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Ubirajara, de José de Alencar

by Lucas Gomes

Análise

Ubirajara é um livro importante no conjunto das obras indianistas de José de Alencar e fundamental no conjunto, completando sua intenção de fazer uma obra panorâmica, que mapeasse o país tanto geográfica quanto cronologicamente. Assim, a história do “senhor da lança” mostra uma terra selvagem, com sua pureza ainda não profanada pela presença do branco invasor. É um Brasil pré-cabralino, ao passo que O Guarani e lracema já revelam o contato com a cultura branca européia (D. Antônio, Ceci, Martim) e suas conseqüências. Os primeiros cronistas, entre eles Pero Vaz de Caminha, mostram preconceituosamente um índio sem fé, nem lei, como se não tivesse cultura, somente porque não possui a a cultura cristã européia. Essa desvalorização da cultura do habitante primitivo desta nossa terra é questionada por Alencar no prólogo intitulado Advertência. Diz o autor:

“Este livro é irmão de Iracema.

Chamei-lhe lenda como ao outro. Nenhum título responde melhor pela propriedade, como pela modéstia, às tradições da pátria indígena.

Quem por desfastio percorrer estas páginas, se não tiver estudado com alma brasileira o berço de nossa nacionalidade, há de estranhar entre outras coisas a magnanimidade que ressumbra no drama selvagem a formar-lhe o vigoroso relevo.

Como admitir que bárbaros, quais nos pintaram os indígenas, brutos e canibais, antes feras que homens, fossem suscetíveis desses brios nativos que realçam a dignidade do rei da criação?

Os historiadores, cronistas e viajantes da primeira época, senão de todo o período colonial, devem ser lidos à luz de uma crítica severa. E indispensável sobretudo escoimar os fatos comprovados, das fábulas a que serviam de mote, e das apreciações a que os sujeitavam espíritos acanhados, por demais imbuídos de uma intolerância ríspida.”  Sabiamente, Alencar assim complementa sua critica aos preconceituosos cronistas do passado: “Homens cultos, filhos de uma sociedade velha e curtida por longo trato de séculos, queriam esses forasteiros achar nos indígenas de um mundo novo e segregado da civilização universal uma perfeita conformidade de idéias e costumes. Não se lembravam, ou não sabiam, que eles mesmos provinham de bárbaros ainda mais ferozes e grosseiros do que os selvagens americanos.”

Enredo

O jovem caçador araguaia, Jaguarê, procura em terras alheias um inimigo para desafiar e combater. Levando um prisioneiro para sua taba ele conseguirá seu título de guerreiro. Ao contrário do que esperava, encontra uma índia tocantim, filha do chefe, de nome Araci. Ela diz que em sua nação há cem guerreiros que vão disputar seu amor. Jaguarê é convidado a alistar-se entre eles, mas prefere dizer à virgem que mande todos seus pretendentes para combatê-lo. Após a partida de Araci, aparece um índio tocantim, Pojucã, que aceita o desafio de Jaguarê. O índio araguaia vence e aprisiona o guerreiro tocantim com sua lança, intitulando-se a partir de então, Ubirajara, o senhor da lança.

Ubirajara deixa o prisioneiro em sua taba, dando-lhe como esposa do túmulo a jovem Jandira, que até aquele instante era sua noiva. Em seguida, parte o guerreiro para a nação dos tocantins. Jandira não aceita ser esposa de outro que não Ubirajara e foge para a floresta.

Ubirajara chega à taba de Araci e, como a lei da hospitalidade permite, não se identifica, adotando o nome de Jurandir, o que veio trazido pela luz. Compete com os demais e ganha o direito de casar-se com Araci, mas antes da noite nupcial é obrigado a identificar-se. Cria-se uma situação constrangedora, pois seu prisioneiro é irmão de Araci. Declara-se a guerra. Ubirajara liberta Pojucã para que possa lutar ao lado de seu povo.

Quando os araguaias vão atacar, surgem os tapuias que, por justiça, têm o direito de guerrear antes dos araguaias, que devem esperar. O chefe dos tocantins, Itaquê, vence o chefe tapuia, mas fica cego, não podendo liderar seu povo. Para sucedê-lo, os guerreiros devem dobrar seu arco e atirar como ele. Como os guerreiros de seu próprio povo não conseguem, convidam Ubirajara a fazê-lo. O guerreiro araguaia, genro de Itaquê, consegue com tal destreza e força que emociona o velho Itaquê. Assim, Ubirajara une os dois arcos e as duas nações, araguaia e tocantim, dando origem à grande nação ubirajara. Como prêmio, ganha também duas esposas: Araci e Jandira.

