Home PreparaçãoBanco de QuestõesPortuguês Viva o povo brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro

Viva o povo brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro

by Lucas Gomes

1.

(UFBA)

Não se deve esposar um determinismo rígido quanto a essas questões, pois fatores outros, tais como a raça,
desempenham papéis cruciais, mas a verdade é que a clara definição do ano em quatro estações distintas é
civilizada e civilizadora. As nações como o Brasil, em que praticamente só existe inverno e verão,
imperando a mesmice de janeiro a dezembro, parecem fadadas ao atraso e são abundantes os exemplos
históricos e contemporâneos. Até culturalmente, as variações sazonais se revestem de enorme importância,
eis que forçam a diversificação de interesses e atividades em função das alterações climáticas, de modo
que os povos a elas expostos têm maior gama de aptidões e sensibilidade necessariamente mais apurada. Além
disso, o frio estimula a atividade intelectual e obvia a inércia própria dos habitantes das zonas tórridas
e tropicais. Não se vê a preguiça na Europa e parece perfeitamente justificada a inferência de que isto se
dá em razão do acicate proporcionado pelo frio, que, comprovadamente, ao causar a constrição dos vasos
sanguíneos e o abaixamento da temperatura das vísceras luxuriosas, não só cria condições orgânicas
propícias à prática do trabalho superior e da invenção, quer técnica, quer artística, como coíbe o
sensualismo modorrento dos negros, índios, mestiços e outros habitantes dos climas quentes, até mesmo os
brancos que não logrem vencer, pela pura força do espírito civilizado europeu, as avassaladoras pressões
do meio físico.
Assim, enquanto um se fortalece e se engrandece, o outro se enfraquece e se envilece.
Os fatos são claros, pensou Bonifácio Odulfo; não vê-los é, como diz o vulgo, querer tapar o sol com uma
peneira. Quando escreveria esse ensaio, que lhe vinha à cabeça tão pronto, tão inteiro, tão acabado e
escorreito, tão alicerçado na evidência dos fatos e no raciocínio despido de paixões? Talvez nunca,
concluiu com certa tristeza, pois que banqueiros não escrevem ensaios, nem convém que certas coisas,
embora sabidas por todos, sejam ditas. Era uma pena, como também fora uma pena que não tivesse podido
anotar o poema que o invadira aos borbotões quando, curvado para enfrentar o vento que varria a Baixa de
Lisboa, fez questão de descer a pé a Rua do Ouro, a fim de ter a emoção de estacar à entrada da Praça do
Comércio, e bateu-se com a Ribeira das Naus, a amplidão grávida e cinzenta da boca do Tejo, ondinas
arrulando na rampa como se ali começasse o mar e se abrisse o Infinito. Conquistadores dos oceanos! Nautas
intimoratos, exploradores do Universo, dominadores de mundos, viajantes do Desconhecido! Glória a vós, que
desbravastes…
RIBEIRO, João Ubaldo. Viva o povo brasileiro: romance. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. p.
467-468.

A análise do texto transcrito, contextualizado na obra, permite afirmar que Bonifácio Odulfo

(01) interpreta o país como o espaço da barbarização sociocultural, determinada pelas condições naturais.
(02) exalta a predisposição do colonizador português para miscigenar-se e a positividade dessa
experiência.
(04) dessacraliza a visão paradisíaca do Brasil, ao considerá-lo como uma terra sem possibilidades de
tornar-se avançada econômica e socioculturalmente.
(08) confronta a realidade da metrópole lusitana e a da colônia, exaltando as duas: a primeira, pela
superioridade geográfica e a segunda, pela pujança da natureza e pela sensualidade do seu povo.
(16) considera o elemento não europeu como uma degeneração conseqüente de ambientes climáticos de altas
temperaturas.
(32) legitima o privilégio do colonizador pelo trabalho e justifica a nulidade do colonizado pela indolência.

RESPOSTA: 01 + 04 + 16 + 32 = 53

Posts Relacionados