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História da Mecânica: 7. A Mecânica de Newton

by Lucas Gomes


Isaac Newton

No seu último livro, Galileu, que morreu no ano do nascimento de Isaac
Newton
(1642 – 1727), escreveu “o futuro nos conduzirá a uma obra mais ampla
e melhor e da qual nosso trabalho é apenas o começo; espíritos mais aprofundados
do que o meu explorarão os rincões mais ocultos”. Pode-se dizer, como veremos,
que Newton implementou a tarefa vaticinada por Galileu.

É necessário mencionar aqui que Newton foi profundamente influenciado pela visão
mecanicista do mundo, criada pelo filósofo e matemático francês René Descartes
(1596 – 1650) . Nessa visão, o universo todo está em movimento e sua descrição
se resume a entender as interações básicas dos componentes do universo e formular
matematicamente as leis que regem esses constituintes.

Sua contribuição à mecânica não se resume à sua influência filosófica. Em 1629,
escreveu para Mersenne, outro grande matemático seu contemporâneo: “eu suponho
que o movimento uma vez impresso a um corpo permanece para sempre se não é destruido
por outros meios. Em outras palavras, algo que tenha iniciado seu movimento no
vácuo se moverá indefinidamente com a mesma velocidade
“, que é a formulação
do princípio de inércia feita posteriormente por Newton.

Descartes estudou ainda a colisão de dois corpos, tendo conjeturado a conservação da quantidade de movimento, ainda que no
movimento em linha reta.

Newton
revolucionou a ciência com sua teoria sobre o movimento. Ele desenvolveu as leis
básicas do movimento (da dinâmica) e a da gravitação e estabeleceu a universalidade
das leis físicas. As leis que valem na Terra se aplicam igualmente a qualquer
parte do Universo. Sua lei da gravitação é conhecida, por isso, como Lei da Gravitação
Universal.

Em sua obra publicada em 1687, com o título Philosophiae Naturalis Principia
Mathematica
(“Princípios Matemáticos da Filosofia Natural”), enunciou
as três leis fundamentais da Mecânica. Nessa obra Newton procura, como o nome
da obra antecipa, aplicar os princípios matemáticos na descrição dos fenômenos
naturais relacionados ao movimento, agora de uma forma geral.

Os “Principia” se tornaram um texto clássico da Mecânica e a teoria de Newton, um paradigma de teoria em Física.

Newton apresenta, em sua obra, oito definições básicas para o entendimento do movimento, que aqui reproduzimos:

1. A quantidade de matéria é a medida da mesma, resultando da densidade e do volume conjuntamente.

2. A quantidade de movimento é a medida do mesmo, resultando da velocidade e da quantidade de matéria conjuntamente.

3. A vis insita ou força inata da matéria é um poder
de resistência, pelo qual cada corpo, por quanto de si depender, continua no seu
estado presente, seja de repouso ou de movimento para diante em linha reta. Essa
vis insita é também chamada de força de inércia (vis inertiae).

4. Uma força impressa é uma ação exercida sobre um corpo para mudar seu estado de repouso ou de movimento uniforme em linha reta.
Essa força só existe enquanto dura a ação.

5. Uma força centrífuga é a que atrai ou impele ou, de qualquer modo, faz tender os corpos para um centro.

6. A quantidade absoluta de uma força centrífuga é a medida da mesma, proporcional à eficiência da causa que a propaga do centro
pelo espaço em redor.

7. A quantidade aceleradora de uma força centrífuga é a medida da mesma, proporcional à quantidade de velocidade que gera num
tempo dado.

8. A quantidade motora de uma força centrífuga é a medida da mesma, proporcional ao movimento que gera num tempo dado.

Depois de ter exposto as definições precedentes, Newton passa a enunciar os Axiomas ou leis do movimento:

Lei I: Cada corpo continua no seu estado de repouso ou de movimento uniforme em linha reta, salvo se for compelido
a mudar este estado por forças sobre ele impressas.

Lei II: A mudança do movimento é proporcional à força motriz impressa, e é feita na direção em que a força é
impressa.

Lei III: A toda ação corresponde uma reação igual oposta, ou: as ações mútuas de dois corpos um sobre o outro são
sempre iguais e dirigidas de lados contrários.

Newton deduziu seis corolários:

1. Um corpo, ativado simultaneamente por duas forças, descreverá a diagonal do pararelogramo no mesmo tempo em que descreveria os lados
pelas forças separadamente.

