivadas e várias descobertas brasileiras tornaram-se
patrimônio da Humanidade.

Getúlio sabia muito bem o que estava fazendo e enfrentando, como deixou escrito
na Carta Testamento:

…Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros
internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação
e instaurei o regime de liberdade social. tive de renunciar. Voltei ao governo
nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se
à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei
de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a Justiça da revisão
do salário mínimo se desencadearam ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização
das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda
de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem
que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente…

O Brasil na Segunda Guerra Mundial

Em janeiro de 1942, após um complexo processo para unir todas as forças vivas
da Nação no combate ao nazi-facismo e dotar as forças armadas brasileiras, o presidente
Getúlio Vargas rompeu relações com os países do Eixo.

Em 31 de agosto, após o afundamento de navios da marinha mercante brasileira por
submarinos nazistas, o presidente decretou guerra ao Eixo, atendendo ao clamor
do povo, e determinou o envio dos pracinhas brasileiros para a Itália. Em 1940,
no discurso do “Minas Gerais”, Getúlio havia anunciado o aparelhamento
completo da FFAA como uma necessidade imperiosa para a Nação, face à II Guerra.

Durante as negociações com o governo Roosevelt, o estadista manteve postura soberana,
como registra no “Diário”:

“Dia 19 – Recebi o sr. Summer Welles. Em resumo, disse-lhe que não me queria
valer das circunstâncias para pedir vantagens, mas para pensar bem as minhas responsabilidades
e não arriscar meu país sem garantias de segurança. E a principal destas era a
entrega do material bélico, que até agora o governo americano protelara. Deu-me
as mais completas garantias. Entreguei-lhe, conforme pedira, a lista completa
de nossos pedidos”.

“Dia 27 – Reunião do Ministério. Fiz uma exposição da situação criada pelos
acontecimentos, do instante apelo que o governo americano fazia ao Brasil, das
conveniências em atendê-lo, das desvantagens de qualquer procrastinação e das
conseqüências que poderia ter uma atitude negativa.

“Depois das justificativas de outros ministros, tomei novamente a palavra
para apreciar o resultado dessa demonstração e terminar autorizando o ministro
do Exterior a declarar o rompimento na sessão de encerramento da Conferência”.

Voto universal e secreto: fim do “cabresto”

Até a Revolução de 30, o eleitor recebia o envelope lacrado com a cédula já previamente
marcada e só ele não sabia em quem havia “votado”. Getúlio Vargas aboliu
essa fraude eleitoral do voto de cabresto que sustentava o regime político, instituindo
o voto secreto e universal. Com isso, as mulheres brasileiras passaram a votar
e ser votadas.

Também no direito de votar e ser votado, Getúlio buscou a unidade nacional, retirando
o Brasil da idade média política que até então vivia, sendo o voto secreto apenas
para o eleitor. Este recebia das mãos do “coronel”, do “chefe político”
ou do cabo eleitoral a cédula dentro de um envelope, já devidamente lacrado e
sacramentado.

Em histórico discurso a bordo do encouraçado Minas Gerais, Getúlio Vargas afirmou
que o caminho da “democracia econômica, em que o poder emanado diretamente
do povo e instituído para defesa do seu interesse, organiza o trabalho, incorporando
toda a Nação nos mesmos deveres e oferecendo justiça social e oportunidades”.

E na Carta Testamento, o alerta:

“Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando
vos vilipendiarem sentireis no pensamento a força para a reação. Meu nome será
vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa
consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo
com o perdão. E aos que pensam que me derrotam respondo com minha vitória. Era
escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui
escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em
sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate”.

Mulher é cidadã

Podendo votar e ser votada, mulher brasileira passou a ser reconhecida como cidadã,
integrada ao processo político, econômico, social e cultural do país. O direito
ao voto às mulheres foi instituído pelo novo Código Eleitoral, promulgado por
Getúlio através do decreto 21.076. Em 1933, pela primeira vez, as mulheres votaram
e foram votadas para a Assembléia Nacional Constituinte. Entre os 214 deputados
eleitos, uma única mulher: Carlota Queiroz.

Em 17 de maio de 1932, Getúlio regulamentou o trabalho feminino. As mulheres passaram
a ter acesso ao mercado de trabalho em igualdade com os homens. Foi estabelecido
o princípio de salário igual para trabalho igual, a jornada de trabalho de oito
horas e a licença-maternidade de dois meses.

Getúlio proporcionou às mulheres o acesso a diversos setores da sociedade e rompeu
com uma série de preconceitos, como o ingresso no ensino básico e universitário
e cargos públicos através de concursos.