Estrutura da obra

Foco narrativo – A narrativa é feita em terceira pessoa. O narrador é, na maior parte da história, um observador; há momentos em que se apresenta como onisciente, tudo sabe e tudo vê.

Tempo

O tempo cronológico, remonta a ação ao século XV, o que pode ser determinado pela ausência do homem branco. O romance organiza-se, em seus nove capítulos, de forma linear, cronológica, em tempo anterior a 1500, na região do Tocantins.

Espaço

A narrativa apresenta a natureza selvagem como espaço privilegiado, com a maior parte das ações desenvolvendo-se na região interior e selvagem de um Brasil primitivo e edênico. A natureza é o único componente espacial deste pequeno romance. Selvagem, hostil ou acolhedora, ela representa o espaço ainda inalcançado pelo homem branco, por se tratar de romance  pré-cabralino. Há, ainda, o espaço das aldeias, povoado por criaturas selvagens, porém cheia de princípios éticos.

Ação

Predomina a ação externa, revelando domínio seguro da efabulação, apesar da estrutura simples da obra. O tom épico faz-se presente nos feitos guerreiros, nas caçadas, mas o lírico aparece sempre, tanto na linguagem poética, quanto nos diálogos e nos cantos de amor. A conversa entre Ubirajara e Araci logo depois do combate nupcial é de grande beleza e o canto de tristeza de Jandira quando desprezada é de comovente sentimentalismo.

O romance é dividido em nove capítulos, organizados de modo linear, apresentando tempo cronológico, com a ação se desenvolvendo na selva brasileira, em período anterior ao descobrimento, na região do rio Tocantins. Os títulos dos capítulos indicam o conteúdo básico da fábula:

I. O caçador – Jaguarê sai de sua taba em busca de um inimigo para conseguir o titulo de guerreiro. Pelas margens do grande rio Tocantins caminha o jovem caçador Jaguaré à procura de um adversário a quem possa desafiar. É que ele quer transformar-se em guerreiro de sua tribo e precisa de um adversário à altura do feito. Há três dias está na imediação da tribo dos Tocantins, tribo inimiga , chefiada por Itaquê.

Jaguaré vê, então, Araci, “a filha do dia”, que tal como uma corça veloz atravessa a campina. Ao identificar a moça, o guerreiro fica decepcionado porque está à espera do inimigo com quem lute, rito pelo qual deve passar – e vencer – o guerreiro. Pela indumentária e adereços, Jaguaré identifica em Araci uma virgem que ainda não foi possuída por nenhum guerreiro. E é advertido por ela.

Jaguaré diz ter soltado seu grito de guerra e observa que pisa aqueles campos “como senhor” e pede à Araci, que agora diz ser sua prisioneira, que avise os guerreiros da tribo para que venham com ele lutar.

Araci considera que ele deveria disputá-la como o fazem os homens da tribo, mas o caçador avisa que tem quem o aguarde para esposa e desafia os guerreiros para a luta.

Pojucã , guerreiro temido, atendendo o apelo de Jaguarê, e ambos se apresentam.

E se inicia o combate. Ambos resistem, experientes e capazes de demonstrar maior fortaleza física. Por fim, Jaguaré vence o combate, fere com sua lança de duas pontas o guerreiro no peito e o aprisiona, obrigando-o a ir com ele à aldeia e relatar o combate.

Mas antes de ir, muda seu nome, soltando um grito de triunfo:

” – Eu sou Ubirajara, o senhor da lança, o guerreiro invencível que tem por arma a serpente. Reconhece o teu vencedor, Pojucã, e proclama o primeiro dos guerreiros, pois te venceu a ti, o maior guerreiro que existiu antes dele.”

II. O guerreiro – Jaguarê, tendo vencido Pojucã, adota o nome guerreiro de Ubirajara, senhor da lança. A taba dos araguaias está em festa para receber seu mais novo guerreiro, filho de Camacã, “maior chefe dos araguaias”, líder que ostenta ainda, em frente aos anciãos , o grande arco ornado depenas vermelhas, conquista da juventude que já perdeu.

Pojucã narrou também a sua história, exaltou os feitos do araguaia o que facilitou a aceitação do filho de Camacã como guerreiro. Depois, Ubirajara empunhou o arco do pai foi empunhado por ele. Era agora seu substituto como “o mais forte dos guerreiros”daquela tribo.

