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Política Internacional – 5. Eleições EUA: Quem era melhor para o Brasil

by Lucas Gomes

O democrata Obama apostava na boa vizinhança com todo mundo. O republicano
McCain enfatizava a Colômbia e o México em suas relações
com a América Latina.

Novo presidente dos Estados Unidos foi definido na terça- feira 4, mas,
nos círculos diplomáticos e acadêmicos ligados ao Brasil
na capital americana, antes disso era como se o candidato democrata já
estivesse eleito. A proximidade com Barack Obama tem sua razão, embora
ele nunca tenha visitado a América Latina e só conheça
o Brasil por meio dos relatórios de seus assessores. Sua equipe de política
externa tem um grupo de acadêmicos respeitados, inclusive especialistas
em Brasil, enquanto os assessores do republicano John McCain para a América
Latina são mais ligados a Cuba e à “velha agenda” americana
para o Sul do hemisfério. Durante a campanha, McCain foi ao México
e à Colômbia, uma indicação dos países que
ele considera prioritários na região.

“Com a crise econômica e outros assuntos na política externa,
o Brasil não estará na agenda do novo presidente americano no
início do governo, quem quer que ele seja”, disse à ISTOÉ
Peter Hakim, presidente do Diálogo Interamericano, principal centro de
estudos das relações hemisféricas em Washington. “Mas
a eleição de Obama seria melhor para o Brasil, para a América
Latina e para o mundo, porque vai romper com a imagem ruim do presidente Bush
e criar uma boa vontade em relação aos Estados Unidos”, completou.

A manutenção dessa boa vontade vai depender, claro, de atitudes
concretas do novo presidente.

INCÓGNITA
Não se sabia o efeito do racismo na disputa que poderia fazer de
Obama o primeiro presidente negro dos EUA
INEDITISMO
Se vencesse a eleição, McCain tornaria-se o presidente americano
mais idoso a tomar posse no país

Obama já mostrou, em viagem à Europa durante a campanha, que
poderia mudar a maneira como os estrangeiros vêem os Estados Unidos. Na
teoria, um presidente republicano seria melhor para o Brasil nas questões
comerciais, já que eles são considerados menos protecionistas.
O problema é que, ao contrário do Brasil, nos Estados Unidos esses
assuntos são atribuição do Congresso. Analisando o histórico
dos dois candidatos no Senado, o Centro de Estudos de Política de Comércio
do Instituto Cato classificou Obama como intervencionista e McCain como favorável
ao livre comércio. O passado recente dos presidentes americanos, no entanto,
desafia a regra de republicano liberal e democrata protecionista. No governo
do democrata Bill Clinton foi concluída a Rodada Uruguai, que elaborou
o conjunto de regras em vigor no comércio internacional, e foi o republicano
George W. Bush quem criou uma sobretaxa para o aço brasileiro.

O certo é que o novo presidente, quem quer que fosse, teria de lidar
com um Congresso democrata. As pesquisas mostravam que a maioria já existente
deveria ser ampliada e era possível que os democratas consiguissem eleger
60 senadores, número suficiente para evitar uma obstrução
da oposição.

Um presidente republicano teria pouco espaço de ação.
Por isso, era preciso olhar com cuidado as promessas de campanha de McCain,
como o fim da tarifa de importação do etanol brasileiro, hoje
em US$ 0,54 por galão – cerca de R$ 0,30 por litro. Uma mudança
iria depender muito mais das negociações entre os diferentes lobbies
em atuação no Congresso – congressistas da Califórnia e
da Flórida, por exemplo, são favoráveis à importação,
enquanto os do Meio Oeste, de onde vem Obama, tendem a defender a proteção
aos produtores americanos de milho. Em Washington, brasileiros tanto do governo
quanto do setor privado dão como certo que o fim da sobretaxa é
uma questão de tempo.

O embaixador do Brasil na capital americana, Antonio Patriota, diz que o governo
brasileiro teria boas relações com quaisquer dos candidatos. “Estamos
bem posicionados dos dois lados. Não há risco de que uma ou outra
administração relegue as relações com o Brasil a
um nível pouco satisfatório”, afirmou. O problema é
que, embora seja verdade que as relações entre os dois governos
sejam boas, especialistas dizem que a relação carece de profundidade.
“A relação dos Estados Unidos com o Brasil é excelente,
mas é superficial”, diz o diretor do Programa Brasil do Woodrow
Wilson Center for Scholars, Paulo Sotero. “É importante que o Brasil
saiba o que quer dos Estados Unidos e passe a ter uma posição
mais pró-ativa”, afirmou. Richard Nass, presidente do Conselho de
Relações Exteriores, de Nova York, escreveu em um artigo publicado
na Newsweek que uma das conquistas do governo Bush é “uma boa relação
com o Brasil, cada vez mais a âncora de um bloco centrista na América
do Sul”. Na campanha, o Brasil não foi citado. A exceção
ocorreu em um dos debates, quando McCain mencionou o etanol. Obama falou muito
em investir em energias renováveis e fazer desses investimentos um dos
pilares da recuperação da economia. Trata-se de uma área
onde a cooperação com o Brasil é óbvia, dada a liderança
brasileira na área.

