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A escritora Helena Parente Cunha nos fala sobre sua obra

by Lucas Gomes


Helena Parente Cunha

Helena Parente Cunha é baiana de Salvador. A primeira infância,
vivida no bairro do Rio Vermelho, deixou marcas que influenciaram a personalidade
e a obra da escritora. Os estudos, iniciados em Salvador, prosseguiram no Ginásio
Mineiro de Barbacena e no Colégio Bittencourt Silva, em Niterói.
Uma vez mais acompanhando a família, retornou a Salvador, onde fez o
curso de Letras Neolatinas na antiga Faculdade de Filosofia da Universidade
Federal da Bahia, concluído em 1952. Obteve em 1954 uma Bolsa de Estudos
da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Ensino Superior) para se especializar em Língua, Literatura e Cultura
Italiana em Perúgia, Itália, tendo aí recebido seu primeiro
prêmio literário, entre concorrentes de mais de vinte países.

Iniciou a vida profissional no magistério, ensinando italiano
na Faculdade onde se graduou, e francês no Colégio Estadual da
Bahia, contando, entre seus alunos mais famosos, Glauber Rocha e João
Ubaldo Ribeiro.

Ao se casar, em 1958, mudou-se para o Rio de Janeiro e aí
fixou residência. Nos anos 60 dedicou-se à tradução
de livros, ganhou o 1º lugar em concurso de poesia da Secretaria de Educação
e Cultura do Estado e fez as primeiras publicações de poesia e
ensaio em antologia e suplementos literários. Em 1968, ingressou para
a recém-fundada Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, a convite do Professor Eduardo Portella, a fim de participar da sua
equipe de estudos e trabalho. Hoje é Professora Titular de Teoria da
Literatura e, na sua Universidade, alcançou os títulos de Mestrado,
Doutorado, Livre-Docência, Pós-Doutorado. Entre os cargos administrativos
que ocupou, destaca-se o de Diretora da Faculdade de Letras, além de
Diretora Adjunta de pós-Graduação.

Somente no final dos anos 70, Helena deu início à
carreira de ficcionista, tendo ganho importantes prêmios de âmbito
nacional nas categorias conto e romance. A experiência no gênero
lírico imprime as características de sua narrativa, freqüentemente
considerada prosa poética.

Helena viajou várias vezes ao Exterior, com a finalidade
de participar de eventos culturais e congressos, para ministrar aulas, realizar
conferências e divulgar sua obra literária. Seu romance Mulher
no espelho
foi traduzido na Alemanha e nos Estados Unidos. Vários
contos e poemas de sua autoria integram antologias no Exterior. No momento está
sendo preparada na Itália uma antologia de seus contos para uma publicação
bilingue.

Helena Parente Cunha possui 26 livros publicados no Brasil, sendo 6 de poemas,
5 de contos, 9 de ensaios, 5 romances e 1 infantil.

Confira entrevista onde a autora fala sobre sua obra e a Literatura
Brasileira Contemporânea:

Leonardo Campos – Qual a sua definição de Literatura
Brasileira Contemporânea?

Helena Parente Cunha – Para começar nosso bate-papo,
eu diria que tenho certos escrúpulos em “definir” literatura
porque esse termo possui, entre suas possibilidades significativas, algo da
ordem de fixar, marcar. Algo como “enquadrar” a obra aberta, isto
é, a verdadeira obra literária não se limita nem cabe em
fronteiras de sentido, é sempre aberta a múltiplas interpretações.
Para a pujante Literatura Brasileira Contemporânea tenho uma visão
caleidoscópica, em que convivem várias e variadíssimas
tendências estéticas do ponto de vista temático e formal.
O grande número de autores e autoras pós-modernos(as) dão
testemunho da riqueza de nossos livros.

LC – Dos livros publicados, qual deles você mais gosta?
Por quê?