A Pojucã coube a glória de ter seu nome lembrado junto ao do guerreiro que o vencera.

III. A noiva – Jandira, noiva de Ubirajara, espera por ele, mas o herói não a procura. Pior que isso, ele a entrega como esposa do túmulo ao seu prisioneiro. Informa seu povo de sua intenção e parte em busca de Araci, filha do chefe da nação tocantim. Jandira, a doce filha de Magé, mal raiou o dia saltou da rede que embalara os seus sonhos de virgem e, acreditando ser a última noite que passara na cabana de seu pai, esperava Jaguaré buscá-la.

Mas Ubirajara sonha, enquanto isso, com Araci. Ela lhe avisa em sonhos de que os guerreiros Tocantins se preparam para tomá-la como esposa. Convida-o para partir se não quiser chegar tarde.

O guerreiro araguaia desperta em meio ao sonho e, depois, buscando nele refugiar-se mais uma vez, deixa seu pensamento tomar rumo ao grande rio.

Jandira vai achá-lo pouco depois na mata e pergunta o que aconteceu com ele. É surpreendida pela resposta: a tristeza tinha entrado no coração do guerreiro, “que não sabe mais dizer-te palavras de alegria, linda virgem.

Dizendo que o guerreiro não poderia achar para si esposa mais fiel, Jandira tenta aparentar alegria , mas soube que o amor de Ubirajara tinha abandonado o seu.

Enquanto isso, Pojucã amargava a derrota e o fato de ser prisioneiro. Podia fugir, mas isso seria comprovar sua desonra. Quando Ubirajara se aproximou da cabana do vencido, ouviu dele o pedido de que o matasse, porque ele estava para sempre desonrado.

Então Ubirajara chama os guerreiros e dá-lhe como “esposa do túmulo” Jandira, “que tem no seio os doces favos da abelha.”

E parte, prometendo voltar para matar o guerreiro tocantim.

Jandira e Pojucã ficam a sós e ela lhe diz que jamais seria esposa dele. Que se Ubirajara não a quisesse, não seria de mais ninguém, preferindo a morte. Pojucã diz que ela poderia gerar um filho dele, tão forte e valente como o pai.

Mas a jovem foge dele, senta-se depois no meio da floresta, e tristemente canta.

Reunido o conselho de anciãos, Ubirajara comunica que vai partir e que, ao voltar na próxima lua, matará o inimigo.

IV. A hospitalidade – Incógnito, usando o nome Jurandir, Ubirajara hospeda-se na taba dos tocantins. Ubirajara vai ao encontro de Araci; ao chegar lá, o guerreiro vigia tocou o aviso . Os guerreiros que para lá acorreram deixaram-no passar, sem indagar donde vinha , e nem o que o trouxera.

Itaquê é pai de Araci, a linda estrela do dia que Jaguarê busca.

Itaquê manda que preparem o cachimbo da paz, para que ambos fumem juntos e, depois, os cantores da aldeia entoam a saudação da chegada.

Enquanto os homens cantam, Jacamim, a esposa de Itaquê, chama as outras amantes do grande chefe a fim de que a ajudem a preparar o banquete da hospitalidade.

Depois de conduzido à sombra da gameleira, junto aos guerreiros, foi servido com muita abundância, com vinho de caju e ananás.

Depois que as mulheres recolheram os restos e se retiraram, Itaquê disse que escolheria o nome que o guerreiro usaria enquanto ali estivesse. Muitas foram as sugestões, mas, finalmente, Ubirajara escolheu um nome para si: “- Eu sou aquele que veio trazido pela luz do céu. Chama-me Jurandir.”

Foi nesse momento que Araci apareceu por entre as palmeiras e se encaminhou para a cabana. Os guerreiros a acompanhavam e eram servos de seu amor. Disputavam todos a beleza da virgem e com ela pretendiam casamento.

Araci reconheceu-o imediatamente e soube que ele viera sem seus ornatos araguaias para disputar com os outros o seu amor. Não cabia a ela dizer quem ele era, sequer revelar o segredo. Apenas sentiu a alegria dentro do coração.

Jurandir fala de si e de seus feitos e Araci canta para ele. Após isso, Jurandir declara: ” – As moças tocantins são formosas; qualquer delas alegraria o sono do estrangeiro. Mas Jurandir não veio à cabana de Itaquê para gozar do amor de uma noite; ele velo buscar a esposa que há de acompanhá-lo até à morte, e a virgem que escolheu para mãe de seus filhos.”

