Home EstudosLivros O Vampiro de Curitiba, de Dalton Trevisan

O Vampiro de Curitiba, de Dalton Trevisan

by Lucas Gomes

O vampiro de Curitiba

talvez seja o livro mais conhecido de Dalton Trevisan. Dedicando-se exclusivamente
ao conto (só teve um romance publicado: A Polaquinha), Dalton Trevisan
acabou se tornando o maior mestre brasileiro no gênero. Em 1996, recebeu o Prêmio
Ministério da Cultura de Literatura pelo conjunto de sua obra. Mas Trevisan
continua recusando a fama. Cria uma atmosfera de suspense em torno de seu nome
que o transforma num enigmático personagem. Não cede o número do telefone, assina
apenas “D. Trevis” e não recebe visitas – nem mesmo de artistas consagrados.
Enclausura-se em casa de tal forma que mereceu o apelido de  O Vampiro
de Curitiba
, título de um de seus livros.
Mestre na arte do conto curto e cruel, é criador de uma espécie de mitologia de sua cidade natal, Curitiba. O vampiro de Curitiba teve seus contos lidos na Rádio Educativa, nas leituras dramáticas e em oficinas. São pequeníssimos textos: leves, românticos, eróticos, existenciais…
Mas tudo sempre inteligente e recheado de humor – às vezes negro.

O vampiro de Curitiba, Dalton Trevisan. Escrito assim, pode ser tanto o nome de um livro, seguido de seu autor, quanto uma explicação. O autor guarda informalmente o codinome de vampiro desde 1965, quando publicou o metafórico O vampiro de Curitiba. Desde então, o escritor paranaense alimenta a lenda em torno da própria figura envolta pelo mistério da reclusão. No conto que batiza essa coletânea, ele auto-ironiza sua estranha maneira de “promoção delirante”, mas não é pela mania de viver escondido que o leitor se sente sugado pelas mini-histórias.

Não deixa de ser um de seus principais personagens; recluso em sua vida pessoal a ponto de ser conhecido pela alcunha de um de seus livros –
O Vampiro de Curitiba.

Um livro que se quer como novela, mas que
cada unidade tem autonomia em relação às outras, e que inaugura uma .poética do
vampirismo. As ações não ultrapassam as fronteiras que as separam, podendo ser
lido como um livro de contos. O herói e sua tara, que na primeira parte revela a
sua maldição: é obcecado por fêmeas, servem como elemento aglutinador destas
narrativas. Não há descrições detalhadas. É o próprio personagem que se revela
ao leitor ao revelar sua tara. Atormentado pelo desejo carnal, o herói se
dilacera na busca constante do outro.

Foco Narrativo

Apenas os contos  O Vampiro de Curitiba e O
herói perdido
são escritos em 1ª pessoa.

Espaço

Alguns contos têm como cenário a cidade de Curitiba. No conto
Visita à professora, o espaço mencionado é São Paulo. O narrador menciona
lojas, ruas, igrejas, botequim.

Tempo

Não há flashbacks; Nelsinho tem idade diferente nos
contos; os contos não estão em ordem cronológica.

Linguagem

linguagem coloquial, com termos vulgares (“grande cadela”);
presença de diminutivos (safadinha, taradinha, casadinha); frases incompletas,
mas de fácil compreensão (“Ai, eu morro só de olhar para ela, imagine então
se.”); predomínio do discurso direto nos contos “Contos dos bosques de Curitiba”
e, principalmente, “Arara bêbada”.

Intertextualidade Bíblica

Conto “A noite da paixão”: “terei de beber, ó Senhor, deste
cálice?”; “Que se faça tua vontade, Senhor, e não a minha”; “Está consumado”.

Personagem

Nelsinho é o protagonista de todos os contos. Ao longo do
livro, Nelsinho percorre uma via crucis, com o objetivo de saciar-se
sexualmente com as belas mulheres que encontra nas ruas de Curitiba. Tarado
insaciável, voyeur incontido, “não quero do mundo mais que duas ou três só para
mim”. É a normalista, a garotinha de família, a professora, nenhuma foge ao
fervor de Nelsinho, que, ora bem-sucedido ora nem tanto, vai deixando, nas ruas
corrompidas de Curitiba, as marcas em suas vítimas singelas, repletas de
ingenuidade e – simultaneamente – de morbidez.

Enredo

Seus contos, quase todos ambientados em sua cidade natal – Curitiba – são impregnados de suspenses e enigmas. Em relatos breves, o autor revela o cotidiano da degradação humana em uma linguagem direta. O Vampiro de Curitiba nos leva ao dia-a-dia de Nelsinho, o vampiro literário personagem dos quinze contos do livro. Um curitibano que segue e assedia velhinhas, senhoras respeitáveis, virgens e prostitutas, agoniado e indeciso entre aquela que “molha o lábio com a ponta da língua para ficar mais excitante”, a viúva toda de preto com joelho “redondinho de curva mais doce que o pêssego maduro”, a “casadinha” que vai às compras e a normalista.

Nelsinho é o personagem
que transita por todos os contos, dando unidade ao livro. Obcecado por sexo, ele
vagueia pela provinciana Curitiba atrás de suas vítimas, enquanto aos olhos do
leitor vai se abrindo o quadro de uma cidade decaída. Cidade em que se esconde
um vampiro no fundo de cada “filho de família”, conforme ironiza o protagonista
do livro.

Curitiba, esquadrinhada
por Nelsinho, que primeiro se vê seduzido pelos braços e pernas de uma sensual
garota de outdoor – ou de uma virgem? – e, ao cabo, precipita-se para o círculo
infernal mais baixo, para o quarto de um bordel ao lado de uma velha prostituta
banguela. Ele é o próprio Drácula nivelado à cidade degradada sob as vestes do
cafajeste brasileiro. Nelsinho, assim como o vampiro, é presa da repetição
infindável dos seus atos e de sua obsessão, que agravam sua solidão: “Tem
piedade, Senhor, são tantas, eu tão sozinho”
.

Posts Relacionados