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Brasil – A Constituição de 1824 (3) – Os poderes na Constituição do Império

by Lucas Gomes


Página inicial da Constituição
do Império
(edição H. Laemmert & C. – 1881)

Não foi exatamente essa a aplicação dos princípios
de Constant à Constituição de 1824. Precisando de um governo
forte e bastante centralizado, o Poder Moderador e a chefia do Executivo foram
concentrados no imperador, o que dava a esse cargo uma dimensão muito mais
atuante e até potencialmente despótica. Por outra parte, o caráter
de imperador não era bem o de um monarca supervisionador, situado acima
das decisões do dia-a-dia. D. Pedro era o líder de um país
em formação e, tanto por herança do absolutismo quanto por
seu caráter francamente temperamental, dificilmente iria se restringir
a uma atitude contemplativa e revisora.

O estabelecimento da divisão de poderes é tema do Título
III da Constituição:

“Art. 9. A divisão, e harmonia dos Poderes Politicos é o
principio conservador dos Direitos dos Cidadãos, e o mais seguro meio
de fazer effectivas as garantias, que a Constituição offerece.

Art. 10. Os Poderes Politicos reconhecidos pela Constituição
do Imperio do Brazil são quatro: o Poder Legislativo, o Poder Moderador,
o Poder Executivo, e o Poder Judicial.

Art. 11. Os Representantes da Nação Brazileira são o Imperador,
e a Assembléa Geral.

Art. 12. Todos estes Poderes no Imperio do Brazil são delegações
da Nação.”

Observa-se, em tais enunciados, uma explícita ênfase nos “Direitos
dos Cidadãos” e nas “garantias, que a Constituição
offerece”. Entretanto, a definição de atribuições
dos diversos poderes evidencia o interesse em centralizar as decisões
e limitar a pluralidade de manifestações, que os redatores viam
com certo receio, até justificadamente derivado das recentes experiências
internas e externas. Embora caracterizados como “delegações
da Nação”, os poderes tenderiam a perpetuar-se às
expensas do livre jogo político.

O Poder Moderador está definido no Capítulo I, do Título
5º, indicando:

“Art. 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organisação
Politica e é delegado privativamente ao Imperador como Chefe Supremo
da Nação, e seu Primeiro Representante para que incessantemente
vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia
dos mais Poderes Politicos.”
Consoante os princípios de Constant, a Constituição estabelece:

“Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não
está sujeito a responsabilidade alguma.”
Em contrapartida, encontra-se no Capítulo VI, do mesmo título,
ao definir as responsabilidades do Ministério:

“Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsaveis

I. Por traição.

II. Por peita, suborno, ou concussão.

III. Por abuso do Poder.

IV. Pela falta de observancia da Lei.

V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos
Cidadãos.

VI. Por qualquer dissipação dos bens publicos.”

E, para afastar qualquer dúvida, o mesmo capítulo estabelece:

“Art. 135. Não salva aos Ministros da responsabilidade a ordem
do Imperador vocal, ou por escripto.”
Quanto às atribuições do Poder Moderador, a Constituição
estabelece as seguintes:

“Art. 101. O Imperador exerce o Poder Moderador
I. Nomeando os Senadores, na fórma do Art. 43.

II. Convocando a Assembléa Geral extraordinariamente nos intervallos
das Sessões, quando assim o pede o bem do Imperio.

III. Sanccionando os Decretos e Resoluções da Assembléa
Geral para que tenham força de Lei.

IV. Approvando e suspendendo interinamente as Resoluções dos
Conselhos Provinciaes.

V. Prorrogando, ou adiando a Assembléa Geral e dissolvendo a Camara
dos Deputados, nos casos que o exigir a salvação do Estado; convocando
immediatamente outra que a substitua.