E pediu à Araci que o conduzisse à cabana de Itaquê, onde pretendia revelar o segredo que o conduzira até ali. Disse a ela que sonhara com seu chamamento e que ele o fizera vir até a sua presença.

V. Servo do amor – Jurandir, isto é, Ubirajara, revela sua verdadeira intenção e é aceito na casa de Itaquê para servi-lo e adquirir o direito de combater pela mão de Araci.

Os guerreiros que estavam cativos da beleza de Araci sabiam que teriam trabalho com o pretendente. Jurandir desceu para o rio e se encarregou de pescar um peixe gigantesco que levou vivo à cabana de Itaquê; depois, caçou uma grande anta ( tapir) e levou-a viva, depositando-a aos pé de Araci. Nenhum guerreiro conseguiu segurar o animal e seus ímpetos, mas ele, Ubirajara o fazia sem esforço. Quando obrigou o animal a agachar-se diante de sua amada , disse para que todos ouvissem: “- o braço de Jurandir fará cair assim a teus pés o guerreiro que ouse disputar ao seu amor a tua formosura, estrela do dia.”

A partir daí, tratou de deixar a cabana do chefe dos Tocantins muito bem sortida da melhor comida; caçador e pescador, isso era fácil para ele. Depois da caça e da pesca, trabalhava prazerosamente nas roças do pai de Araci.

Enquanto isso, a amada de Jurandir tecia a franja da rede para o casamento.

No banho, os guerreiros e a virgem se encontravam. E ela nadava muito bem. E é no banho que começa, sem que os outros vejam, a dar preferência a Jurandir.

Enquanto Araci busca penas vermelhas , mel e guaraná para o seu amado no meio da floresta, eis que ele surge trazendo uma mulher que segurava pelo braço e que trazia na mão uma faca afiada. Araci reconheceu a virgem Araguaia pela faixa de algodão entretecida de penas, e adivinhou que era Jandira, a noiva abandonada de Jaguarê.

As duas virgens ficaram a sós e se olharam. Jandira reconheceu que não tinha a beleza de Araci. Araci canta para Jandira, e entre as frases que canta ressalta-se seu desejo de que ela seja sua escrava, que o amor do guerreiro Araguaia era dela, Araci, e que ela deixaria Jandira dormir com o seu guerreiro quando a beleza deixasse de existir.

Jandira diz, então, que prefere morrer a ser escrava de Araci e “de ver a cada instante a formosura estrangeira que roubou seu amor.” Acusa Araci de não saber amar o guerreiro adequadamente. E acrescenta que jamais Jandira ofereceria a rede a outra mulher.

VI. O combate nupcial – Jurandir compete com os demais e ganha o direito de casar-se com Araci.

Começa a festa guerreira para escolher o esposo de Araci; entre todas as festas, esta é a única que as mulheres podem marcar presença, segundo o rito de Tupã.

A grande nação dos Tocantins cerca toda a campina e no meio estão os anciãos. Aparece Araci, “a estrela do dia, que há de ser o prêmio da constância e fortaleza do mais destro guerreiro.”

Jacamim acompanha a filha e se lembra do tempo em que Itaquê a conquistou e brigou por ela com os guerreiros mais fortes da tribo.

Está armada a festa; Itaquê está orgulhoso como pai. E começam os cantos nupciais.

Ao comando de Itaquê, começaram os combates. Os guerreiros se esforçam ao máximo para conseguir ganhar e sucediam-se as provas. Ms Jurandir saiu-se vencedor em todas elas.

o pajé levantou a tampa de um vaso e Jurandir colocou lá a mão. Era mais uma prova . Havia ali, colocado por Itaquê, um formigueiro de saúvas pronto a devorar a primeira presa. Mas Jurandir, fitando Araci, sorria feliz.

Tanto picaram o guerreiro (e este enquanto isso cantava para a amada!) que foi preciso quebrar o vaso para retirar-lhe de lá a mão. Mas o grande pajé esfregou na pele do guerreiro o suco de uma erva e a dor e a inchação logo desapareceram.

A última prova era a da corrida. Araci deveria vencê-lo e Jurandir sabia que poderia fazê-lo, caso quisesse, mas tornou-se o vencido e , ao término da corrida, tomou-a nos braços e levou-a para “a cabana de amor”que tinha construído perto do rio.