HPC – A depender do momento, quando releio passagens de meus
livros, pode me acontecer de gostar de todos ou, o contrário, detestar
todos e, exatamente por isso, prefiro não reler minhas publicações.
Você não tem idéia do desconforto ou da agonia de dizer,
num arrependimento inútil, “eu não sei como tive coragem
de publicar isso”. Bem, mas de vez em quando, gosto muitíssimo de
As doze cores do vermelho. Pela linguagem poética e pela ordenação
da narrativa em três tempos simultâneos e três vozes responsáveis
pelo desenvolvimento da estória. Talvez goste mais do último,
Caminhos de quando e além, considerado um épico pós-moderno,
em que circulo por vinte séculos e vários personagens históricos,
num diálogo exasperante com o poema “Eros e Psique” e outros
de Fernando Pessoa.

LC – Um de seus livros, A Mulher no espelho, esteve
na lista do Vestibular da Universidade Federal da Bahia há alguns anos
atrás. O que acha disso?

HPC – O romance Mulher no espelho é o carro-chefe
de minha produção literária, embora esteja longe de ser
meu livro preferido. Trata-se de uma narrativa, na qual os abusos da dominação
masculina são representados num tom ácido de revolta e sarcasmo
contra as injustiças impostas a várias camadas de excluídos.
Publicado no início dos anos 80, devido a certas passagens mais ousadas,
o livro chocou e foi considerado indecoroso por muitos, embora tenha recebido
um prêmio importantíssimo e logo tenha sido traduzido para o inglês
e o alemão, além das várias críticas elogiosas de
que foi alvo. Quanto a este livro ter entrado na lista do vestibular da UFBA,
posso garantir que o encontro com aqueles garotos(as) de aproximadamente 16
anos me levou a viver uma das experiências mais significativas de minha
carreira de escritora. Estive em vários colégios, onde os meninos
me crivavam de perguntas de todo tipo, desde as mais inteligentes de quem havia
percebido as nuances das personagens às perguntas mais indiscretas, na
medida em que buscavam na minha vida pessoal as possíveis correspondências
com a trama do livro. Aqueles diálogos com adolescentes foram muito enriquecedores.

LC – Já foi lido em algumas ocasiões, certas
comparações da sua forma de escrever com o estilo de Clarice Lispector.
Concorda ou discorda?

HPC – Esta é uma pergunta difícil de responder.
Mas posso lembrar, não a nível de resposta, mas de registro, que
meu primeiro conto foi escrito imediatamente após a leitura de A
hora da estrela
, de Clarice.

LC – O que diria para os interessados em cursar Letras (estudar
literatura) e publicar livros hoje?

HPC – Um dos aspectos mais importantes do curso de Letras,
incluindo-se o estudo da Literatura, está na abertura de caminhos surpreendentes
para o conhecimento da realidade em geral e do ser humano em particular. Mas
o curso de Letras não é uma oficina para a formação
de escritores, embora sempre haja algum professor ou professora que ministre
esta disciplina.

LC – A internet: seu advento ajudou ou atrapalhou o status
da literatura?

HPC – A internet oferece possibilidades e oportunidades para
a divulgação de textos ou livros gratuitamente e que, pelo esquema
tradicional, dificilmente alcançariam um público tão numeroso.
E´ verdade que muitos preferem o livro na mão. Mas quanto ao status
literário propriamente dito, é necessário que as pessoas
se acostumem com o novo veículo que oferece vantagens extraordinárias.
A obra completa de Freud (Editora Imago), por exemplo, ocupa grande parte de
uma prateleira, enquanto os 24 volumes cabem em apenas um CD-R.

LC – Por fim, suas predileções: quais
são os seus livros de cabeceira?

HPC – Quanto às narrativas, minhas predileções
se voltam para Clarice Lispector, Guimarães Rosa, Machado de Assis. Para
o texto poético, estou com Cecília Meireles, Fernando Pessoa,
Cassiano Ricardo, os concretistas, os trovadores medievais, sobretudo Dante
Alighieri na Vita Nuova. Meus livros de cabeceira? Guimarães Rosa, Clarice
e os ensinamentos do Mestre Saint Germain.

Créditos: Leonardo Campos, graduando em Letras Vernáculas
com Habilitação em Língua Estrangeira Moderna – Inglês
– UFBA | Membro do grupo de pesquisas “Da invenção à
reivenção do Nordeste” – Letras – UFBA | Pesquisador
na área de cinema, literatura e cultura

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