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A Ilustre Casa de Ramires, de Eça de Queirós

by Lucas Gomes

Análise da obra

O romance
simbólico, A Ilustre Casa de Ramires, é fruto da
maturidade intelectual de Eça de Oueirós, revela o reencontro
do autor com os temas e aspirações nacionais. A aproximação
entre o protagonista, Gonçalo Mendes Ramires,
e Portugal é explicitada no final,
na comparação do amigo João Gouveia, que esboça com nitidez, no retrato que
faz de Gonçalo, o caráter nacional português. Leia nas palavras de João Gouveia
a síntese de um modo de ser português
que o romance ilustrou fartamente:

    
– Pois eu tenho estudado muito o nono amigo Gonçalo Mondes.
E sabem vocês, sabe o senhor Padre Soeiro quem ele me lembra?

     – Quem?

    – Talvez se riam. Mas eu sustento a
semelhança. Aquele todo de Gonçalo, a franqueza, a doçura, a bondade, a imensa
bondade, que notou o senhor Padre Soeiro… Os fogachos e entusiasmos, que
acabam logo em fumo, e juntamente muita
persistência, muito af
erro
quando se fila à sua
idéia.
A generosidade,
o desleixo, a constante trapalhada nos negócios, sentimentos de multa honra, uns
escrúpulos quase pueris, não
verdade?… A imaginação que o leva sempre a exagerar até
mentira, e ao mesmo
tempo um espírito prático, sempre alento à
realidade útil. A viveza, a facilidade em
compreender, em apanhar… A esperança constante nalgum
milagre, no velho milagre de
Ourique, que sanará todas as dificuldades…
A vaidade, o gosto de se arrebicar, de luzir,
e uma simplicidade tão grande, que dá na
rua o braço
a um mendigo… Um fundo de
melancolia, apesar de tão pairador, tão sociável. A
desconfiança terrível de si mesmo que o acobarda, o
encolhe, até que um dia se decide, e aparece
um herói, que tudo arrasa… Até aquela antigüidade
de raça, aqui pegada à sua velha torre,
há mil anos… Até agora aquele arranque para a África… Assim todo
completo, com o bem, com o mal, sabem vocês quem ele me lembra?

    –  Quem?…

    –  Portugal.


   
Os três amigos retornaram o caminho de
Vila-Clara. No céu
branco
uma
estrelinha
tremeluzia
sobre Santa Maria
de
Craquede. E Padre Soeiro,
com o seu guarda-sol sob o braço, recolheu à torre
vagarosamente, no silêncio e doçura da tarde, rezando
as
suas ave-marias, e pedindo a paz de Deus para Gonçalo, para todos os
homens, para campos e casais adormecidos, e para a terra
formosa de Portugal, tão cheia de graça amorável, que
sempre bendita fosse entre as terras
“.

O caráter paradoxal do protagonista, volúvel
e persistente; desleixado e escrupuloso; sonhador e
pragmático; vaidoso e despojado; melancólico e falador; medroso e afoito;
covarde e heróico; apegado ao passado, mas que, num arroubo visionário,
arremete-se à aventura africana; bom e mau; — todo esse jogo de contradições
impõe a antítese como o elemento
estrutural do romance, a partir da engenhosa solução de
embutir no romance realista do sáculo XIX uma novela histórica, ambientada no
sáculo XIII, e de entrelaçá­las como um jogo de antíteses, em torno do eixo
fundamental: presente (a decadência) x passado (o heroismo, a glória).

Essa estrutura antitética permitiu
a Eça exprimir sua
dúbia natureza: a
do observador crítico do seu mundo e de
lírico visionário, através da composição de duas histórias distintas e contudo
integradas, vazadas em dois estilos literários, o
realista e o romântico, que dialogam incessantemente,
em contraponto, constituindo uma unidade coerente, complexa e artisticamente bem
realizada.

A construção e a fusão da história
principal de Gonçalo e da novela inserida de Tructesindo exemplificam a mestria
do escritor. Ao comparar as duas versões da obra, a publicada em folhetins, na
Revista Moderna (1897
/ 1898), e a definitiva, ampliada, editada em livro, no ano da
morte de Eça, em 1900, Álvaro Lins.
observa que, se ao escrever a novela histórica sobre
Tructesindo Metidas Ramires, Eça
pretendeu satirizar o gênero que consagrou Alexandre Herculano, Garrett
e Rebelo da Silva, fazendo um “pastiche”,
ou um paródia irônica, acabou por construir uma pequena obra-prima da história
portuguesa, uma reabilitação do romance histórico.