Mas antes que transpusesse a porta, chegaram os guerreiros com um recado de Itaquê: ele tinha que dizer quem era, porque ninguém da taba o conhecia.

VII. A guerra – Ao identificar-se, Ubirajara cria um conflito complicado: seu prisioneiro de guerra, a quem deve matar, é seu cunhado. Declara-se a guerra entre araguaias e tocantins.

Itaquê o esperava sentado na cabana, junto com os anciãos. Jurandir entrou, Araci ficou na porta, orgulhosa do marido.

Itaquê arquejou, e lamentou que estivesse frente a frente com o matador de seu filho Pojucã; tinha, no entanto, que respeitar a lei da hospitalidade e tratá-lo com dignidade e respeito.

Mas Pojucã não estava morto, todos desconheciam isso. Jacamim, mãe de Pojucã e de Araci nega-se a chorar na frente do guerreiro.

Itaquê troca com ele a fumaça da despedida, mas avisa que assim que ele sair dos seus domínios, mil guerreiros ou mais irão ao seu encalço e vingar-se-ão dele pelo mal praticado. Ubirajara foi até os limites da aldeia e, depois, apagou no chão o vestígio de seus passos.

Embora Araci queira estar com ele, o guerreiro não aceita, dizendo que se Itaquê “respeitou a lei da hospitalidade no corpo de Ubirajara; Ubirajara não deixará a traição na terra estrangeira.” E quando o marido partiu, Araci foi para a cabana, fechou a porta e cantou sua tristeza.

Ubirajara partiu para sua tribo e, depois de dois dias de viagem, lá chegou e convocou os guerreiros para a guerra com o que pretendia ter de volta Araci. Manda chamar Pojucã e pede que ele vá para os seus.

E, então, com o apoio do pai e dos guerreiros, preparou-se para a guerra.

Mas quando Ubirajara se aproximou dos campos dos tocantins, viu que uma nação tapuia se preparava para assaltar a tribo de Itaquê.

Ubirajara mandou entre eles um arauto, pedindo que “encostem o tacape de guerra”. Mas recebe como resposta a informação de que “Cranicã veio trazido pela vingança. Pojucã, um dos chefes tocantins, penetrou na sua taba e incendiou a cabana do pajé, que foi devorado pelas chamas.”

Ubirajara reconhece que Itaquê deve enfrentar a guerra que Pojucã buscara.

Ubirajara manda um recado a Itaquê e diz o que está acontecendo. Observa que o coração dele é de Araci e que se Itaquê aceitar, ele combaterá ao seu lado.

VIII. A batalha – Quando Ubirajara vem com seu povo, os tocantins são atacados pelos tapuias. Um curumim tapuia cega o velho chefe tocantim. Os tocantins ficam sem liderança.

A um lado da imensa campina move-se a multidão dos guerreiros tocantins, do outro lado, a multidão dos
guerreiros tapuias.

As duas nações se estendem como dois lagos formados pelas grandes chuvas, que se transformam em rios e atravessam o vale.

Os dois povos esperavam a batalha; Itaquê achou-se frente a frente com Canicrã; dez vezes tinham combatido e em nenhuma tinha havido um vencedor e talvez fosse preciso que um deles morresse para que possível fosse quebrar a fecha da paz entre as nações. “Quando os dois chefes se encontraram, os guerreiros ficaram imóveis, contemplando o pavoroso combate.” Ubirajara contemplava tudo de longe, imaginando o quanto seria feliz se pudesse enfrentar em combate a ambos.

Pahã, filho mais novo de Canicran, assiste a tudo e, quando vê Itaquê desferir um golpe contra o pai, solta duas flechas em direção ao chefe tocantim e cega-lhe os dois olhos. O menino foge, mas é alcançado por um guerreiro e , aprisionado, é levado na manhã seguinte, por Ubirajara, à frente de Itaquê. Levou-o para ser escravo do velho chefe, mas Itaquê recusa a oferta e liberta o garoto.

Itaquê pede ao filho Pojucã que envergue o seu arco, que assuma seu lugar de líder. Mas, ao fazê-lo durante uma reunião com os inimigos, Pojucã, sem pensar no que fazia como afronta, dispara a flecha em direção à cabeça de um chefe tapuia, cravada na estaca, à entrada da taba.

Pojucã, chegou, então, à conclusão de que o filho era imatura e não merecia a chefia.

IX. União dos arcos – Ubirajara consegue dobrar o arco de Itaquê, tornando-se o novo chefe da nação de Pojucã e Araci. Une ao arco do chefe cego o seu próprio arco, herdado de seu pai, simbolizando assim a união das duas bravas nações.

