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Dependência de petróleo e gás ameaça desempenho da Rússia como potência econômica

by Lucas Gomes


Setor energético responde por 60% das
exportações da Rússia

A Rússia terá que diversificar sua economia, hoje altamente dependente
dos recursos energéticos, para voltar a crescer na próxima década,
afirmam analistas ouvidos pela BBC Brasil. O país é o que mais
sofre com os efeitos da crise financeira internacional entre os países
do grupo BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).

Para Jim O’Neill, economista da Goldman Sachs que cunhou o termo BRIC, a alta
dependência do país por petróleo e gás tornou a Rússia
o mais vulnerável entre os quatro integrantes do BRIC às turbulências
externas. “A Rússia definitivamente terá que mudar. Esta
crise demonstrou que o país é dependente demais do petróleo
e que precisa se afastar disso”, disse O’Neill.

Dona da maior reserva de gás natural do mundo e da segunda maior de
petróleo, a Rússia tem 60% de suas exportações sustentadas
pelo setor energético. O país também é grande produtor
de outras matérias primas, como metais e madeira, tendo se beneficiado,
como o Brasil, da alta no preço das commodities nos últimos anos.

Um dos maiores efeitos da crise global foi a redução da demanda
pelas commodities, levando os preços de vários produtos a despencar
no mercado internacional. O barril de petróleo, que chegou a custar US$
140 em julho de 2008, no final de março estava sendo cotado a menos de
US$ 53.

Competitividade

Segundo especialistas, um dos primeiros passos para o Kremlin diversificar
a economia será aumentar seu leque de investimentos dentro do setor energético,
baseado principalmente na extração de petróleo e gás.
“Se a Rússia quer se especializar em energia, terá que investir
no potencial tecnológico de outras áreas relacionadas ao setor,
como fontes alternativas de energia, conservação e processamento”,
avalia Dmitri Trenin, diretor do instituto Carnegie Centre, em Moscou.

O analista reforça que para poder competir com outros países
e se destacar no cenário econômico internacional, a Rússia
ainda precisará canalizar recursos para outras áreas, como inovação
tecnológica, informação e tecnologia aeroespacial.

Um ranking de competitividade industrial elaborado pela Agência das
Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido, na sigla
em inglês), colocou a Rússia em 66º lugar em uma lista de
cem países. O país ocupou a pior colocação entre
os BRIC, ficando bem atrás de China (26º), Brasil (39º) e Índia
(40º).

O próprio Kremlin já reconheceu que para continuar crescendo
até 2020, a Rússia terá que sair da inércia do desenvolvimento
baseado nos recursos energéticos e outras commodities.

Em um discurso para o Conselho de Estado russo pouco antes de deixar a Presidência
e ocupar o cargo de primeiro-ministro, em março do ano passado, Vladmir
Putin disse que a posição da Rússia como exportador mundial
de commodities pode, no futuro, “deixar o país atrás das
maiores potências econômicas e de fora do grupo dos maiores líderes
mundiais”.

Durante os anos de prosperidade econômica, o Kremlin aumentou sua atuação
no setor de energia, estatizando várias empresas. Como resultado, acumulou
dívidas gigantescas e fez poucos investimentos na exploração
de novas reservas.

Na opinião de especialistas, o futuro da Rússia como potência
energética vai depender da vontade do Kremlin de abrir as portas para
os investimentos estrangeiros. “A grande questão para a próxima
década será saber se o país vai se abrir para os investimentos
externos no setor energético. Do contrário, será muito
difícil desenvolver aquilo que constituiu o bem mais poderoso da Rússia,
que são as commodities”, afirma a cientista política Masha
Lipman.

Efeitos da crise

A crise financeira internacional expôs as vulnerabilidades da economia
russa a turbulências externas. Um dos efeitos mais perversos tem sido
o desemprego, que no mês passado chegou a 8% da população
ativa, atingindo seis milhões de trabalhadores.

A produção industrial caiu 20% nos últimos seis meses.
O rublo, a moeda local, se desvalorizou pela metade, aumentando a inflação,
que segundo números oficiais chega a 13,9%.