ESTADOS UNIDOS – QUE PAÍS É ESTE?

A maior economia do mundo entrou oficialmente em recessão na semana
passada. A variação atualizada do PIB mostra uma contração
de 0,3% no terceiro trimestre do ano. Economistas estimam que este é
apenas o primeiro de uma série de índices negativos a serem
divulgados nos próximos meses, a começar pelo aumento do desemprego.
Um desastre num país que não conta com estrutura social
para desempregados nem sequer com um sistema público de saúde.
Desde agosto do ano passado, 851 mil pessoas já perderam suas casas
porque não conseguiram pagar o financiamento. No Estado de Nevada,
onde a situação é mais grave, uma em cada 82 residências
foi tomada.

Assim como o crescimento econômico dos últimos anos teve
como base o consumo, é sua retração que lidera a
queda do PIB. No terceiro trimestre, os gastos dos consumidores caíram
3%, a primeira redução trimestral desde 1991. O nível
de confiança do consumidor, medido pelo grupo The Conference Board,
despencou de 61,4 pontos em setembro para 38 pontos em outubro, o pior
número na história da pesquisa, realizada desde 1967. Inseguros
sobre o futuro, mesmo americanos com vida financeira estável estão
cortando gastos. É o caso da professora Gabrielle Bucak, casada,
dois filhos pequenos.

“Acho que é psicológico. Eu e meu marido temos emprego
e pagamos a casa sem problemas, mas, mesmo assim, cortamos despesas com
roupas e restaurantes”, contou à ISTOÉ. “Não
estou preocupada com o presente, mas com a possibilidade de uma longa
recessão.” É justamente o que a maioria dos economistas
está prevendo: uma longa recessão, coisa que o país
não vê desde os anos 1930.

Esse tema, porém, não entrou na agenda dos candidatos. Na última
semana da campanha, eles investiram nos Estados que poderiam decidir a eleição,
como Flórida, Carolina do Norte, Virgínia, Ohio e Pensilvânia.

Obama procurou minimizar o assunto “racismo” na campanha, dizendo
que não havia “uma América negra ou uma América branca,
mas os Estados Unidos da América.” Alguns analistas disseram que
muitos eleitores podiam deixar de votar em Obama porque ele é negro.
Era o chamado “efeito Bradley”, que diz que eleitores brancos podem
declarar nas pesquisas voto num candidato negro para não parecer racistas,
mas na privacidade da urna votariam no candidato branco. O nome vem de Tom Bradley,
um negro que liderava as pesquisas para o governo da Califórnia em 1982
e perdeu nas urnas. No programa humorístico The Daily Show, na semana
passada, Obama brincou quando foi questionado sobre isso, já que ele
é filho de mãe branca, americana, e pai negro, queniano.

“Acho que vou fazer análise para não me confundir na hora
de votar”, disse ele. Daniel West, vice-presidente e diretor de estudos
de governança do Brookings Institution, acha que o efeito Bradley não
teria influência nesta eleição e seria anulado pelo preconceito
de idade contra McCain, que se vencesse, aos 72 anos, seria o mais velho presidente
americano a assumir o governo. “Obama pode perder votos por ser negro,
mas vai ganhar muitos votos dos jovens. Acho que a questão racial e da
idade vão se anular mutuamente”, dizia ele.

A economia ganhou mais força na reta final da campanha, com promessas
dos dois lados de redução de impostos. Obama também queria
ampliar a cobertura do sistema público de saúde e McCain pretendia
oferecer uma dedução de imposto para que a própria pessoa
pagasse seu seguro-saúde. Uma declaração de Obama há
duas semanas de que era preciso “distribuir a riqueza” deu munição
para ataques do lado republicano, que chegou a chamar o candidato democrata
de “socialista” – um palavrão no país. “Nos Estados
Unidos nós não distribuímos a riqueza. Nós criamos
riqueza”, disse McCain. “Logo vão dizer que eu sou socialista
porque dividia meus brinquedos no jardim da infância”, ironizou Obama
num comício na Flórida.

Uma propaganda de Obama de meia hora, veiculada no horário nobre em
várias emissoras de televisão, provocou grande debate no país.
O motivo não foi o conteúdo, mas o custo da veiculação,
estimado em US$ 3 milhões, já que nos Estados Unidos não
existe propaganda gratuita. Com mais dinheiro – porque não aceitou o
financiamento público da campanha -, Obama gastou quatro vezes mais do
que McCain em propaganda de tevê e tem 100 vezes mais anúncios
online do que o concorrente republicano. O democrata arrecadou mais de US$ 600
milhões, enquanto o candidato republicano conseguiu um terço desse
valor. Ao contrário das eleições anteriores, desta vez
é o Partido Democrata o lado mais rico da campanha.

Fonte: Revista ISTOÉ

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