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Política Internacional – Entenda a crise nuclear envolvendo o Irã

by Lucas Gomes


Mahmoud Ahmadinejad, 6º Presidente do Irã

O programa nuclear iraniano é observado com suspeita em boa parte do
mundo. O Irã afirma, no entanto, que quer somente garantir seus direitos
no contexto do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares.
Os países ocidentais, sobretudo, não acreditam nas declarações
das lideranças iranianas que sempre reiteram sua intenção
pacífica, já que o programa serviria apenas a objetivos energéticos
civis.

A opinião pública mundial tomou consciência do programa
atômico iraniano em 2002. Foi quando a Agência Internacional de
Energia Atômica (AIEA), com sede em Viena, foi informada pelos serviços
secretos de alguns Estados que Teerã estaria trabalhando no enriquecimento
autônomo de urânio. De fato, um ano mais tarde, encontraram-se vestígios
de urânio enriquecido nas instalações atômicas de
Natanz.

À notícia de que a República Islâmica do Irã
teria escondido por 18 anos seu programa nuclear, a comunidade internacional
abriu os ouvidos, e exigiu negociações imediatas. Enquanto os
reformistas ainda estiveram no poder em Teerã, isso foi tarefa fácil.
A eleição de Mahmud Ahmadinejad, em meados de 2005, trouxe consigo
uma mudança. Pois o radical presidente não cedeu, e enfatizou
repetidamente: “Só aceitamos o nosso direito no contexto do Tratado
de Não-Proliferação de Armas Nucleares, nada mais e nada
menos”.

Posição de desconfiança

Essa frase caracteriza o discurso iraniano até hoje. Pois, em seu artigo
quarto, o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares,
que a República Islâmica do Irã ratificou – ao contrário
do Paquistão, Índia e Israel – garante o direito inalienável
a todos os signatários do tratado de “desenvolverem a pesquisa,
a produção e a utilização da energia nuclear para
fins pacíficos”.

A todos os signatários do documento – e portanto ao Irã
também – garante-se a possibilidade de participar “no mais
amplo intercâmbio possível de equipamento, materiais e informação”.
Especialmente devido à ação dos Estados Unidos, o Irã
está excluído, no entanto, desse legítimo intercâmbio.
Por esse motivo, o regime dos mulás obtém seu saber nuclear por
canais ocultos – mais especificamente através do Paquistão,
um aliado controverso de Washington na luta contra o terrorismo. Ainda por cima,
devido ao isolamento do Irã, a posição de Ahmadinejad perante
qualquer parceiro de negociações é de desconfiança.
“Eles acham que estão lidando com uma criança de quatro anos
de idade, a quem basta oferecer alguns castanhas ou chocolate para lhe tirar
o ouro. Não precisamos da ajuda dos europeus. Quando foi que pedimos
ajuda a vocês? Quando foi que lhe pedimos qualquer coisa para que vocês
possam agora, com provocações, privar-nos do nosso direito ao
desenvolvimento tecnológico? A nação iraniana não
irá suspender nem interromper o enriquecimento [de urânio]”,
declarou o chefe de Estado.

Resoluções da ONU


Irã desenvolveu secretamente instalações nucleares

No início de 2006, o Irã conseguiu até dominar o ciclo
completo do combustível nuclear e produzir urânio com um nível
de enriquecimento de 3,5%. Isso é suficiente para a geração
de energia, mas não para a produção de armas nucelares.
Naquele momento, o Irã dispunha de 164 centrífugas. Hoje, diz-se
que o país já possui 8 mil. Em setembro de 2009, Teerã
admitiu estar construindo uma segunda usina de enriquecimento de urânio
próximo à cidade de Qom, onde ainda não teria sido instalada,
até agora, nenhuma centrífuga.