Em 2007, a economia cresceu 8,1%, o melhor desempenho da década, seguido
pela aceleração, já freada pela crise, de 6% em 2008.

Para 2009, projeções do Banco Mundial indicam que a economia
russa vai encolher 3% e, para 2010, o crescimento deverá ser de 0%. Mais
otimista, o governo russo aposta em uma contração de 2,2% para
este ano.

Os anos de crescimento econômico da última década encheram
os cofres do governo, que hoje está canalizando cerca de US$ 600 bilhões
em reservas para salvar empresas em dificuldades.

Alguns analistas duvidam da capacidade da Rússia de sobreviver à
crise. Para opositores do Kremlin, o futuro do país é cercado
de incertezas. “Eu não acredito que diante das atuais dificuldades
financeiras, a Rússia pode ter um papel político e econômico
importante nos próximos anos antes que encontre uma solução
para a crise”, afirma Vladmir Milov, que integra o movimento político
oposicionista ‘A Outra Rússia’ e preside o think-tank russo Institute
of Energy Policy.

DÉCADA DE 2020 DEVE CONSOLIDAR PODER DOS BRICs


Crescimento acelerado pode fazer dos BRIC
potências econômicas e
políticas

Os anos 20 deste século podem marcar a consolidação do
fortalecimento de países emergentes como potências econômicas
e políticas, em um mundo cada vez mais multipolar. Segundo acadêmicos
e instituições de pesquisa, os chamados BRICs (Brasil, Rússia,
Índia e China) serão peças-chave dessa nova ordem.

Para investigar que desafios cada país do BRIC terá pela frente,
no caminho para se tornar uma potência em 2020, a BBC Brasil produziu
uma série especial que começa a ser publicada nesta segunda-feira,
reunido reportagens multimídia de nossos repórteres no Brasil
e enviados especiais a Rússia, Índia e China.

Em 2020, com 3,14 bilhões de habitantes (40% da população
mundial naquele ano, segundo projeções da ONU), eles devem chegar
mais perto das economias do G-7, após terem crescido a taxas muito superiores
às de nações ricas.

O National Intelligence Council, entidade do governo americano ligada a agências
de inteligência, prevê que já em 2025 todo o sistema internacional
– como foi construído após a Segunda Guerra Mundial – terá
sido totalmente transformado. “Novos atores – Brasil, Rússia, Índia
e China – não apenas terão um assento à mesa da comunidade
internacional, mas também trarão novos interesses e regras do
jogo”, afirma a instituição.

“Muito provavelmente, por volta de 2020 vamos nos dar conta de que existe
um equilíbrio muito maior no mundo em termos econômicos e políticos
com o fortalecimento de países emergentes como China, Índia, Brasil
e Rússia. Com um maior poder econômico, virá também
um maior poder político e uma participação ativa desses
países em organismos internacionais”, disse Stepháne Garelli,
professor da Universidade de Lausanne, na Suíça, e autor de um
estudo que traça cenários para 2050.

Conceito complexo

O conceito de sistema multipolar é complexo e, ainda que boa parte dos
analistas concorde que o mundo caminha para isso, o tempo que levará
para que a China tenha voz no Fundo Monetário Internacional (FMI), o
Brasil tenha um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU ou
o Banco Mundial seja dirigido por um russo ou indiano variam muito.

Mas a discussão já não se limita mais ao meio acadêmico.
Diferentes aspectos do que pode vir a ser um mundo multilateral (ou multipolar)
já começam a aparecer em discursos de autoridades que estão
no centro do processo de tomada de decisões internacionais.

Um exemplo recente vem de Gordon Brown, o primeiro-ministro britânico,
que, às vésperas do encontro do G-20, em Londres, declarou no
Brasil que “o tempo em que poucas pessoas mandavam na economia acabou”.

Também às vésperas do encontro, o diretor-gerente do FMI,
Dominique Strauss-Kahn, disse em entrevista a uma TV francesa que “soluções
globais supõem que a governança de instituições
como o FMI seja mais legítima, mais democrática, com espaço
para os países emergentes e pobres”.

