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Literatura Brasileira – José Inácio Vieira de Melo, poeta baiano, entrevistado por Leonardo Campos

by Lucas Gomes


José Inácio Vieira de Melo
Foto / Créditos: Ricardo Prado

José Inácio Vieira de Melo, alagoano da Bahia (1968), é
poeta, jornalista e produtor cultural. Publicou os livros Códigos
do silêncio
(2000), Decifração de abismos
(2002), A terceira romaria (2005) e A infância do centauro
(2007). Publicou também o livreto Luzeiro (2003), o CD de poemas
A casa dos meus quarenta anos (2008) e organizou Concerto lírico
a quinze vozes – Uma coletânea de novos poetas da Bahia
(2004).
Atualmente, está fazendo a curadoria e coordenando da Praça de
Cordel e Poesia da 9ª Bienal do Livro da Bahia, projeto que reúne
101 poetas de todas as regiões da Bahia.

Leonardo Campos – Parece uma pergunta muito comum,
mas não há como não fazê-la: em sua opinião,
qual o lugar da literatura hoje?

José Inácio Vieira de Melo – A literatura,
ao longo de século XX, foi perdendo intensamente o seu público,
ou seja, os leitores. Outras linguagens e outros suportes foram surgindo e,
por mais que a escrita tenha se adaptado, o campo de atuação ficou
reduzido. Escritores há, em quantidade e em qualidade. O que praticamente
não existe são os leitores. E se os encontramos, na sua maioria,
lêem o que há de pior: livros de alto-ajuda ou coisa parecida.
Outro fator que contribuiu de maneira decisiva para o agravamento deste problema
foi, e ainda é, a educação deficiente. Grande parte dos
alunos de ensino médio sai dos colégios sem ter capacidade de
compreender um texto que venham a ler. Não são analfabetos declarados,
mas são os verdadeiros analfabetos. De modo que a literatura ocupa um
espaço bastante restrito. Para que se tenha uma idéia, as tiragens
das obras completas dos nossos maiores poetas não passam de três
mil exemplares, isso em um país de quase 180 milhões de habitantes.

LC – Como você definiria a literatura brasileira
contemporânea?

JIVM – Heterogênea e vigorosa. Claro que tem muita
gente escrevendo por aí como se estivesse jogando m… no ventilador.
Aí aparece um grupelho que aplaude e, pronto, aquilo passa a ser publicado
nos principais jornais e passa a ter status de obra de vanguarda. Cinco ou seis
anos depois é que se percebe que aquela coisa era a retaguarda da retaguarda.
Mas existem escritores primorosos, como é o caso dos contistas e romancistas
Ronaldo Correia de Brito e Luiz Rufato, ou ainda dos poetas Roberval Pereyr,
Francisco Carvalho, Ruy Espinheira Filho e Alberto da Cunha Melo, este já
falecido.

LC – Algum artista em particular é fonte de inspiração
para os seus poemas?

JIVM – Toda literatura que leio e me comove passa a
ser uma referência. Recentemente, li Venho de um país selvagem,
livro do poeta paulista Rodrigo Petrônio, ganhador do Prêmio Nacional
de Poesia da Academia de Letras da Bahia, que tocou forte em mim, pois comunga
com meu livro inédito Rozeyral. Fiquei impressionado como escrevemos
diferente e, ainda assim, dialogamos com a mesma referência: o poeta português
Herberto Helder. Não que seja a única referência, mas é
a principal, pelo menos no livro de Rodrigo e no meu Rozeyral. Ainda
no Rozeyral, há a influência dos poetas Foed Castro Chamma
e Gerardo Mello Mourão, dentre outros.

LC – Todo bom amante da literatura possui os seus clássicos.
Quais são as cinco obras máximas da literatura brasileira?

JIVM – Não diria obras máximas da literatura
brasileira, mas as cinco que mais me arrebataram: A túnica inconsútil,
de Jorge de Lima; Os Peãs, de Gerardo Mello Mourão; Memórias
do Espantalho
, de Francisco Carvalho; Grande
Sertão: Veredas
, de João Guimarães Rosa; e Faca,
de Ronaldo Correia de Brito.

LC – Se você fosse definir a sua poesia, qual
a definição que você daria para ela?

JIVM – Tenho uma dificuldade enorme de definir minha
própria poesia. Prefiro que os outros o façam. Penso que Alexandre
Bonafim, poeta mineiro radicado em São Paulo, definiu bem a minha poesia
publicada até agora: “O lirismo de José Inácio
Vieira de Melo atinge-nos em nosso âmago, justamente por ser uma lírica
atenta ao que o homem tem de mais fundo, mais intenso. Pungente, sem deixar
de ser leve; existencial, sem abandonar a alegria viva, a poesia de José
Inácio é bíblica, sacra, pois revela em nosso cotidiano
um pergaminho de epifanias. Com efeito, há nesse lirismo, preciso e cortante,
feito apenas de palavras necessárias, aquele vislumbrar em perpétuo
encanto, tão característico das crianças e dos loucos.
E é por comungar com esse olhar “auroral” da infância,
dos delirantes, que a sua palavra desvela o mágico, o mítico,
no chão batido do cotidiano
”.

LC – Qual o seu poema predileto?

JIVM – São tantos… Mas já que tenho
que eleger um, lá vai: “O que as sereias diziam a Ulisses na noite
do mar”, de Gerardo Mello Mourão, primeiro poema do livro Cânon
e fuga
.

LC – Como você definiria a crítica literária
brasileira?

JIVM – A crítica literária acadêmica,
com poucas exceções, é a mais precária possível.
Aparece cheia de citações de teóricos estéreis da
moda, mas não consegue dizer nada da obra em questão. Na verdade,
a obra que supostamente seria analisada fica em terceiro ou quarto plano. Agindo
assim, tem-se uma postura acadêmica. Agora, há os heróis
da resistência, quatro gatos pingados que, cada vez mais, vão perdendo
os parcos espaços nos grandes jornais, mas que têm um compromisso
com a obra literária, que falam do livro, que iluminam os pontos apicais,
que desvelam as deficiências. A crítica, tão necessária,
parece ter seus dias contados. Mas ainda existem Wilson Martins, Affonso Romano
de Sant’Anna, Miguel Sanches Neto, André Seffrin e algumas jovens
promessas, como é o caso de Igor Fagundes e Rodrigo Petrônio.

Créditos: Leonardo Campos, Graduando em Letras Vernáculas
com Habilitação em Língua Estrangeira Moderna – Inglês
– UFBA | Membro do grupo de pesquisas “Da invenção à
reivenção do Nordeste” – Letras – UFBA | Pesquisador
na área de cinema, literatura e cultura

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