O Conselho de Segurança da ONU já aprovou, até o momento,
quatro resoluções contra o programa nuclear iraniano, as quais
Teerã ignorou. O programa nuclear é endossado pela grande maioria
dos iranianos, e visto como uma questão de prestígio nacional.

“Estardalhaço absurdo”

No entanto, a posição rígida e inflexível assumida
pelo presidente é motivo frequente de crítica. Como salientou
o ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani, não se deve provocar guerra
devido à disputa atômica.

Ao mesmo tempo, Rafsanjani alertou o Ocidente: “Através de resoluções
vocês não chegarão a lugar nenhum, só criam problemas
para vocês, para o mundo e principalmente para nossa região. O
caminho certo é parar com esse estardalhaço absurdo”. Através
das reações dos EUA e de Israel, pode-se notar o quão explosiva
é a disputa em torno do programa nuclear iraniano. Ambos os países
já consideraram a possibilidade de empreender ataques militares contra
o Irã, algo que continuam a ver como uma possível opção.

O Irã tem desafiado uma resolução do Conselho de Segurança
da ONU que ordena a suspensão do enriquecimento de urânio no país.

No dia 25 de setembro deste ano (2009), o presidente dos Estados Unidos, Barack
Obama, acusou o governo iraniano de construir uma segunda usina de enriquecimento.
O Irã afirmou que o local se tratava apenas de uma usina piloto e permitiu
a inspeção de agentes da Agência Internacional de Energia
Atômica (AIEA), em 25 de outubro.

No final de novembro, o Irã recusou uma proposta da AIEA, apoiada pelos
principais países do Ocidente, que previa que 70% do urânio iraniano
com baixo grau de enriquecimento fosse enviado à Rússia e à
França para ser enriquecido e transformado em combustível nuclear,
a fim de ser usado no Irã.

A proposta poderia por fim à tensão provocada pelas ambições
nucleares de Teerã. O governo iraniano diz que o seu programa nuclear
tem fins pacíficos, mas vários países, entre eles os Estados
Unidos, temem que ele seja usado para desenvolver armas atômicas.

O ministro das Relações Exteriores do Irã, Manouchehr
Mottaki, disse, no entanto, que o país não aceita enviar seu urânio
para enriquecimento no exterior, mas aceitaria a possibilidade de trocar o urânio
por combustível nuclear dentro do próprio território iraniano.

Confira uma lista de perguntas que explicam a crise nuclear envolvendo o Irã.

O que se sabe sobre a segunda usina de enriquecimento de urânio?

A usina fica perto de Qom em uma montanha num local chamado Fordu. O presidente
Obama disse que o tamanho e espaço da usina era “inconsistente”
com um programa nuclear pacífico, o que provavelmente significa que o
local era muito pequeno para enriquecer urânio suficiente para produção
de combustível e grande o bastante para enriquecer o necessário
para uma bomba. A AIEA realizou uma inspeção em outubro e afirmou
que a usina tem espaço para 3 mil centrífugas. O diretor da AIEA,
Mohamed El-Baradei descreveu o local como “um buraco em uma montanha”
e que não há nada para se preocupar. Apesar disso, o relatório
levantou dúvidas sobre a possibilidade de existirem outras usinas secretas
e disse que a discrição que envolveu a construção
desta usina “não contribuiu para a construção da confiança”.

Por que o Irã está recusando obedecer as resoluções
do Conselho de Segurança?

O Tratado de Não-Proliferação Nuclear (NPT, na sigla em
inglês) prevê que cada Estado signatário tem o direito de
enriquecer urânio para ser usado como combustível para a energia
nuclear civil. Esses Estados devem permanecer sob inspeção da
AIEA e o Irã é um deles. Apesar disso, apenas os Estados signatários
que já possuíam armas nucleares no ato da assinatura do Tratado,
em 1968, podem enriquecer urânio ao nível necessário para
a produção de uma arma nuclear. O Irã diz que está
fazendo apenas o que é previsto no Tratado e pretende apenas enriquecer
urânio ao nível necessário para uma usina de energia para
combustível. O país ainda responsabiliza as resoluções
do Conselho de Segurança de pressão política pelos Estados
Unidos e seus aliados e argumenta que precisa de energia nuclear e quer o controle
desse processo. O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, já repetiu
diversas vezes que não irá se render à pressão internacional.