Horneni Cidade observa que:
“Nenhum romance
histórico, de meu conhecimento,
é, como este, adequado à demonstração da
eficácia,
do gênero para a ressurreição
de
uma
alma
amortecida, por
insinuação
das energias evocadas de
antepassados históricos. Pode, talvez, admitir-se como
possível de Eça a tese da ineficiência
da novela histórica no fortalecimento das energias coletivas. Mas seria bem
estranho que, para provar tal ineficiência, se pusesse tão poderosamente
evidente a transformação,
por uma novela, duma vida i
ndividual.”
(Colóquio-Letras,

23,
Janeiro
de 1975)

Ao analisar o romance, João
Medina destaca uma passagem na qual os vizinhos e amigos do fidalgo, sabendo
do rasgo de Gonçalo ao castigar o valentia que o desrespeitara, “sorriam
para a velha Torre, escura e rígida, na doce claridade
da tarde de Setembro, como saudando, depois do herói,
o secular fundamento de seu heroísmo”.

Para esse crítico,
“todo o romance se condensa nesta
frase simbólica: para Gonçalo, confesso retrato-símbolo do país,
a questão é, como para Hamlet no
palácio pestilencial de Elsenor, a do resgate da comunidade:
conto agir? como quebrar o circulo do mal e nele inserir
uma ação justa e libertadora? Como salvar-se e, ao fazê-lo, salvar a Dinamarca
inteira? A resposta parece ser uma só: pelo
recurso aos fundamentos mesmos da nacionalidade, ou seja,
reacordando as forças da uma nação prostrada, mas ainda capaz de grandeza e vida.

(Colóquio-Letras,
nº 14, julho de 1973)

O domínio que o autor exerce sobre o leitor é mais forte na
versão do livro por causa do seu emprego maia vasto da narração
e da descrição subjetivas, assim como da maior quantidade de diálogos dramáticos.
Os ângulos ambíguos da narrativa e do diálogo unem mais o autor, o narrador,
a personagem e o leitor na mesma projeção
física e emocional. Muitas vezes o leitor não é capaz
de dizer quem é que está a conduzir o fio da narrativa, ou quem está a falar
em estilo indireto-livre, se é a personagem
ou o narrador subjetivo. Essa ambigüidade do ângulo da
narrativa e a mudança constante da narração objetiva
para a subjetiva fazem parte da visão impressionista
que Eça tinha da composição literária. Uma confusão ainda
maior do foco narrativo é causada pelos múltiplos planos
literários da ficção em A ilustre Casa da Ramires.
A história principal (o romance realista-impressionista
A Ilustre Casa de Ramires);
a história inserida
(a novela histórica romântica, ambientada na Idade Média, A Torre
de D. Ramires
,
poemeto épico do tio Duarte, O Castelo de
Santa lrinéia
e o Fado dos Ramires,
trovado pelo violeiro
Videirinha; alternam no foco da narrativa e confundem
ainda mais o leitor.

Foco
narrativo / Tempo

Narrado em terceira pessoa, por narrador onisciente, que não
se identifica na trama,
o romance realista, ambientado na segunda metade do século XIX, tem a duração
cronológica de cinco anos; do início da escritura da
novela histórica, A Torre dos Ramires, em junho de, presumivelmente, 1696, até
a conclusão da novela e quatro anos após, o regresso de Gonçalo de sua bem-sucedida
aventura africana. Assim, o período em que o protagonista Gonçalo escreve
a sua novela sobre o avoengo Tructesindo
é o mesmo em que Eça escreve o
romance realista, que tem como centro exatamente o Gonçalo,
narrador de A Torre de Ramires.
É o que se pode concluir do seguinte
fato: Gonçalo, ao escrever a sua novela histórica, aclimatada
no século XIII, tem como fonte um poemeto épico,
O Castelo de Santa Irinéia,
escrito pelo tio materno Duarte, em 1846. Gonçalo
supõe que o poerneto do tio já
tivesse sido esquecido, e que seria fácil transpor
as formas fluídas
do Romantismo de 1846 para a sua prosa máscula
(como confessava o Pinheiro), de uma densidade de
mármore (maneira lapidária de
Salambô”.

Ao apontar a dois períodos literários que seriam comparados (o Romantismo de
Tio Duarte, ou de Herculano, Garrett e Rebelo da Silva, e o Realismo de Gustavo
Flaubert, autor de Salambô, Eça situa claramente a história no seu tempo, cerca
de cinqüenta anos depois de 1846, ou seja, em 1896. Quanto à idade do protagonista,
quando Gonçalo inicia seu empreendimento literário, pode ser determinada a partir
de informações que constam do flash back inicial: Gonçalo encontrou Pinheiro,
no Rossio, no mês anterior ao do começo da história – em julho, e isto aconteceu
um ano depois de Gonçalo ter se formado em Coimbra. O pai do fidalgo morrera
quando ele cursava, com 22 anos, o 3º ano da faculdade. Assim, 22 anos + 2 anos
até a formatura + 1 ano depois de formado = 25 anos, quando o romance começa.

Enredo

No primeiro capítulo, o fidalgo aparece trabalhando
o seu projeto literário, na livraria do solar de
Santa Irinéia, tendo vista
para a inspiradora de
sua novela, a antiquíssima Torre
dos Ramires, que remontava ao
século X.