Reunião do G-20

A reunião do G-20, grupo que une países emergentes aos países-membros
do G-8, pode ser vista como um sinal dessas mudanças. A voz dos emergentes
no cenário de crise ganha especial relevância.

Segundo boa parte dos analistas ouvidos pela BBC Brasil, eles não apenas
serão menos afetados do que os países desenvolvidos pela crise,
como também podem se recuperar mais rapidamente.

Essa possível recuperação mais rápida se baseia
em alguns pilares que serão também propulsores do crescimento
de longo prazo. “A situação das economias desses países
é muito diferente. Mas, de maneira geral, os BRIC estão mais bem
posicionados para a recuperação do que muitas outras economias”,
disse Markus Jaeger, responsável por análises de longo prazo no
Deutsche Bank.

Para Alfredo Coutinho, analista mexicano da agência Moody’s nos Estados
Unidos, a crise revela ainda a vulnerabilidade das economias desenvolvidas e
deixa clara a necessidade de equilíbrio na economia global. “É
uma oportunidade para as economias emergentes, que devem liderar a recuperação”,
disse Coutinho.

Crise

Jim O’Neill prevê que a crise até mesmo acelere a escalada dos
emergentes, e diz que já em 2020 a economia desses quatro países
encoste nas dos países do G-7, o grupo das atuais nações
mais ricas do mundo.

Não faltam céticos em relação à projeção
de O’Neill. John Bowler, diretor do Serviço de Risco por País
(CRS na sigla em inglês) da Economist Intelligence Unit é um deles.
“Acho que esse processo será mais demorado. Há uma série
de obstáculos à confirmação dessas projeções
tanto no campo econômico quanto político”, disse Bowler. Apesar
das ressalvas feitas por muitos, o “otimismo” de O’Neill não
é isolado.

Um relatório da consultoria Ernst&Young, Global Megatrends 2009,
por exemplo, afirma que “a fome de crescimento, junto com a rápida
industrialização das economias e populações em expansão,
põe os emergentes no caminho da recuperação mais rapidamente,
e os países do BRIC são claramente os atores principais”.

Essa fome de crescimento vem, em parte, da nova classe média que tem
revolucionado o consumo nesses países. Segundo o Banco Mundial, 400 milhões
de pessoas se encaixavam nessa categoria em 2005 nos países em desenvolvimento.
Em 2030, deverão ser 1,2 bilhão de pessoas. “A classe média,
principalmente dos países do BRIC, será o novo motor da economia
mundial”, prevê Stepháne Garelli, da Universidade de Lausane
e diretor do índice de competitividade, publicado pelo Institute of Management
Development, que avalia 61 países em 312 critérios. “É
uma classe média ávida por comprar seu primeiro carro, seu primeiro
celular de última geração. Não é conservadora
como a classe média do atual mundo rico. Ela quer ‘comprar felicidade'”,
acrescentou.

Padrão de vida

O valor do PIB dará posição de destaque a esses países
no ranking global de economias, mas não será suficiente para levar
as populações desses países a padrões de vida próximos
ao dos países hoje considerados ricos.

O PIB per capita da Índia, por exemplo, deverá praticamente
dobrar num período de 15 anos até 2020, segundo um estudo do departamento
de pesquisas do Deutsche Bank. Ainda assim, representará apenas 40% da
renda per capita nos Estados Unidos.

De olho em indicadores como o PIB per capita, Françoise Nicolas, economista
do Instituto Francês de Relações Internacionais, prevê
a ascensão das “superpotências pobres”. “Será
um mundo multipolar bizarro. Os BRIC serão superpotências pobres
com mais peso econômico, mas o discurso ainda não estará
no mesmo nível dos países ricos”, prevê Nicolas.

Além da pobreza, esses países enfrentam outros desafios, como
a proteção ao meio ambiente. “Eles querem ter maior poder
de decisão e, ao mesmo tempo, em certas questões como o meio ambiente,
querem continuar a ser tratados como países emergentes, que não
podem cumprir as mesmas exigências dos ricos”, disse Thomas Klau,
chefe do escritório de Paris do Council of Foreign Relations.

Fonte: BBC Brasil

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