Análise da obra
Publicado
pela primeira vez em 1946, Sagarana constitui uma obra-prima da produção
roseana, uma obra introdutória da mágica prosa literária
atingida pelo autor.
Sagarana promove uma total renovação do regionalismo brasileiro. Quando
o livro foi publicado, promoveu um outro tipo de aproveitamento da linguagem regional.
Guimarães Rosa trás uma complexidade maior para essa representação regional. Ele
vai mais além, unindo o idioma brasileiro com a matriz européia, o que pode ser
observado no próprio titulo da obra, Sagarana, que vem de “SAGA”, radical de origem
germânica, que significa canto heróico, e “RANA”, língua indígena, que significa
à maneira de.
São nove contos ou novelas, como costumam discutir os críticos, que descortinam o universo da
linguagem regionalizante de Guimarães Rosa e recriam, na ficção, a vida de personagens
saídos interior de Minas Gerais. A grandeza dessas produções
narrativas não está apenas presa ao cenário, ou à linguagem,
mas à riqueza da experiência humana traduzida através de personagens
que parecem, em certos momentos, vencer suas fraquezas humanas para entrar para
a galeria dos mitos e heróis do sertão. Dentro desse
mundo regional, a paisagem integra-se ao homem, delirando
junto com ele (Sarapalha), servindo de itinerário sensorial à sua cegueira
(São Marcos), servindo de caminho e descaminhos (Duelo), mostrando
seus avisos e perigosos (O
Burrinho Pedrês) bem como instrumentalizando, através do trabalho, a possihilidade
de ascensão ao plano do divino (A hora e vez de Augusto Matraga). O
processo mimético (imitativo)
atinge a perfeição meticulosa, recriando detalhes insignificantes da natureza
sentido de capacitar a universalização, ou seja, de inventar uma outra natureza
além espaço natural e emprestar ao cenário das Gerais características universalizantes.
Não são esquecidos os valores espirituais do matuto mineiro, que
se igualam e traduzem os valores comuns aos homens de
qualquer espaço ou tempo, consagrando a travessia humana
pelo viver. As crendices deixam, assim, seu espaço restrito para tocarem a
intuição universal de uma fé que ultrapassa fronteiras,
colocando os sentimentos religiosos como de uma cadeia universal e metafísica,
igualando os homens através de sua força interior
circundando o pensamento roseano de que o destino inexorável nasce das atitudes
humanas e da força diária empregada na sua condução.
O
narrador dos contos de Sagarana muitas vezes caracteriza como folclóricas
as histórias que conta, inserindo nelas quadrinhas populares e dando-lhes um
tom épico e/ou de histórias de fada. Por exemplo, temos o “Era uma vez”
que inicia o conto O burrinho pedrês (Era um burrinho pedrês). Neste
conto, assim como em Conversa de bois e em A volta do marido pródigo,
os animais se transformam em heróis, questionando o saber dos homens com o seu
suposto não saber.
O título do livro, Sagarana, mostra-nos um processo de invenção de
palavras, o hibridismo, muito próprio de Guimarães Rosa. Saga é radical
de origem germânica e significa canto heróico, lenda; rana vem da
língua indígena e quer dizer à maneira de, ou espécie de.
As histórias e desenrolar dos fatos prendem-se a um sentido ou moral, à maneira
das fábulas. As epígrafes que encabeçam cada conto condensam sugestivamente a
narrativa e são tomadas da tradição mineira, dos provérbios e cantigas do
sertão.
1.
Contos onde ocorre o crescimento dos personagens: O Burrinho
Pedrês, Duelo, Corpo
Fechado e A Hora e Vez de Augusto Matraga.
2.
Contos onde ocorre a humanização dos animais: O Burrinho Pedrês e
Conversa de Bois.
3.
Contos de feitiçaria: Minha Gente, São Marcos e Corpo Fechado.
4.
Contos onde um instante parece valer por toda uma vida: O
Burrinho Pedrês e A Hora e Vez de Augusto Matraga.
5.
Contos onde costumes dos capiaus servem de temática: A Volta do Marido
Pródigo e Minha Gente.
6.
Contos onde está presente a idéia de travessia: O Burrinho
Pedrês, Duelo e A hora e vez de Augusto Matraga.
7.
Contos onde a natureza parece algo vivo (panteísmo): Sarapalha e São
Marcos.
Cabe ainda ressaltar que o primeiro conto,
O Burrinho Pedrês, e o último,
A Hora e Vez de Augusto Matraga,
fecham-se num círculo temático.
Resumo dos Contos
1. O burrinho pedrês – Conto narrado em terceira pessoa, onde a onisciência
do narrador é propositalmente relativizada, dando voz própria e encantamento às
narrativas e acentuando sua dimensão mítica e poética. Leia
mais…
2. A volta do marido pródigo – Conto narrado em terceira pessoa, é
o mais farto em citações de lugares e personagens da região
de Itaguara. Leia mais…
3. Sarapalha – Conto narrado em terceira pessoa, sendo, pois, onisciente,
não participa da história. O autor não faz nenhum mistério sobre
o lugar da conversa dos dois primos que padeciam de alta febre por terem
sido atacados pela malária: é ali, na beira do Pará. Leia
mais…
4. Duelo – Conto narrado em terceira pessoa. Leia
mais…
5. Minha gente – Narrado em primeira pessoa, é um dos contos mais bem tramados
do livro, a história principal é emendada, alterada, recontada por pequenos detalhes
e elementos dados pouco a pouco ao leitor. Leia
mais…
6. São Marcos – Narrado em primeira pessoa, há duas histórias neste conto.
Leia mais…
7. Corpo fechado – Narrado em primeira pessoa, tem como narrador um médico
de um vilarejo do interior que é convidado por Mané Fulô para ser padrinho de
seu casamento. Leia mais…
8. Conversa de bois – As reflexões sobre o poder e a fraqueza centralizam-se
em Conversa de Bois, conto narrado em terceira pessoa, onde o narrador
fala de um tempo em que os animais conversavam entre si e imagina se isto até
hoje acontece, se transformam em heróis, questionando o saber dos homens com o
seu suposto não saber. Leia mais…
9. A hora e vez de Augusto Matraga – Narrado em terceira pessoa, o conto
mostra a linguagem regional aliando ao mais puro poético para criar efeitos inusitados
e da mas sublime perfeição. Leia
mais…