Depois de determinar
o tempo imediato e o lugar da
história, Eça recua no tempo para narrar
a origem e evoluçãoda
nobre linha dos
Mendes Ramires, a começar
com o casamento de Ordonho Mendes, em 987, com Dona Elduara,
filha de Bermudo,
o Gotoso, rei de Leão. Isto é
feito, primeiro imediatamente,
por intermédio da voz narrativa do genealogista dos Ramires,
em estilo indireto livre:
Gonçalo Mandes Rentes (como confessava esse
severo genealogista, o barão de
S. Prudêncio) era, talvez, o mais
genuíno e antigo fidalgo de Portugal.

Desde os tempos de D. Ordonho Mendes
que a família Ramires se
notabilizara pelos seus feitos heróicos:
“E assim, em cada lance da história de
Portugal se encontra um Mendes Ramires.

O genealogista dá-nos, deste
modo, a história dos Ramires, até
o presente real. As intenções satíricasde
Eça começam a transparecer
através de um véu de semi-seriedade.
Lourenço Ramires toma parte
da batalha de Ourique
e testemunha o aparecimento de
Jesus Cristo;  Martim Ramires
toma parte do cerco
de Tavira;
Egas Ramires
recusa-se a
deixar entrar Dona Leonor
Teles na torre; Diogo Ramires
mostra sua coragem em Aljubarrota;
Fernão Ramiree
e seu filho ganham fama em
Alcácova; Baltazar Ramires deixa-se
deliberadamente afundar com seu navio;
Paulo RamiIres sacrifica-se
em Alcácer-Quibir;
Vicente Ramires ajuda na
restauração de
D. João IV na batalha contra o domínio espanhol.

O Ultimato Britânico de 1890,
que exigia a
retirada das
forças portuguesas
de uma de suas possessões africanas,
que o governo humilhantemente acatou, e a virtual bancarrota
que se seguiu ao duro abalo da ameaça inglesa acenderam
os brios nacionais. Foi o
que aconteceu também a Gonçalo: depois de
ter chicoteado o valentão de suiças loiras, superando
suas dúvidas e sua covardia, o fidalgo confessa:
“Foi talvez que, depois da desordem, me senti remoçado, com
um sangue novo,
e me julguei no tempo em que
desejávamos urna guerra em Portugal, e nós, cercados na torre, sob o nosso
pendão, o nosso terço atirando bombardas aos espanhóis.
”

O passado imediato do pai de Gonçalo é
narrado pela voz do narrador original, onisciente, que substitui o
genealogista. O pai do protagonista é descrito como
oscilando de partido em partido ora regenerador, ora
histórico, vivendo constantemente endividado
em Lisboa, até ser nomeado Governador Civil de Oliveira
pelo Ministro, cuja amante ele costumava, respeitosameente,
acompanhar a S. Carlos. Neste mesmo
ano Gonçalo é reprovado no 3º ano de Coimbra. O fracasso
do protagonista, na linha do tempo, é colocado em
paralelo com as manobrar políticas do pai (semelhantes às
que o filho protagonizará mais
tarde). O narrador prepara o leitor para o modus
operandi
de Gonçalo.

O problema central de Gonçalo
é a falta de dinheiro. Deve ainda seiscentos mil-réis
do último ano da
faculdade. O arrendamento de suas
terras mal dá para manter o solar, com
o Bento, velho criado, e Rosa, a cozinheira. Assim, a
política pareceu o caminho mais fácil para a reabilitação
econômica e social.
Mas havia
dois obstáculos:
os históricos estavam
no poder, e
Gonçalo era do Partido Regenerador, e a cadeira de
deputado, representante da sua circunscrição eleitoral, estava
preenchida pelo velho e poderoso Sanches de Lucena,
marido do D. Ana de Lucena,
mulher formosa e mal-falada, vulgar, que, mais tarde,
já viúva, será incorporada aos
planos (frustrados) do fidalgo de arranjar-se economicamente.

Assim, a curto prazo, seus projetos
políticos são inviáveis e resta a Gonçalo
semear o seu nome através da
glória literária, explorando o
passado heróico dos ancestrais e associando as glórias dos Ramires
à sua própria imagem. É o  que
se chamaria hoje de um golpe de “marketing
eleitoral”.

Não lhe faltava alguma experiência literária. Nos tempos de
estudante havia publicado uma novela histórica, Dona
Guiomar,
no semanário A Pátria, dirigido
pelo amigo José Lúcio Castanheiro.
Essa mosmo Castanheiro, patriota assumido,
tinha agora um projeto mais ambicioso: a edição dos Annaes
de Literatura e de História,
visando à “ressurreição do sentimento português”.
Num encontro casual com Gonçalo, em Lisboa, Castanheiro
cobrou o antigo projeto do ex-colega de escrever
uma novela histórica, A Torre dos
Ramires, acerca de Tructesindo
Ramires, um antepassado dos tempos dos primeiros reis
de Portugal, os Borgonhas, dos séculos
XII e XIII. Gonçalo compreendeu que era a ocasião de implementar
o seu projeto, esperando capitalizar algum dividendo eleitoral
e social.