VI. Nomeando e demittindo livremente os Ministros de Estado.

VII. Suspendendo os Magistrados nos casos do Art. 154.

VIII. Perdoando e moderando as penas impostas aos Réos condemnados por
Sentença.

IX. Concedendo Amnistia em caso urgente, e que assim aconselhem a humanidade,
e bem do Estado.”

“O Imperador – consta no Art. 102 – é o Chefe do Poder Executivo,
e o exercita pelos seus Ministros de Estado”. “O Poder Legislativo
– estabelece o Art. 13 – é delegado á Assembléa Geral com
a Sancção do Imperador”. No parecer de Godofredo Autran,
insuspeito por ter escrito e lecionado em plena vigência da Constituição
imperial, “Dizer-se que o poder legislativo é delegado á
assembléa com a sancção do Imperador, é estabelecer
o principio de que o Imperador faz parte do poder legislativo”. Fecha-se,
assim, o cerco às instituições. A figura do Imperador permeia
todas elas. Mais que uma “chave de cúpula”, imóvel e
superior na manutenção do equilíbrio das forças
sociais, o poder do imperador se estava tornando, simplesmente, uma “chave”,
capaz de abrir e fechar todas as portas.

O Poder Representativo

O receio do desbordo das manifestações populares é claramente
visível na composição do Poder Legislativo prevista na
Constituição. Estruturado em duas câmaras, ele aproxima-se
mais ao modelo britânico do que ao americano. Enquanto a Camara dos Deputados
“é electiva, e temporária” (Art. 35), o Senado “é
composto de Membros vitalícios” (Art. 40). Porém, não
existindo, como na Inglaterra, uma corte de pares decantada pelo tempo, o Senado
deveria ser constituído “por eleição Provincial”.

As eleições eram indiretas, “elegendo a massa dos Cidadãos
activos em Assembléas Parochiaes os Eleitores de Provincia, e estes os
Representantes da Nação, e Província” (Art. 90). Essa
eleição, em degraus, tende a proporcionar um maior controle do
processo eleitoral, evitando as surpresas que uma eleição direta
poderia acarretar.

Embora o Art. 91 conceda o direito de votar, nas eleições primárias,
a todos “os Cidadãos Brazileiros, que estão no gozo de seus
direitos políticos” e ainda os “estrangeiros naturalisados”,
o 92 exclui desse direito:

“I. Os menores de vinte e cinco annos, nos quaes se não comprehendem
os casados, e Officiaes Militares, que forem maiores de vinte e um annos, os
Bachareis Formados, e Clerigos de Ordens Sacras.

II. Os filhos familias, que estiverem na companhia de seus pais, salvo se
servirem Officios publicos.

III. Os criados de servir, em cuja classe não entram os Guarda-livros,
e primeiros caixeiros das casas de commercio, os Criados da Casa Imperial, que
não forem de galão branco, e os administradores das fazendas ruraes,
e fabricas.

IV. Os Religiosos, e quaesquer, que vivam em Communidade claustral.

V. Os que não tiverem de renda liquida annual cem mil réis por
bens de raiz, industria, commercio, ou emprego”.

Nas eleições secundárias, a restrição aumenta.
O Art. 94 acrescenta as seguintes exclusões:

“I. Os que não tiverem de renda liquida annual duzentos mil réis
por bens de raiz, industria, commercio, ou emprego.
II. Os Libertos.

III. Os criminosos pronunciados em querela ou devassa”.

Para serem deputados, além dos excluídos nas restrições
anteriores, excetuam-se (Art. 95):

“I. Os que não tiverem quatrocentos mil réis de renda liquida.

II. Os Estrangeiros naturalisados.

III. Os que não professarem a Religião do Estado”.

Para o cargo de senador, conforme o Art. 45, exige-se como requisitos:

“I. Que seja Cidadão Brazileiro, e que esteja no gozo dos seus
Direitos Politicos.
II. Que tenha de idade quarenta annos para cima.

III. Que seja pessoa de saber, capacidade, e virtudes, com preferencia os que
tiverem feito serviços á Patria.

IV. Que tenha de rendimento annual por bens, industria, commercio ou empregos,
a somma de oitocentos mil réis”.

Finalmente, para o caso dos senadores, o Art. 43 especifica que os candidatos
escolhidos serão encaminhados “em listas triplices, sobre as quaes
o Imperador escolherá o terço na totalidade da lista”.

Essa gradação de filtros visa, claramente, excluir do processo político
as classes inferiores, vistas pelos constituintes como os setores mais instáveis
e mais permeáveis às pregações revolucionárias.

Veja também: A
Constituição de 1824
| Os poderes na Constituição do Império | Declaração
de direitos

Fontes: Prefeitura do Rio de Janeiro – Secretaria da Educação |
Tribunal de Justiça da Bahia

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