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Pedra Bonita, de José Lins do Rego

by Lucas Gomes

Em 1938 é publicado Pedra Bonita, de José Lins do Rego,
romance que dá início ao ciclo do cangaço associado ao misticismo
messiânico e ao flagelo das secas. Na obra, o chamado santo era
um louco, como Antônio Conselheiro, e o drama se desenrola em torno de uma
espécie de loucura coletiva.

Como já citado, o misticismo e o cangaço estão presentes em Pedra
Bonita
. A provável fonte temática, bem como a oralidade da narrativa, nesses
casos, teria sido a literatura de cordel, como afirma o próprio autor:

(…) Os cegos cantadores, amados e ouvidos pelo povo, porque tinham o que
dizer, tinham o que contar. Dizia-lhes então: quando imagino meus romances, tomo
sempre como modo de orientação o dizer as coisas como elas surgem na memória,
com o jeito e as maneiras simples dos cegos poetas.

Pedra Bonita é o relato da tragédia pernambucana de 1838, onde
morreram várias pessoas, para que com seu sangue fossem lavadas as duas
torres da catedral do reino de D. Sebastião, encantado nas duas pedras
ali existentes.

Ao ler a obra, temos a impressão de que é atualíssima, uma vez que não fala simplesmente
sobre um relato a respeito de Pedra Bonita, porém nas entrelinhas vemos a construção
de uma região, o Nordeste, humilde que serve de cenário para heróis, coronéis,
santos, místicos, “bandidos”, fanáticos e aventureiros cantadores de viola etc.
É um círculo vicioso do qual não vemos saída, a não ser que haja um progresso
muito grande na mente humana. Isso é fundamental no desenrolar do texto, que procura
mostrar os conflitos político, econômico, religioso e social em torno destes elementos
reais enquanto legitimadores de um regime, de uma determinada articulação social.

O livro, mesmo tendo mais de meio século de sua primeira publicação, apresenta
uma ótima coerência interna, explorando muito bem a temática e a imagem do Nordeste
sofrido.

Iniciando a análise pelo povoado de Vila do Açu, próximo a Pedra Bonita, o autor
monta a trama do romance; nesse cenário vão se destacando uma gama de personagens
individualizados e enlaçados as suas neuroses, suas paixões e para seu modo de
vida, como o menino Antônio Bento que fora parar na casa do Padre
Amâncio trazido pela mãe em virtude da seca de 1904; D. Eufrásia,
a irmã do Padre, mulher de personalidade forte e autoritária que vez ou outra
aparecia na vila; a negra Maximiliana, criada da casa paroquial,
que só tinha alegria quando tornava umas pingas; D. Fausta e
a sua aversão crônica ao pai que só tinha olhos e carinho para os pássaros que
criava; o sacristão Laurindo e a sua mulher; as beatas;
Joca Barbeiro, o bisbilhoteiro que ficava horas a fio em baixo
da tamarineira da praça falando da vida de todo mundo; o bodegueiro
que saiu explorando o sertanejo; o tirânico juiz Dr. Carmo, sua
mulher
e o seu filho arruaceiro; e tantos outros.

E ainda, nesse cenário exótico é retratado também de forma contundente, o confronto
de dois grupos na política municipal. Em seguida, discorre o povoado do Araticum,
começando pelo semi-árido físico onde aparece a geografia do sertão, o clima semi-árido,
a vegetação típica ­ caatinga – e a questão das secas, o tipo que habita, nesse
clima, transcende a figura de Bento Vieira, criatura seca, desumana e imparcial
a tudo que lhe rodeia, sua mulher, a sofredora Sinhá Josefina, seus dois filhos
– Aparício, violento, brigão e Domício, tenro e sonhador. A caminho de Pedra Bonita
aparece o místico Zé Pedro que conhece todos os mistérios e segredos da região.
Por fim, é nesse palco e com essas personagens inquietas e conflituosas que o
autor relata de maneira contundente a dizimação total da família Vieira, absorvida
pelo fanatismo religioso e o envolvimento com o cangaço.

A ação
divide-se em duas partes.

Primeira parte –
No vilarejo de Açu, o vigário cuida do menino Antônio Bento desde pequeno.
Frustrada a intenção de colocá-lo no seminário, Bento torna-se sacristão do
padrinho. Porém a população do povoado hostiliza-o porque ele participa de um
grupo desencaminhado. Protegendo-o, o padrinho acusa o juiz da cidade como
responsável. O juiz, transferido para a capital, não lhe perdoa e, por sua vez,
acusa-o de proteger bandidos.

Segunda parte –
Passa-se em Pedra Bonita, para onde fora Bentinho. O irmão de Bento o inicia nos
segredos da Pedra Bonita, mata um soldado e torna-se cangaceiro. Bentinho fica
indeciso entre a doutrina do Padre Amâncio e a crença de sua gente, vendo
pobres, aleijados e enfermos enlouquecidos na ânsia de cura.

Bentinho retorna a
Açu e fica com os seus.

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