2. E daí fica explicada a composição de uma força direta AD, a partir de duas forças oblíquas AC e DC; e inversamente, a resolução
de qualquer força direta AD em duas forças oblíquas AC e CD; as quais composição e resolução são abundantemente confirmadas pela
Mecânica.

3. A quantidade de movimento, que se obtém tomando a soma dos movimentos dirigidos para as mesmas partes, e as diferenças dos que
são dirigidos para partes contrárias, não sofre variação pela ação dos corpos entre si.

4. O centro de gravidade comum a dois ou mais corpos não altera seu estado de repouso ou movimento pelas ações dos corpos entre si;
e portanto o centro da gravidade comum a todos os corpos agindo uns sobre os outros (excluindo ações externas e empecilhos) está em
repouso ou se move uniformemente em linha reta.

5. Os movimentos mútuos dos corpos incluídos num certo espaço são os mesmos, quer o espaço esteja em repouso ou se mova uniformemente
para diante em linha reta sem nenhum movimento circular.

6. Se corpos, movendo-se de qualquer modo entre si mesmos, são impelidos na direção de linhas paralelas por forças aceleradoras
iguais, continuarão todos a se mover entre si, do mesmo modo como se fossem impelidos por tais forças.

As citações dos Philosophiae Naturalis Principia Mathematica foram tomadas
da tradução inglesa de Motte revista por Cajori, edição da University of California
Press, de 1934, de acordo com o trabalho de Mário Schemberg. A tradução inglesa
de Motte foi feita da terceira edição dos Principia, de 1726. O prefácio da primeira
data é de 1686. Procuramos conservar, na medida do possível, a linguagem newtoniana
para evidenciar que a formulação das leis da mecânica, que é feita atualmente,
é bem diversa da formulação feita por Newton.


Christiaan Huygens

Algumas das leis ou definições de Newton já estavam, em parte, compreendidas nos
trabalhos de Galileu, Descartes e Christiaan Huygens (1629 – 1695). Particularmente,
a primeira lei – lei da Inércia – foi formulada por vários investigadores antes
de Newton (Decartes e Huyhens, por exemplo). A segunda lei, relacionando força
e aceleração, já era, de alguma forma, do conhecimento de Galileu e Huygens, que
haviam percebido, no caso da queda livre, que a força da gravidade é o que determina
a aceleração. Newton, no caso da 2ª lei, generalizou a relação entre força e aceleração
para todos os movimentos. Sua terceira lei, da ação e reação, deve ser inteiramente
creditada a ele.

O mérito diferenciado de Newton está no fato de ter construído uma formulação teórica de leis e definições bem estruturada, que
contemplava todos os aspectos do movimento então conhecidos, onde quer que ocorressem. Ao introduzir o cálculo diferencial na descrição
de fenômenos físicos, foi possível a descrição quantitativa dos fenômenos e a previsão de outros com grande precisão, causando um
grande impacto na cultura científica.

Outra contribuição fundamental dada por Newton à ciência foi a lei da Gravitação Universal, uma das leis fundamentais de interação no
universo físico. Newton percebeu que, se dois corpos de massa ma e mb estão a uma distância d, então surge, em cada um deles, uma
força gravitacional que é diretamente proporcional às massas, inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles, tem a
direção da linha que une os dois corpos e o sentido de atração entre eles. Assim, a força que atua numa maçã que cai ao chão tem a
mesma origem que aquela que atua para sustentar a Lua em órbita, mas tem intensidade menor do que esta última, segundo o quadrado da
razão entre a distância da Lua e o raio da Terra.

A partir da lei da Gravitação Universal e das leis do Movimento, foi possível formular o movimento dos corpos celestes – a mecânica
celeste – a partir de ingredientes básicos. A previsão da posição e velocidade dos corpos celestes passou a ser possível com
grande precisão. Newton aplicou a lei da Gravitação universal para entender o movimento dos planetas em torno do Sol. A
universalidade da gravitação foi posteriormente ampliada através das observações de um astrônomo do século XVIII, William Herschel,
que decobriu que estrelas binárias , orbitando uma em torno da outra, obedeciam à mesma Lei da Gravitação que os planetas do Sistema
Solar.

