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Constituição de 88: veja o que pode cair na prova

by Lucas Gomes

Sessão de promulgação da Constituinte,1988, presidida pelo
deputado federal
Ulisses Guimarães

 

 

 

 

 

 

 

 

Neste ano, se completaram duas décadas da promulgação
da Nova Constituição – o resultado mais significativo da saída
dos militares do poder. Durante um ano e oito meses, entre 1987 e 1988, deputados
constituintes, eleitos para escrever a nova Carta Magna, debateram sobre o que
deveria ser regulamentado pela lei máxima da Nação.

Entre as principais novidades que passaram a valer em 5 de outubro de 1988
estão o voto para analfabetos e jovens a partir de 16 anos e eleições
diretas para a Presidência da República. Além disso, a Constituição
instituiu o Sistema Único de Saúde e deu forma ao direito do consumidor
e à defesa da criança e do adolescente.

Apesar de ser pouco lembrada pelos principais vestibulares, a Constituição,
por fazer aniversário este ano, poderá aparecer em algumas bancas.
Um ponto importante é que a Assembléia Constituinte foi o primeiro
momento em que o Partido dos Trabalhadores (PT) participou efetivamente das
decisões políticas, já que havia se negado a escolher o
presidente na votação do Colégio Eleitoral, em 1985, que
elegeu Tancredo Neves – o mineiro morreu antes da posse, dando lugar ao primeiro
presidente civil depois da ditadura, José Sarney.

Na Constituinte, figuras como o presidente Lula participaram ativamente. Universidades
como a federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) costumam encarar a Constituição
de 1988 como uma carta detalhada demais, que tenta resolver problemas demais.
Tenta resolver os entulhos da ditadura. Se preocupa em tomar conta de todas
as esferas da vida, então legisla sobre mais do que deveria.

Mesmo assim, o aluno pode pensar na Carta como o ponto culminante de outro
processo histórico, esse sim muito abordado no vestibular: a abertura
democrática do país no início dos anos 1980. Como o último
governo militar, de João Figueiredo, finalizou a transição
“lenta, gradual e segura” idealizada pelo general antecessor, Ernesto
Geisel, empurrado por episódios como o atentado do Riocentro e pela campanha
das Diretas Já.

É mais raro aparecer uma questão sobre a situação
política atual no Brasil, mas a respeito da redemocratização
se fala bastante. Uma coisa se liga à outra – para se ter uma idéia,
nos últimos 13 anos, o Brasil foi governado por dois ex-deputados constituintes:
Fernando Henrique Cardoso e Lula.

Em 20 anos, Constituição foi reformulada 62 vezes

Considerada um marco para a recente história democrática do Brasil,
a Constituição Federal de 1988 já foi reformulada 62 vezes
por meio de emendas nas duas décadas de sua existência, sendo 56
aprovadas pelo Congresso Nacional e seis pelo Congresso Revisor, criado para
aperfeiçoar a então nova Carta. Um dos casos mais emblemáticos
de alteração constitucional foi a revogação do artigo
que fixava um limite para a cobrança anual de juros ao contribuinte,
tema que teve de ser debatido nas cadeiras do Supremo Tribunal Federal.

Pelo texto aprovado pela Assembléia Constituinte em 5 de outubro de
1988, as taxas de juros reais (descontada a inflação) não
poderiam ser superiores a 12% ao ano, sendo que a cobrança acima deste
limite seria classificada como crime de usura.

Voto vencido na sessão plenária em que o STF julgou a ação
direta de inconstitucionalidade (ADI) contra este trecho da Constituição,
o então ministro Paulo Brossard observou que os deputados constituintes
desejavam, com aquele dispositivo, combater o “paraíso da usura”
no Brasil. “A usura encontrou o seu paraíso no Brasil, e foi exatamente
isto que os constituintes quiseram enfrentar quando aprovaram a limitação
dos juros reais em 12% ao ano”, comentou o magistrado durante a sessão
de julgamento do caso, em 1991.

Outras alterações feitas ao longo dos anos reformularam, por
exemplo, o critério para as coligações eleitorais, alteraram
o regime previdenciário com a Reforma da Previdência, legislaram
sobre a remuneração de deputados e vereadores, sobre a autonomia
de instituições de pesquisa e aumentaram o repasse de recursos
da União ao Fundo de Participação dos Municípios.