O estadista foi o maior defensor do feminismo no Brasil, como comprova o seguinte
episódio em que tomou parte a filha, Alzira Vargas: quando Alzira levou à presença
de seu pai uma jovem que pleiteava ingresso em cargo público, até então reservado
só para homens, sem a menor surpresa, ouviu de Getúlio: “A mulher de hoje
precisa falar inglês, saber datilografia e guiar automóvel. A senhora já sabe?”

Darcy Vargas é exemplo para as brasileiras

Darcy Saramanho Vargas casou-se com Getúlio aos 15 anos de idade, numa época em
que as mulheres eram criadas para o casamento e não sabiam nem ler nem escrever.
Com cinco filhos para criar, no início do casamento, suas atividades eram basicamente
caseiras.

Antes da Revolução de 30, Darcy já havia demonstrado seu compromisso com o Brasil.
Criou em Porto Alegre a Legião da Caridade, na qual todo o pessoal que queria
se integrar à revolução recebia apoio. Na condição de Primeira-Dama do país, e
diante das grandes mudanças que Getúlio promoveu em prol da mulher, Darcy Vargas
tornou-se um exemplo e uma referência para as mulheres brasileiras.

Depois da Revolução de 30, trabalhou no Abrigo Cristo Redentor e fundou entidades
como a Casa do Pequeno Jornaleiro e a Legião Brasileira de Assistência (LBA).

O povo canta com Villa-Lobos na unidade nacional

“O movimento de 1930 traçava novas diretrizes políticas e culturais, apontando
ao Brasil rumos decisivos, de acordo com o seu processo lógico de evolução história:
Cheio de fé na força poderosa da música, senti que era chegado o momento de realizar
uma alta e nobre missão educadora dentro da minha pátria. Senti que era preciso
dirigir o pensamento às crianças e ao povo e resolvi iniciar uma campanha pelo
ensino popular da música no Brasil, crente de que o canto orfeônico é uma fonte
de energia cívica vitalizadora e um poderoso fator educacional”. Heitor Villa-Lobos.

No governo de Getúlio Vargas, em 1930, foi criado o Ministério da Educação e
Heitor
Villa-Lobos
, considerado o maior gênio da música brasileira, foi chamado
a dar sua contribuição e colocar em prática um dos seus maiores sonhos, o de
promover a educação artística aos jovens e levar ao povo os grandes Concertos
Musicais.

“Quando procurei formar a minha cultura, guiada pelo meu instinto e tirocínio,
verifiquei que só poderia chegar a uma conclusão de saber consciente, pesquisando,
estudando obras que, à primeira vista, nada tinham de musicais. Assim, o primeiro
livro foi o mapa do Brasil, o Brasil que eu palmilhei, cidade por cidade, Estado
por Estado, floresta por floresta, perscrutando a lama de uma terra. Depois o
caráter dos homens dessa terra. Depois as maravilhas naturais dessa terra”,
afirmava Villa-Lobos. Era o nacionalismo também na arte.

Em 1932, Villa-Lobos foi nomeado Superintendente de Educação Musical e Artística
do então Distrito Federal e, em 1942, Diretor do Conservatório Nacional de Canto
Orfeônico, do Ministério de Educação e Cultura. Nesse período, realizou enormes
concentrações orfeônicas, numa das quais com a participação de 42 mil vozes de
estudantes. Em outra, em São Paulo, a que Villa-Lobos denominou de Exortação Cívica,
tomaram parte aproximadamente 12 mil vozes.

Entre os anos 30 e 40, realizou novas concentrações orfeônicas nos estádios
dos clubes Vasco da Gama e Fluminense, no Rio de Janeiro. Numa delas, sob a
regência de Villa-Lobos, Sílvio Caldas cantou o “Gondoleiro do Amor”,
de Castro
Alves
, acompanhado por 30 mil vozes.

“O Brasil levou muito tempo, meus amigos, muitos anos a imitar, a maquetear,
a papaguear, mas, graças a Deus, encontrou o reflexo da realidade de uma grande
raça, de uma grande Nação, e verificou que nunca poderiam ser eles mesmos, se
não fizessem a sua maneira, não imitando ninguém.”, afirmou o compositor.

Getúlio finalizou a Carta Testamento com a seguinte profecia:

“Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo.
Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu
ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte, nada receio.
Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para
entrar na História”.

Veja também: A Era Vargas – Parte 1 |
Parte 2

Créditos: Paulo Matos, jornalista, historiador pós-graduado, bacharel em Direito e escritor

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