O que o Irã diz sobre o desenvolvimento de armas nucleares?

O governo diz que não descumprirá as obrigações
previstas no NPT e não usará a tecnologia para produzir uma bomba
nuclear. Em 18 de setembro, o presidente Ahmadinejad disse à NBC News
que “não precisamos de armas nucleares, não é parte
do nosso programa ou de nossos planos”. Ele disse ainda que os Estados
que possuem armas nucleares deviam desarmar-se. Logo depois, o líder
supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, também afirmou:
“nós fundamentalmente rejeitamos as armas nucleares”.

Por que o Conselho de Segurança ordenou que o Irã interrompesse
o enriquecimento?

Porque a tecnologia usada para enriquecer urânio para uso combustível
como energia nuclear também pode ser usada para enriquecer o urânio
ao nível necessário para a produção de uma explosão
nuclear. Há receio de que o Irã esteja ao menos tentando adquirir
experiência para que um dia tenha a opção para produzir
uma bomba. O Irã escondeu o programa de enriquecimento por 18 anos, então
o Conselho de Segurança disse que até que as intenções
pacíficas do programa nuclear do país possam ser estabelecidas
por completo, o país deve interromper o enriquecimento e algumas outras
atividades nucleares. A ordem do Conselho é obrigatória e substitui
outros direitos.

Que sanções já foram impostas contra o Irã?

Em março de 2008, a ONU impôs uma última rodada de sanções,
que incluem a proibição de viagens internacionais para cinco autoridades
iranianas e o congelamento de ativos financeiros no exterior de 13 companhias
e de 13 autoridades iranianas. A resolução também impede
a venda para o Irã dos chamados itens de “uso duplo” – que
podem ter tanto objetivos pacíficos como militares. Em 10 de junho de
2008 os Estados Unidos e União Europeia anunciaram que estariam dispostos
a reforçar as sanções com medidas adicionais. Treze dias
depois, a EU concordou em congelar bens do maior banco iraniano, o Banco Melli,
e estender a proibição de vistos para iranianos envolvidos no
desenvolvimento do programa nuclear. Ainda em junho daquele ano, o então
representante da União Europeia para política externa, Javier
Solana apresentou, em nome de China, UE, Rússia e Estados Unidos um pacote
de incentivos econômicos ao Irã em troca de garantias de que o
país não irá fabricar armas nucleares. Um porta-voz do
governo respondeu que a posição do país sobre seus direitos
de desenvolver seu programa nuclear permaneceria a mesma.

Quais novas sanções seriam possíveis?

A Rússia e a China estão relutantes em concordar com novas sanções
do Conselho de Segurança. Por isso, uma coalizão de países,
que inclui a União Europeia, podem tomar algumas ações
separadamente. Já foi considerado parar a exportação de
produtos de petróleo refinado para o país. Apesar da riqueza petroleira,
o Irã não consegue produzir uma quantidade suficiente desses produtos
sozinho. Apesar disso, há oposição à essa ideia
porque poderia afetar a população geral. Pode haver esforços
para conseguir uma proibição para o investimento de petróleo
e gás e em negócios financeiros.

Alguns incentivos estão sendo oferecidos ao Irã. Quais
são eles?