Com esses
propósitos,
na sua livraria,
cercado da bibliografia
necessária, em sua
cadeira de couro, contemplando o grande símbolo
de sua estirpe, a torre, principia
o seu trabalho de escritor. Tem como
base um poema heróico, escrito cinqüenta anos antes, por
Tio Duarte – O Castelo de Santa
Irinéia
, de escassa repercussão na época, e agora certamente
desconhecido. Assim, a matéria histórica e mesmo
sugestões literárias poderiam ser livremente manipuladas,
sem o risco de acusação de plágio. Urgia apenas refazer a
linguagem heróica, enfática e romântica
dos versos de Tio Duarte,
colocando­os em prosa, ao gosto de
sua época, o Realismo,
e adaptar algumas situações,
a principiar dos primeiros versos.

A partir da Restauração,
em 1640, inicia-se a narração do declínio
da linhagem histórica: Já, porém, como a nação, a raça
forte en
fraquece. Aqui
Eça estabelece um contraste deliberado
com o passado glorioso e o elemento humorístico
toma-se predominate, à medida que o plano
histérico e o contemporâneo convergem
para mostrar a degenerescência
da nação e da nobre linhagem. Álvaro Ramires,
favorito de D. Pedro II, foge para
Sevilha com a mulher de um inspetor
de finanças que mandara açoitar até a morte, por escravos.
E, nesta veia irônica e humorista,
continua a enumerar a deterioração de cada
menbro da família
Ramires, até chegar ao avó de Gonçalo, Damião Ramires,
doutor liberal, dado às musas, que desembarca com D. Pedro no Mindelo; compõe as
empoladas proclamações do partido, funda um jornal, o Antifrade, e depois das
guerras civis arrasta uma existência reumática em Santa Irinéia, embrulhado no
seu capotão de briche, traduzindo para o vernáculo, com um léxicon e um pacote
de simonte, as obras de Valério Flaco.

Mas as obrigações
de proprietário rural desviam as atenções do fidalgo para o cotidiano.
Manuel Relho, arrendatário da quinta, por oitocentos
mil­réis, numa de suas bebedeiras habituais, começou a atirar pedras contra
o solar de Gonçalo, atingindo
a livraria. Acovardado, tranca-se no quarto, defendendo a
porta com uma cômoda arrastada às pressas.
No dia seguinte, vai ao regedor dar queixa do arrendatário, e obtém justa
causa para despedi-lo, com
a família. Um outro lavrador, José Casco,
interessou-se pelo arrendamento e, após
algumas negociações, aceita pagar novecentos e
cinqüenta mil-réis ao fidalgo. Um aperto de mão sela o
compromisso entre ambos, era o que bastava nos antigos códigos de honra.

Retoma a escritura das primeiras linhas
da novela A Torre dos Ramires, mas
encalacra logo no inicio. Adormece, entediado.

No capitulo segundo o fidalgo
recebe a visita
do Titó (Antônio Vilalobos),
amigo velho, admirado por sua franqueza, pela força
física, pela independência, e por
una especialização no estudo das bastardias e crimes das
famílias nobres de Portugal. Vinha convidar o
Ramires para um jantar, no Gago, em companhia de dois outros amigos, o violeiro
Videirinha e o João Gouveia. Gonçalo aceita o convite, e dispensa o caldo de
galinha que Rosa preparava num rasgo de generosidade, manda levar a canja a uma
viúva pobre, a Críspola, adoentada e cheia de filhos. Manda também dar algum
dinheiro à viúva, além das suas recomendações. A atitude do fidalgo oscila entre
a generosidade, o paternalismo e o populismo eleitoreiro que já se insinua.
Atitude idêntica toma, por ocasião de sua visita ao deputado Sanches de Lucena,
ao ceder sua montaria ao camponês Manuel Solha, que mal podia andar, ajudando o
pobre a subir na sua égua, ainda que tivesse de sujar as luvas impecáveis para
erguer o camponês. Sanches de Lucena ironizou Gonçalo a conduzir o trabalhador,
comparando o fidalgo ao Bom Samaritano, da tradição bíblica.