Os tocantins estavam sem chefe: Itaquê cego e Pojucã, seu único filho, incapaz de empunhar o arco de chefe. Itaquê lamenta não poder combater sem a luz dos olhos.

Um mensageiro de Itaquê o precedera no campo dos araguaias; levado por Araci. Ubirajara ficou feliz ao ver a esposa e saúda o sogro dizendo que o combateria, se ele estivesse trazendo a guerra e o abraçaria, se trouxesse a paz.

E o velho chefe tocantim pede ao guerreiro que tome a frente das batalhas. E Ubirajara, feliz, vai ao combate em nome das duas tribos. Ao final, rompe a liga de Araci e leva-a para a cabana do amor.

Após os combates, Ubirajara fica com as duas mulheres: Araci e Jandira. A tribo dos araguaias e dos tocantins formaram uma única nação, que tomou o nome do herói: ubirajaras.

Personagens:

Ubirajara, personagem protagonista, é o herói do livro. Aparece nos capítulos iniciais com o nome de Jaguarê, guerreiro da tribo dos araguaias, antes de se tornar “o senhor da lança”, Ubirajara e chefe de sua tribo em substituição ao pai, depois de ter vencido Pojucan.Quando vai servir Itaquê para obtr como esposa Araci, o nome adotado por ele entre os tocantins é Jurandir.

Jandira, virgem araguaia, filha de Majé, prometida de Jaguarê, mas por ele desprezada quando se torna guerreiro. A noiva desprezada tenta matar a rival, mas é surpreendida por Ubirajara que a entrega como escrava a Araci. Esta, afinal, entrega-a ao guerreiro como segunda esposa, considerando isso justo já que ele uniu os arcos das duas nações. Inicialmente, Jandira era da opinião de que não se deve dividir o marido, mas no final da narrativa aceita a proposta de Araci, dividindo com ela o amor de Ubirajara.

Araci, a estrela do dia, virgem filha do chefe tocantim, Itaquê, conquistada por Ubirajara, que é obrigado a lutar, e vencer todos os outros pretendentes. Araci aceita dividir o esposo com outras, conforme tradição de seu povo.

Pajucã, cujo nome significa “eu mato gente”, é guerreiro tocantim, filho de Itaquê, irmão de Araci. Guerreiro forte e invencível até conhecer Ubirajara, de quem se torna prisioneiro.

Itaquê, pai de Araci e Pojucã, velho chefe dos tocantins.

Jacamim, mulher de Itaquê, mulher que não exige exclusividade no amor, conforme a tradição de seu povo. Assim, como em outros povos, é ela quem planta, como também as outras mulheres casadas, pois, segundo suas crenças, a mulher transmite à terra sua própria fertilidade, possibilitando melhores colheitas do que se as sementes fossem plantadas pelos homens ou pelas virgens.

Camacã, pai de Ubirajara.

Canicran, terrível chefe dos tapuias, vencido por ltaquê, que rompe sua cabeça em dois pedaços como se fosse um coco.

Pahã, cujo nome significa “a seta”, é o filho mais moço do chefe tapuia, Canicran. Importante para o relato, pois é ele quem cega com duas flechadas o velho chefe Itaquê. A sua função na estruturação da trama é fácil de ser percebida, deixar a nação tocantim sem o líder para que Ubirajara possa assumir o posto e unir as nações araguaia e tocantim, objetivo fundamental do romance.

Temática

A temática amorosa revela tanta importância quanto a temática da honra. Durante todo o relato, o amor sobrepuja as maiores dificuldades. O tema da honra, simultaneamente, aparece a todo instante: Pojucã teme ser mantido prisioneiro em vez de ser sacrificado, porque isso o desonraria; Itaquê não ataca nem deixa ninguém atacar Ubirajara ao saber que aprisionara Pojucã, pois estaria desrespeitando a lei da hospitalidade; Ubirajara não permite que Araci o acompanhe, pois estaria desonrando Itaquê que o respeitara, e assim por diante. Todos procuram se manter honrados dentro dos princípios e da tradição de seu povo.

Assim como em O Guarani em Iracema encontramos também na obra em estudo a idealização do índio. O mito do bom selvagem tem suas bases na teoria de Rousseau de que o homem é naturalmente bom, a sociedade é que o corrompe. Então, o índio integrado à vida natural é símbolo de autenticidade e pureza.

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