Estados Unidos, Rússia, China, Grã-Bretanha, França e
Alemanha afirmam que se o Irã suspender o enriquecimento de urânio,
podem começar as negociações para um acordo de longo prazo.
A oferta prevê ao reconhecimento do direito do Irã desenvolver
energia nuclear para fins pacíficos e o diz ainda que o Irã será
tratado “da mesma maneira” que outros Estados signatários do
Tratado de Não-Proliferação. O Irã teria ajuda para
desenvolver usinas de energia nuclear e teria garantias de combustível
para as usinas. Além disso, receberia concessões comerciais, inclusive
o possível fim das sanções dos EUA, que proíbe o
país, por exemplo, de comprar novas aeronaves civis e equipamentos para
os aviões.

Quais são as chances de um ataque contra o Irã?

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, já falou diversas
vezes do que acredita ser uma ameaça em potencial do Irã. Há
relatos de que Israel tenha realizado um grande exercício aéreo,
considerado um teste para uma eventual ofensiva contra o território iraniano.
O governo de Israel não acredita que os meios diplomáticos forçarão
o Irã a suspender o enriquecimento de urânio e não quer
Teerã sequer desenvolva capacidade técnica para produzir uma bomba
nuclear. Portanto, a possibilidade de um ataque de Israel permanece.

Já é tarde demais para fazer o Irã parar de adquirir
tecnologia para enriquecimento de urânio?

O Irã acha e já afirmou que sim. O aiatolá Khamenei considera
a capacidade de enriquecer urânio “uma grande vitória”.
De acordo com Mohamed El-Baradei, os últimos acontecimentos tornaram
a atual estratégia obsoleta e o Irã deve agora ser autorizado
a realizar um enriquecimento limitado, mas sob supervisão rigorosa. A
sugestão foi rejeitada pelos Estados Unidos e seus aliados.

Afinal, o que, na prática, impede o Irã de fazer uma
bomba nuclear?

Especialistas acreditam que o Irã poderia enriquecer urânio suficiente
para construir uma bomba em alguns meses. Entretanto, o país aparentemente
ainda não detém o domínio da tecnologia para criar uma
ogiva nuclear. Em teoria, o Irã poderia anunciar que está abandonando
o Tratado de Não-Proliferação das armas nucleares e, três
meses depois de fazê-lo, estaria livre para fazer o que bem entendesse.
Mas ao fazer isso, o país estaria sinalizando suas intenções
e ficaria vulnerável a ataques. Se o Irã tentasse obter secretamente
o material para fazer uma bomba e o plano fosse descoberto, o país estaria
vulnerável da mesma forma. Por isso, Baradei acredita que a ameaça
de que o Irã desenvolva uma bomba atômica tem sido exagerada.

Os países que já têm armas nucleares e são
signatários do tratado de Não-Proliferação nuclear
não se comprometeram a acabar com esses armamentos?

O artigo 6º do Tratado obriga os signatários a “fazer negociações
de boa-fé sobre medidas que levem ao fim da corrida armamentista nuclear
em uma data próxima e ao desarmamento nuclear”. As potências
nucleares alegam que têm feito isso ao reduzir seus arsenais, mas críticos
alegam que eles, na verdade, não tem seguido no caminho do desarmamento.
Analistas também argumentam que os Estados Unidos e a Grã-Bretanha
violaram o tratado ao transferirem tecnologia nuclear de um para o outro.

E Israel, inimigo do Irã na esfera internacional, tem bombas
nucleares?

Sim. Contudo, como Israel não é signatário do Tratado
de Não-Proliferação Nuclear, não é obrigado
a obedecê-lo. O mesmo pode ser dito da Índia ou do Paquistão,
dois países que têm armamentos nucleares. A Coreia do Norte abandonou
o tratado e anunciou que também tem a capacidade de ter bombas atômicas.
Em 18 de setembro de 2009, a AIEA pediu a adesão de Israel ao NPT ou
que o país permita que suas instalações nucleares sejam
inspecionadas. Israel se recusa a aderir ao acordo ou permitir a supervisão.
Acredita-se que o país tenha até 400 ogivas nucleares, mas se
nega a confirmar ou confirmar isso.

Fonte: BBC Brasil

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