André Cavaleiro, que funciona corno antagonista de Gonçalo, é
apresentado ao leitor no fiash back expositivo
de narrador onisciente, quando ele se detém no quinto ano do protagonista em
Coimbra. Inimigo de André, que acabara de ser nomeado Governador Civil
de Olveira, o narrador só mais tarde revelará as razões
da inimizade do fidalgo. Alude,
inicialmente, aos dois artigos ofensivos ao novo
Governador Civil, que Gonçalo escrevera na Gazeta
do Povo, sob o pseudônimo de
Juvenal. Simbolizado pelos bigodes, André Cavaleiro
seria atirado abaixo de seu cavalo, diz
Gonçalo, fazendo um trocadilho óbvio. Só
mais tarde,
depois do jantar
na estalagem do
Gago, é
que, através do discurso
indireto livre o leitor fica sabendo
da razão real do ódio que o fidalgo devotava
a André Cavaleiro. Nos tempos de estudante, o agora Governador Civil cortejara
Gracinha, irmã de Gonçalo, e
freqüentara o solar dos Ramires,
estimulado pela tolerância de Miss Rodhes,
a governanta inglesa, e do próprio pai. Mas, sem explicação, ao entrar na
política, abandonou a Irmã de Gonçalo. Graça acabou se
consolando; casou-se com um ricaço apaixonado por ela, o ingênuo
José Barrolo, apelidado o Bacoco (=
tolo, ignorante, presunçoso), que
desconhecia o antigo namoro, não
de todo debelado. A proximidade
de André, tido como mulherengo,
era um perigo que Gonçalo temia, e
que se tomou iminente, quando o Governador Civil
começou a pavonear-se em frente à
Casa dos Cunhaes, palacete em que
viviam José Barrolo e Graça; daí o
artigo de Gonçalo contra André, com o título apelativo de
Monstruoso Atentado.

Vários motivos prenderam o fidalgo em
Oliveira: o aniversário da irmã e a escritura de arrendamento da quinta
a um outro pretendente, Manuel Pereira,
ao preço acertado de um mil e cinqüenta réis, ou um conto
e cinqüenta, como se dizia então. O fidalgo rompia, dessa
forma, o acordo anterior com José
Casco, apalavrado e formalizado com um aperto de
mão. Mas as necessidades financeiras do
fidalgo eram, momentaneamente, mais fortes que os
resíduos de  sua
fidalguia.

A essa altura, Gonçalo havia concluído
o capitulo segundo da novela histórica A Torre
dos Ramire
s. A escritura da novela e seu
desenrolar são entremeados ao dia-a-dia
do fidalgo, funcionando como uma espécie
de contraponto heróico às contingências
tão mesquinhas de seu narrador. No
século XIII, Tructesindo, protagonista
da novela histórica, assume os
riscos de se opor
ao novo rei de
Portugal, D. Afonso II,
por um
juramento que
fez ao seu pai, D. Sancho,
de que seria o protetor de
sua filha, D. Sancha. Vai à guerra em desvantagem, pela
palavra empenhada. No século XIX, Gonçalo
muda de partido, do Regenerador para o Histórico
por simples oportunismo eleitoral (como também
o fizera seu pai); rompe o compromisso assumido
com José Casco,
por alguma
vantagem
financeira, e acovarda-se diante das ameaças
dos camponeses. O narrador
onisciente diverte-se com o jogo de oposições
passado x presente e com o emaranhado
de ações e personagens.

Somando-se o romance à
novela contabilizam-se noventa e quatro personagem atuantes, que são vistas”
em ação; cento e cinqüenta personagens referidas, em
diversas circunstância, pelas personagens atuantes; além de trinta e quatro
mencionadas na árvore genealógica dos Ramires e da monarquia
lusitana, sob a Dinastia de Borgonha (reis, heróis, guerreiros etc.).

José Casco dos Bravaes,
enfurecido com a falta de palavra de Gonçalo quanto ao arrendamento
das terras, põe o fidalgo a correr, com ameaças. Escoltado por empregados, vai a
Vila Clara dar queixa do camponês. Aí as coisas
começam a mudar de
direção: em Vila Clara, o administrador
e amigo, João Gouveia, dá noticia de Sanches de Lucena,
o deputado da região: estava morto. Com isso, ficava
aberta uma cadeira na Assembléia e ficava disponível
a viúva. D. Ana, mulher bonita, rica e vulgar. Superando
dois obstáculos: o fato de pertencer à
oposição e ter de mudar de partido e, o mais grave, ter de se reconciliar
com o inimigo, André Cavaleiro, de
quem dependia a indicação partidária, Gonçalo, por sugestão de Gouveia, vale-se
do episódio de José Casco para se reaproximar do Governador Civil, dando a ele
queixa do camponês.

A reaproximação se
concretizou, mesmo
pondo em risco a honrada irmã do fidalgo, que ficaria
exposta ao assédio de André Cavaleiro. O narrador
onisciente, através do discurso indireto livre, reproduz
o drama de consciência de Gonçalo, entre a
ambição política e a honra familiar.
Prevaleceu a ambição e, racionalizando cinicamente, o fidalgo supõe que Graça,
volúvel e fútil como toda a mulher queirosiana,
saberia defender sua própria honra.

Obtém a nomeação;
marca um jantar de confratemização
com André no palacete de Barrolo e Graça; participa aos
amigos a candidatura; retoma sua novela histórica; ampara
a mulher e o filho de José Casco (preso por ordem de André e solto, mais tarde,
por pedido de Gonçalo); inicia a campanha política
e, auxiliado pela “prima”
Maria Mendonça, começa a se
aproximar da víúva, D.
Ana de Lucena
e dos duzentos contos
de sua herança,
que falavam mais forte que as conhecidas origens da pretendida:
filha de um açougueiro e irmã de um criminoso. Tudo
parece correr bem para o fidalgo, apesar de alguns contratempos: Gonçalo recebe
uma carta anônima insinuando que ele facilitara a aproximação de André e
Graça e, numa vendinha de beira de estrada,
foi Insultado por um valentão e fugiu, rapidinho,
sem reagir: era o Ernesto de Nacejas.

