Rosa Parks, presa em 1955, por ato de
desobediência civilPor uma simples questão de lógica,
o cidadão de qualquer país deve obedecer as leis daquele país. Este dever é chamado
de obrigação política e, apenas para exemplificá-lo, podemos citar, no caso brasileiro,
o voto, que é obrigatório para todos os nossos concidadãos dos 18 aos 70 anos
(para quem tem 16, 17 ou mais de 70 é facultativo), de acordo com o artigo 14,
parágrafo primeiro da Constituição federal.Pois bem, considerada a obrigatoriedade de obedecer a lei, torna-se fácil entender o conceito de desobediência civil: trata-se
de não obedecer uma lei, uma regra do ordenamento jurídico do país (todos os códigos legais, a começar da Constituição) com o
objetivo de mostrar publicamente que ela é injusta e levar os legisladores a modificá-la.Por isso, o ato desobediente deve ser acompanhado de justificativas que comprovem que ele é legítimo e justo sob o ponto de vista
ético. Por exemplo, nos anos 1960, jovens americanos queimavam as convocações para ir lutar no Vietnã, explicando, em atos
públicos, porque eram contrários a guerra dos Estados Unidos contra aquele país.Um ato construtivo
Note que a desobediência comum – ultrapassar o sinal vermelho, por exemplo – é uma ação de caráter anárquico e que outras
desobediências ou transgressões podem ter caráter criminoso, pois não têm uma finalidade social. Ao contrário, a desobediência
civil é um ato inovador, de caráter eminentemente construtivo e não destruidor.Justamente por isso chama-se de “civil”: porque quem comete essa desobediência acredita estar cumprindo o seu dever de cidadão,
numa situação ou circunstância em que a lei merece mais ser desobedecida do que obedecida.Quem comete uma transgressão comum procura fazê-lo escondido. Ao contrário, a desobediência civil precisa ganhar o máximo
de publicidade para convencer os outros cidadãos, conquistar maioria ou unanimidade e, assim, atingir suas metas.O direito de ser governado por leis justas
O argumento filosófico que fundamenta a desobediência civil é o seguinte: o cidadão só tem o dever moral de obedecer as leis,
se os legisladores produzirem leis justas.Afinal, entre o cidadão e o legislador existe uma relação de reciprocidade: se o legislador tem de ser obedecido, o cidadão,
por sua vez, tem o direito de ser governado com ética e sabedoria.A concepção mais moderna de desobediência civil foi formulada no ensaio “Civil Disobedience”, do escritor norte-americano
Henry David Thoreau, publicado em 1849. Ele o escreveu ao se recusar a pagar taxas ao governo de seu país, que as empregava
numa guerra movida injustamente contra o México.Diante das conseqüências de seu próprio ato, que poderia levá-lo à prisão, Thoreau declarou: “Quando um governo prende
injustamente qualquer pessoa, o lugar de um homem justo é a prisão”.Isso significa que a desobediência civil – questionando um ponto específico do ordenamento jurídico de um país – pressupõe
que o desobediente aceite a conseqüente punição de seu ato, pois reconhece que o Estado tem o direito e a obrigação de punir
quem descumpre a lei.Atualmente, chama-se a isso de desobediência civil passiva e se reconhece a existência de uma desobediência civil ativa, em que
os desobedientes se vêem no direito de subtrair-se às penalidades legais.Ação exemplar
Resumidamente, a desobediência civil visa substituir o discurso de protesto pela ação exemplar. Por isso mesmo, é importante
dar exemplos de atos de desobediência civil.Entre eles, podem-se citar as diversas campanhas do líder indiano Mohandas Gandhi, contra o regime do apartheid na África do
Sul ou na campanha pela independência de seu país.Gandhi incorporou à noção de desobediência civil o caráter de não-violência. A desobediência civil é feita de atos pacíficos e
seus praticantes não reagem à repressão quando a ela são submetidos.Outro exemplo histórico digno de nota é o da luta pacífica empreendida pelos negros norte-americanos, agrupados em torno do
pastor luterano Martin Luther King, para conquistar seus direitos políticos e sociais, nos Estados Unidos dos anos 1950/1960.Lá, nessa época, os negros eram considerados cidadãos de segunda categoria e estavam sujeitos não só à discriminação como a toda
sorte de perseguições e humilhações.Rosa Parks
Entre outras, deviam ceder os lugares nos ônibus para os brancos, para estes viajarem com maior conforto. Os negros que ficassem
de pé. Pois bem, no Alabama, em 1 de dezembro de 1955, uma mulher negra de 42 anos chamada Rosa Parks recusou-se a ceder seu
assento a um branco. Foi presa e obrigada a pagar uma fiança de U$ 14,00 (valor significativo à época).Seu gesto de desobediência, porém, deu início à campanha que, liderada por King, daria aos negros americanos os mesmos direitos
dos cidadãos brancos. De lá para cá, as coisas mudaram muito.O racismo ainda existe, mas uma das principais assessoras do presidente norte-americano George W. Bush, que já chegou a ser
cotada para sucedê-lo na próxima eleição, é uma mulher negra: Condoleeza Rice.