Nos últimos anos, no entanto, com a dificuldade de se encaixar novos
temas nos 250 artigos permanentes da Carta, parlamentares e governo passaram
a inchar a Constituição por meio do trecho que trata dos Atos
das Disposições Constitucionais Transitórias.

Criado pela Constituinte como forma de transição entre o regime
militar e a nova democracia, este capítulo constitucional acabou por
se tornar a brecha mais fácil para a viabilização de novas
leis, como a criação e ampliação da vigência
da Constribuição Provisória sobre Movimentações
Financeiras (CPMF), a prorrogação do prazo da União para
aplicar recursos mínimos à irrigação nas regiões
Centro-Oeste e Nordeste, a criação do Fundo de Combate e Erradicação
da Pobreza e a destinação de recursos mínimos para o financiamento
das ações e serviços públicos de saúde.

“Realmente nós tivemos bastantes emendas, mas isso se deve ao fato
de que a Constituição foi promulgada no ano de 1988, um momento
de transição, em que transitamos de um mundo bipolar para um mundo
multipolar. Muitas das emendas que foram aprovadas foram no sentido de adaptar
a Constituição aos novos tempos que se anunciavam a partir de
1989, um ano após a promulgação”, comenta o ministro
Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), evitando utilizar a
palavra “desfiguração” para a atual forma da Constituição.

“Não diria que ela (a Constituição) ficou desfigurada”,
completa o presidente do STF, Gilmar Mendes, ao apontar a conjuntura mundial
no fim dos anos 80 como fator responsável pela escolha e depois exclusão
de determinados conceitos na Constituição. Um ano após
a promulgação da nova Carta, explica, com a queda do muro de Berlim,
a organização econômica entre os países se alterou
completamente.

“A ordem econômica sofreu uma alteração significativa
porque o modelo econômico era outro, era um modelo fortemente estatizante
e agora, especialmente a partir do governo Fernando Henrique (Cardoso), houve
um modelo muito mais privatista, muito mais influenciado por uma concepção
liberal. O texto de 88 veio com alguma antecipação. É que
a queda do muro de Berlim se deu em 89 e ficou muito mais fácil para
compreender o mundo depois da queda do muro de Berlim”, observa o presidente
da Suprema Corte.

Menos polêmico, o ministro Eros Grau aponta que, a despeito das 62 emendas,
a Constituição ainda mantém sua essência ou, em suas
palavras, “a espinha dorsal” dos preceitos discutidos pela Assembléia
Constituinte.

Integrante da Comissão de Acompanhamento Constitucional da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) e nomeado pelo presidente Itamar Franco como membro
da Comissão Especial de Revisão Constitucional, em 1993, Grau
pondera que “a essência dela (da Constituição) se encontra
nos artigos 1º (sobre princípios de soberania e cidadania do Brasil),
3º (que trata da sociedade livre e sem preconceitos) e no 170 (sobre os
princípios gerais da atividade econômica). Isso é a espinha
dorsal da Constituição”.

“Ali estão afirmados os princípios fundamentais do que é
o Brasil, do que é a sociedade brasileira. Isso permanece intacto. O
que houve (em relação às emendas) foram ajustes parciais.
A espinha dorsal é a mesma”, observa.

“É bem verdade que foram feitas mudanças demasiadas, e que
não há na história constitucional contemporânea de
Estados democráticos tamanhas e tão freqüentes mudanças
como as que aconteceram na Constituição brasileira. Apesar disso,
que não era o ideal, o que se contém na essencial que pode ainda
se tornar efetivo foi mantido. Então a gente tem que procurar o que há
de melhor, para tornar eficaz, ao invés de ficar procurando, com alguma
antipatia (…) por que ainda não se interpreta e nem se aplica (determinados
dispositivos). As mudanças foram feitas, e eu acho que o espírito
da Constituição se mantém, porque os princípios
fundamentais se mantém”, complementa a ministra Cármen Lúcia,
também do STF.

“A Constituição é um corpo vivo e, sendo um corpo
vivo, ela está em processo de constante mutação. Ela está
sendo objeto de constante atualização nos tribunais, no âmbito
do Poder Judiciário (com a interpretação de trechos constitucionais),
está em processo de constante reelaboração nos tribunais”,
conclui, sem polêmica, o integrante mais antigo do STF, Celso de Mello,
na Suprema Corte desde 1989.

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