A novela histórica prosperava, já que o José Lúcio Castanheiro,
diretor dos Annaes
de
Literatura e de História, começava a pressionar o fidalgo quanto
aos prazos para a publicação de A Torre dos Ramires.
Concluído
o terceiro capitulo, Gonçalo vai a Oliveira mostrar sua obra literária à
irmã e ao Padre Soeiro,
espécie de arquivista dos feitos
dos Ramires do presente e do passado. De saída
para Oliveira, recebe o apoio político do Visconde de Rio-Manso.

Na seqüência, deu-se o previsível. Chegando ao palacete
não encontra o cunhado, mas, passeando
pelo jardim, surpreende, sem ser visto, um diálogo amoroso
(um pouco mais que isso) entre André Cavaleiro e Graça.
Volta para Santa Irinéia arrasado, amargando a má
consciência de ter facilitado o adultério, e um ódio difuso
de todos: Graça, André, Barrolo e
de si mesmo. Na verdade, o que temia
era a repercussão do escândalo na sua campanha política.

Vive, a seguir, uma fase de profunda
depressão. Sem dinheiro, com dívidas vencidas, ausentes
os amigos de sempre (Videirinha, Titó e Gouvela), entrega-se
ao capitulo final da novela e à projetada
união com Dona Ana de Lucena,  com
a diligente intermediação da onipresente
“prima” Maria
Mendonça. Após várias
manobras de aproximação, o fidalgo desiste da viúva,
quando Titó
revela que D. Ana Lucena tinha a
um amante (presumivelmente ele mesmo, Titó), além de lazer objeções à
conduta da viúva Lucena.

Gonçalo passa a noite a remoer
seus insucessos, sente-se medroso,
dependente, fraco e exala “um suspiro de piedade por aquela sua sorte tão contrariada,
tão sem socorro”. Adormece sonhando com
os antigos Ramires. Escuta dos avoengos
exortações como — “Neto, doce neto, toma
minha lança nunca partida!…
” — “oh
neto, toma as nossas armas e vence a sorte ini
miga…
Mas Gonçalo, mergulhado nos seus fracassos, responde: — “Oh
avós, de que me servem as
vossas armas — se me falta a vossa alma?…

Estamos já no décimo capitulo, no qual se
opera uma mudança no rumo dos acontecimentos. Aqui começa a redenção de
Gonçalo e dos valores que simboliza. A descoberta, pelo
velho criado Bento, de um antiqüíssimo Chicote,
com o castão de prata, perdido no sótão
do solar, e que o fidalgo
instituiu como seu chicote de guerra, antecipa a retomada
das virtudes viris da família. Após o pesadelo com os
antepassados, após suas exortações,
Gonçalo acordou excepcionalmente implicante.
Começou por libertar-se da tutela que Bento vinha exercendo, sorrateiramente,
sobre sua vida, tratando o criado com rispidez. Armou-se
do chicote de
cavalo-marinho e
saiu pela estrada, montado na sua égua.
Pretendia visitar o Visconde de Rio-Manso,
na quinta da Varandinha. Ao interpelar um rapaz, pedindo a indicação do melhor
caminho para a Varandinha, Gonçalo topou
pela terceira vez com o valentão que o injuriou novamente: — “oh Manuel,
que estás tu aí a ensinar o caminho,
homem! Est
e caminho aqui
não é para os asnos!
” O fidalgo reagiu e o valentão,
Emesto de Nacejas,
saiu-se com
outro insulto: — “…E para diante é
que vocêjá não passa, seu Ramires
de Merd…”

E começou a redenção: o fidalgo investiu furioso
sobre o valentão, a golpes de chicotadas, prostrando-o no chão, quase morto.
Arremeteu-se aos berros contra o rapaz, que, em defesa do
valentão, atirara de espingarda contra Gonçalo, errando o alvo. O chicote
arrancou sangue do pescoço do Jovem Manuel, que caiu inerte,
dando com a cabeça num pilar. O
pai do rapaz quis interferir
para salvar o filho, mas Gonçalo dominou-o e fê-lo correr
diante de sua montaria, apesar das súplicas do velho. Sentia-se
um verdadeiro Ramires, enfim, era um homem! A noticia da
valentia do fidalgo propagou­se rapidamente.

A redenção da
honra familiar dá-se na seqüência: Barrolo recebera uma
carta anônima. insinuando irônica e maldosamente a relação entre Gracinha e
André Cavaleiro, e fora mostrá-la
ao fidalgo. Gonçalo guardou a carta e tranqüilizou
o cunhado, atribuindo a denúncia às Lousadas,
conhecidas maledicentes.
Barrolo acatou a idéia de Gonçalo e desconsiderou as insinuações.
O fidalgo, em seguida, exibe a carta à irmã e exige dela que ponha fim à relação
com André. Obtém mais uma vitória,
agora no front interno,
na trincheira familiar.

