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Resposta à pergunta: 'O Que é Esclarecimento?", de Immanuel Kant

by Lucas Gomes

Na obra Resposta à Pergunta: Que é “Esclarecimento”?
[“Beantwortung der Frage: Was ist Aufklärung?”], de 1784, Immanuel
Kant sintetiza a confiança desta época na razão (contexto
da Revolução Francesa). De acordo com este texto “o Esclarecimento
é a saída dos homens da menoridade da qual eles mesmos são
culpados. Menoridade é a incapacidade de servir-se de seu entendimento
sem a tutela de outrem. inicia seu discurso definindo menoridade como sendo
a incapacidade do homem em fazer uso do seu entendimento sem direção
de outro indivíduo. Depois, ele define esclarecimento como sendo a saída
do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado, segundo
Kant.

O homem é culpado de sua menoridade porque já se libertou dos
seus instintos animais (“direção estranha”), podendo
fazer uso do seu entendimento. Logo, o que o leva ao não esclarecimento
é a preguiça e a covardia, por ser mais cômodo ser menor.

Desta forma, o homem entrega o seu esclarecimento à tutores, que, depois
de embrutecerem seus “pupilos” e cuidadosamente tê-los preservado
a fim de não ousarem “andar” sozinhos, mostram-lhes em seguida
o perigo que os ameaça se tentarem. “Andar” seria fazer uso
do seu próprio entendimento, revelando uma forte analogia com o mito
da caverna de Platão.

Esses “avisos” tornam o homem tímido e temeroso, sendo difícil
para ele desvencilhar-se da menoridade, que para ele já se tornou quase
uma natureza, chegando mesmo a criar amor a ela. Esse sufocamento por parte
dos tutores é feito por preceitos e fórmulas, que são os
grilhões de uma perpétua menoridade.

Se a verdadeira liberdade fosse dada, é quase inevitável que
um público se esclareça. Tais indivíduos, libertos da menoridade,
espalhariam ao seu redor o espírito de uma avaliação racional
do próprio valor e da vocação de cada homem em pensar por
si mesmo, o espírito do esclarecimento.

Certamente, haverá obstáculo para o esclarecimento geral por
parte do próprio público, quando incitado por alguns dos seus
tutores ainda não esclarecidos, objetivando manter a ordem vigente. Se
um desses tutores se esclarecesse, também seria vítima de seus
próprios preconceitos anteriores.

Por isso, um público só muito lentamente pode chegar ao esclarecimento.
Kant então conclui, de uma forma bastante interessante, que uma revolução
poderia talvez realizar a queda do despotismo pessoal ou da opressão
da ordem vigente, porém nunca produziria a verdadeira reforma do modo
de pensar, necessária para o esclarecimento geral. Apenas novos preconceitos
servirão para conduzir a grande massa “destituída de pensamento”,
constituindo uma forte crítica à filosofia comunista-marxista.

Nesse momento, Kant define o uso público e o uso privado da razão.
O uso público é aquele que qualquer homem, enquanto sábio,
faz da sua razão diante do grande público do mundo letrado. O
uso privado é aquele que o sábio pode fazer de sua razão
em um certo cargo público ou função a ele confiada.

No uso privado, o sábio deve seguir as normas a que esta subordinado
pelo cargo, podendo dar conhecimento de suas idéias ao público,
mas desde que estas não entrem em conflito com tais normas. Isso se torna
um absurdo, pois o fato dos próprios tutores do povo serem eles mesmos
menores resulta na perpetuação dos absurdos. Kant critica a censura
pelo poder e o apoio ao despotismo espiritual (pela igreja) contra os súditos,
dificultando ainda mais o esclarecimento.

O autor então dá pistas de como poderia ser uma constituição
religiosa não fixa, onde homens, na qualidade de sábios, pudessem
fazer seus reparos publicamente a possíveis defeitos nas instituições
vigentes. Essas últimas manteriam-se intactas até o completo entendimento
de tais reparos.

Kant afirma que não estamos em uma época esclarecida, mas em
uma época de esclarecimento, pois falta muito para que os homens em conjunto
sejam capazes de fazer uso público de suas razões.

Os homens se desprendem por si mesmos progressivamente do estado de selvageria,
principalmente quando o regime vigente dá liberdade em matéria
religiosa; mas esse processo é lento e muito difícil. Kant dá
ênfase à matéria religiosa como ponto principal do esclarecimento,
porque “no que se refere as artes e ciências nossos senhores não
têm interesse em exercer tutela sobre seus súditos”, além
de que a menoridade religiosa é a mais prejudicial e desonrosa.

Kant então finaliza o seu discurso, de uma forma brilhante, lembrando
o rei filósofo de Platão, e a complementaridade entre o Antigo
Testamento, da ordem e obediência, e o Novo Testamento, da verdade e liberdade.

Ele justifica que um monarca esclarecido, chefe de um poderoso e disciplinado
exército pode dizer ao povo o que é praticamente impossível
(o que Deus diz ao homem): “Raciocinai tanto quanto quiserdes e sobre qualquer
coisa que quiserdes; apenas obedecei”.

Kant argumenta que a natureza por baixo desse duro envoltório da ordem
dá espaço ao ensejo de expandir a liberdade de espírito
do povo e, pouco a pouco, o povo se tornaria cada vez mais capaz de agir de
acordo com a liberdade, e o governo (ou regime vigente) acharia conveniente
para si próprio tratar o homem, que agora é mais que uma simples
máquina, de acordo com a sua dignidade.

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