Outra descoberta interessante, no domínio da mecânica, foi a percepção de que as marés têm relação com a força gravitacional exercida
pela Lua sobre os objetos na Terra.

Newton empreendeu seus primeiros estudos sobre a gravitação entre os anos de 1665 e 1666. No entanto, os resultados das suas
investigações só apareceram cerca de 20 anos depois, muito provavelmente porque lhe tomou algum tempo demonstrar que, no movimento
de translação de objetos esféricos, pode-se considerar toda a sua massa como se estivesse concentrada no centro e usar a teoria geral
de movimento de um ponto. O atraso em sua publicação deveu-se também, em parte, aos seus reveses com a sociedade científica da época
em função de seu caráter.


Gottfried Wilhelm Leibniz

Para definir de uma forma precisa o conceito de “variação” (o que conhecemos hoje
como taxa de variação de uma grandeza), essencial na descrição do movimento, que
envolve variações do espaço no tempo (velocidades) e variações da velocidade no
tempo (acelerações), Newton criou o cálculo diferencial, método que de fato foi
desenvolvido em parte pelo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646 – 1716).

Newton foi nomeado, aos 26 anos, professor da Universidade de Cambridge e, aos 30 anos, em 1672, foi eleito membro da “Royal Society”,
fundada dez anos antes, a mais alta honraria para um cientista na Inglaterra. Segundo seus biógrafos, Newton era uma pessoa isolada,
sempre absorto em seus pensamentos e não muito agradável em seu ambiente de trabalho. Envolvia-se freqüentemente em controvérsia com
seus colegas professores, disputando prioridade sobre algumas idéias. Suas contrariedades no meio acadêmico teriam contribuído para
o adiamento da publicação de suas idéia, o que aconteceu duas décadas depois por estímulo de Halley.

Newton abandonou a vida acadêmica aos 50 anos de idade e, em 1696, aos 54 anos, foi nomeado administrador e, posteriormente, diretor
da Casa da Moeda de Londres. Em 1705 foi sagrado cavaleiro, tornando-se Sir Isaac, e recebeu inúmeras outras honrarias ao longo de
sua vida. Faleceu em 1727, com 85 anos.

Entretanto, consta também que Newton comentou, em certa ocasião, em relação à
contribuição de seus predecessores: “Se fui capaz de ver mais longe, é porque
me apoiei nos ombros de gigantes
.”

Pouco antes de sua morte, Newton expressou a sua visão sobre seu próprio trabalho da seguinte forma: “Não sei como apareço aos
olhos do mundo; aos meus próprios, pareço ter sido apenas como um menino, brincando na praia, e divetindo-me em encontrar de vez
em quando um seixo mais roliço ou uma concha mais bela que de ordinário, enquanto o grande oceano da verdade jazia todo inexplorado
à minha frente.”

Huygens foi, ao lado de Galileu e Newton, outra figura importante no desenvolvimento
da mecânica. Entre suas contribuições apresentadas no tratado “Horologium
oscillatorium sine de motu pendulorum ad horologia aptato demonstrationes geometricae

(Paris, 1673), destaca-se:

1) a compreensão da causa do isocronismo do pêndulo, ao descobrir que o período depende da raiz quadrada da razão
entre o comprimento do pêndulo e a aceleração da gravidade. A partir de Huyghens foi possível construir um instrumento de medir o
tempo com precisão: o relógio de pêndulo.

2) o estudo dos chamados pêndulos físicos, ou seja, o movimento oscilatório de corpos rígidos. Em particular,
inventou a forma de determinar o ponto de oscilação do corpo rígido e introduziu o conceito de momento de inércia do corpo rígido.

3) o papel e as características da força centrífuga. Ele estabeleceu o princípio da força centrífuga e demonstrou
que estas forças variam na relação direta do quadrado da velocidade e inversa do raio da curvatura.

Além disso, Huyghens deu importantes contribuições sobre as leis que regem o fenômeno das colisões. Suas pesquisas neste campo foram
colecionadas na obra póstuma “De motu corporum ex percussione”. Nela se constata que Huyghens já tinha conhecimento da Lei da Inércia:
“qualquer corpo em movimento tende a permanecer em linha reta e com a mesma velocidade até que encontre um obstáculo.”

Coube ainda a Huygens estabelecer a expressão correta para a “força viva” ou “capacidade
de ação”, a grandeza mv2/2, conhecida hoje como energia cinética.

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