Os jornais da capital noticiaram o
feito de Gonçalo, Videirinha compôs mais
duas trovas do seu Fado dos Ramires,
alusivas à bravura do amigo:

“Os Ramires doutras eras

venciam com grandes lanças,

este vence com um chicote,

vede que estranhas mudanças!

É que os Ramires famosos,

da passada geração,

tinham a força nas armas

e este a tem no coração!”

Em meio a cartas de felicitações e homenagens, Gonçalo concluiu
sua novela. A campanha eleitoral ia de vento em popa. O rei,
por sugestão de André, outorga a
Gonçalo o título de Marquês de Treixedo.
Títulos de nobreza
não faltavam a Gonçalo, fina-flor da nobiliarquia
portuguesa. A comenda não o comoveu.

A eleição de Gonçalo deu-se por esmagadora maioria.
Finalmente, era deputado. O sucesso literário não foi
menos retumbante: a novela A Torre dos Ramires,
publicada
no primeiro
número dos
Annaes de Literatura
e de História
,
foi um êxito completo, de critica e de público.

Em janeiro, por ocasião do início
do ano legislativo, o fidalgo instala-se como deputado em Lisboa. Freqüenta com
desenvoltura a alta roda, e torna-se conhecido na
capital.

Mas eis que surge nova reviravolta. Quatro meses depois de instalado
em Lisboa, Gonçalo consegue uma concessão de terra em
Macheque, na Zambézia, possessão
portuguesa na África. Hipoteca suas terras para obter
capital e, em junho, acompanhado
por Bento, parte para sua aventura africana, embarcado
no paquete sugestivamente chamado Portugal. Já no segundo
capítulo Gonçalo tivera
um sonho em que se viu sobre as selvas
profundas de África, debaixo de coqueiros sussurrantes…”

No quarto capítulo confessara
à sua irmã que andava com a idéia de ir para a África,
romântica e ingênua idéia que extraiu da leitura do romance
As Minas do Rei Salomão
(do qual Eça fizera uma ‘tradução’ para a língua portuguesa).

Quatro anos depois, tendo plantado dois mil
coqueiros, muito cacau e muita borracha, Gonçalo regressa a Portugal já
abastado, a saúde revigorada e o moral retemperado. O último
capitulo ocupa-se dos preparativos para o seu
regresso triunfal à Santa
Irinéa. Em carta à Graça,
Maria Mendonça, a “prima”
que se avistara como fidalgo em Lisboa, informa
de seu estado de saúde e de espírito,
e antecipa a notícia de seu casamento, em breve, com
a Rosa, a neta do Visconde do Rio-Manso.

O livro termina com o paralelo entre
Gonçalo e Portugal, transcrito e comentado no
segundo parágrafo desta análise.

A novela histórica A Torre dos Ramires

Inserido na história principal, a novela escrita por Gonçalo
sobre seus antepassados do século XII, sobre Tructesindo
Mendes Ramires, pode
ser lida em três planos:

1. No plano histórico, focaliza o
estabelecimento do território português a consolidação da autoridade real
durante o período do século XII.
São referidas as figura históricas de D. Afonso Henriques,
D. Tereza, D.
Sancho I, D. Afonso II e os
Infantes. As disputas incluem não só as discórdia entre a
família afonsina, mas também a rivalidade entre a nobreza
e o clero. A lealdade ao rei
é disputada pelas Infantas, que são apoiadas pelas classes
superiores do clero, incluindo o
Papa. A questão da luta pelo poder – o rei, os nobres
e o clero – passa também
pela disputa dos direitos de propriedade,
dentro da ordem feudal.

A questão da vassalagem e da lealdade, fundamental na Idade
Média, a desencadeadora da novela.
Tructesindo Mendes Ramires havia jurado lealdade a
D. Sancho I, comprometendo-se a servir e
proteger a sua filha D. Sancha. Morto
o rei, assume o trono o primogênito,
Afonso II, que entra em desavença com os irmãos
sobre o testamento. Os infantes D. Pedro
e D. Fernando, esbulhados, andavam
pela França e pelo Reino de Leão. D. Sancha,
através do Alcaide de Aveiras
(disfarçado em beduíno), pede o
auxílio de Tructesindo. Eis o nó
da questão: a quem se deve primeiro lealdade? Ao novo rei,
D. Afonso II? A D. Sancho
I e ao juramento anterior? Ao Papa o aos chefes da
Igreja? Para Tructesindo a
lealdade ao juramento transforma-se numa questão de honra, mesmo contra o novo
rei, contra os conselhos do genro, Mendo Paes e contra os
interesses mais imediatos.

“De mal ficarei com o Reino e com o Rei, mas de bem com a
honra e comigo!”
sentencia Tructesindo.

O sistema medieval de resolver
as disputas era a
guerra, e o protagonista da novela
despacha seu filho Lourenço, com quinze cavaleiros e noventa
homens de infantaria, para socorrer as infantas D.
Sancha e D. Teresa. Em todos os
passos da ação de Tructesindo, Lourenço e do antagonista,
Lopo de Baião, se fazem presentes os códigos da cavalaria
medieval, que admitia armadilhas, espionagem, ataques
imprevistos e até a morte infamante, por vingança.

2. No plano humano, estão presentes os temas relacionados
à grandeza e virilidade
dos bárbaros
cristianizados do
século XII, especialmente o da
vingança. A fortaleza de Tructesindo,
na vingança da morte do filho o no cumprimento
da palavra, a
coragem diante da morto, o orgulho
acima do amor,
a superação de medo são temas que se entrelaçam na exaltação das
virtudes do pai e do filho.

A autoridade de Tructesindo sobre sua
família e seus vassalos é incontrastável: ele
decide o destino de Lourenço e da filha Violante sem
qualquer contestação.

3. No plano literário,
que se sobrepõe a qualquer outro na novela inserida,
Gonçalo comenta freqüentemente a sua
narrativa e as suas
personagem, na tentativa de fazer reviver a ficção
histórica à maneira realista de
Gustavo Flaubert, em Salambô. Seu objetivo
é evocar os tempos medievais
de maneira lapidar e não no tom melancólico e brando
dos românticos. Para
isso ele desenha suas personagens
de acordo com o rígido código guerreiro, numa linguagem
que lembra esses tempos rudes e primitivos.
À medida que sua própria
história progride, Gonçalo comenta seu estilo,
pondo-o em contraste os seus métodos
e técnicas com os
do poema de Tio Duarte. O tema da oposição entre a ficção
histórica romântica e a ficção
histórica realista revela, na insistência com que é
projetado, o gosto de Eça pela narrativa fantasista,
na forma e nos moldes em que, como
autor realista, admitia e admirava:
“um manto diáfano
de fantasia”
.

Os elementos simbólicos
harmonizam-se com os
propósitos do romance e da novela.
A torre é o principal símbolo de ligação entre Gonçalo e Tructesindo,
no tempo e no espaço.
Representando Portugal – passado, presente e futuro
– através de Gonçalo e de seus antepassados que nela viveram,
a torre é a figura dominante do passado coletivo de Portugal,
assim como de seu futuro não realizado.

O brasão dos Ramires,
o escudo de Tructesindo
e a sua
espada, herdada dos antepassados
godos, sugerem a imagem de
força e violência, das qualidades
sublimes e bárbaras do
mundo feudal do século
XII, em contraste
com o mundo de Gonçalo: Portugal
do século XIX.

No capítulo cinco do romance, Gonçalo
insere a batalha do Canta-Pedra,
primeiro cometimento heróico da novela. Lourenço,
mandado pelo pai em socorro
às infantas, é interceptado
pela forças do Lopo de Baião, o
bastardo, que se aliara ao rei.
Lopo havia sido recusado por Tructesindo
corno pretendente à mão de D. Violante,
filha mais nova do
cavaleiro de Santa Irinéia.
Havia entre ambos também
uma questão familiar. Lourenço foi
capturado e conduzido prisioneiro
por Lopo de Baião, que pretendia
trocar a liberdade e a vida do filho de Tructesindo
pela mão da filha: D. Violanle.
O filho, antes do pai, recusa a
proposta. Lopo ameaça matar
Lourenço com o punhal e Tructesindo
atira sua espada no bastardo para
que seu filho não fosse morto pelo vil punhal de Baião,
mas pela sua nobre espada. O Bastardo se enfurece
e enterra o punhal na garganta de Lourenço, abandona o
corpo do morto e foge. Tructesindo
vocifera seu juramento de vingança:
— Muros de Santa Irinéia, não vos
torne eu a
ver, se em três dias,
de sol a sol, ainda restar sangue maldito nas veias
do traidor de Baião!

Na perseguição do Bastardo, Tructesindo
conta com um estrategista, D. Garcia de Viegas,
que, prevendo os passos do inimigo,
planeja sua captura. D. Pedro de
Castro, também
aliado, acolhe os cavaleiros de Santa Irinéia e oferece
reforços a Tructesindo.

Surpreendidos, os
cavaleIros de Lopo de Baião são
massacrados e o Bastardo é feito
prisioneiro e condenado à morte vil.

Desnudado, amarrado a um poste, com o corpo imerso na água até a virilha, as
sanguessugas começam a cobrir o corpo do condenado. Tructesindo saboreia, impávido,
sua vingança, vendo o suplício do assassino de seu filho. Morto, depois de lenta
agonia, Baião é apedrejado pelos cavaleiros de Santa Irinéia e tem seu rosto
recoberto de estrume. Estava concluída a vingança e a novela, com a vitória
do protagonista, nas armas, e de seu descendente, o narrador, nas letras.

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