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A Guerra do Paraguai

by Lucas Gomes

A Invasão do Uruguai e o Início da Guerra do Paraguai


Os três chefes de Estado do Brasil, Uruguai e Argentina, numa caricatura
da revista A Semana Ilustrada, 1865

Entre ultimatos e pedidos de punição ocorreu uma temporária invasão do Uruguai.
É provável que Solano
López
tenha entendido esta ação militar brasileira como sinal de expansionismo
em marcha que, logo alcançaria o Paraguai. Em 10 de novembro, por ordem das autoridades
paraguaias, mesmo antes do rompimento diplomático com o Brasil, foi aprisionado
o navio do Império Marquês de Olinda, que subia o Rio Paraguai na direção de Mato
Grosso. O conflito logo se deflagrou. A 23 de dezembro de 1864 as tropas paraguaias
lançaram, com sucesso, uma ofensiva contra Mato Grosso. Em abril de 1865, mesmo
sem consentimento, as forças de López avançam pelo território argentino visando
atacar o Rio Grande do Sul e o Uruguai. Comentava-se que Solano López talvez imaginasse
que a vitória obtida no ataque a Mato Grosso levaria o Brasil a acertar um acordo
com o Paraguai que, contando com o apoio dos blancos uruguaios e das províncias
argentinas opositoras a Mitre, se transformaria, então, em uma força importante
no jogo político do continente. Entretanto os fatos seguintes não realizariam
o desejo de López: o suporte argentino, tão esperado, não se concretizou, e no
Uruguai o poder fora ocupado pelo colorado Venâncio Flores com o auxílio do Brasil.


H. Fleiuss, D. Pedro, o primeiro dos heróis, A Semana Ilustrada, 1865.

Nos primeiros anos da guerra todos os atos se transformaram em marcas de heroismo e patriotismo

No dia 1º de maio de 1865 era assinado o Tratado secreto da Tríplice Aliança pelos
governos da Argentina, do Brasil e do Uruguai, sendo o comando das forças aliadas
entregue ao Presidente argentino Mitre. Constava no Tratado a determinação, entre
outros itens, de que a paz só seria negociada após a deposição de López. O Paraguai
também era sentenciado, por ter sido a nação agressora, a pagar os altos custos
decorrentes do conflito. Os aliados, considerando a vantagem numérica militar
em relação ao inimigo, tinham como expectativa que o conflito não se alongaria
muito. O próprio Imperador, transformado no “senhor da guerra”, no dizer da historiadora
Lília Moritz Schwarcz, escreveria do cenário do conflito, para onde se deslocara
sem ouvir objeções do seu Gabinete, em 7 de julho de 1865: “A guerra vai bem e
espero que pouco durará.” Esta postura se opunha à imagem de um monarca civil
avesso “à mais rudimentar experiência da guerra”, e geraria inúmeros comentários.
Dizia-se que D. Pedro II assumira a condição de “voluntário número um” até porque,
nas imagens oficiais daquela época, aparecia sempre vestido para combate. O otimismo
quanto à duração do conflito alcançava o plano econômico, pois os aliados contabilizavam
lucros obtidos no comércio exterior, além do fato de a guerra envolver grandes
negócios, que incluíam armas, víveres etc.

O Exército imperial constituira-se inicialmente apenas com o efetivo oriundo das milícias da Guarda
Nacional de São Paulo, Minas Gerais e Goiás. Mais adiante utilizaria o recrutamento. Este, no primeiro ano,
quando a guerra era vista como uma “cruzada patriótica”, era realizado voluntariamente. O Major Cristiano
Pletz, considerado herói da Guerra do Paraguai, registrou em suas Memórias:

(…) O Governo do Império, dispondo senão de uns 10 ou 12 mil homens do Exército, convidou o povo
brasileiro a se apresentar voluntariamente para defesa da Pátria (…)

(…) Na vérpera da partida (…) jovens e senhoritas (…) jogavam flores. – Alegre… triste baile de
despedida (…).

(…) Seguimos (…) para o quartel do Campo de Santana (…) achava-se em organização o 2º Batalhão de
Voluntários sob o comando do Tenente-Coronel Manuel Deodoro da Fonsecsa (…).

Logo o recrutamento tornou-se compulsório. A imprensa na Corte publicava nota no Opinião Liberal, a 13 de
dezembro de 1867: Foi resolvido em Conselho de Ministros a desapropriação de 30.000 escravos para formarem
um novo exército libertador do Paraguai. (…) Com tal exército, espera o governo salvar a honra do país e
desagravá-lo das ofensas recebidas.
Tal forma de recrutamento envolvia diretamente a propriedade
servil. Apesar de bem pagas, estas desapropriações traziam inconvenientes pois era difícil, muitas vezes
quase impossível, substituir a mão-de-obra. Por outro lado, bem mais grave para a estrutura econômica do
Império era o que o historiador Nelson Werneck Sodré considerava “estímulo implícito que o processo
conferia à extinção do escravismo”, e que ficaria visível e evidente após o encerramento do conflito.

A GUERRA DO PARAGUAI

Nos anos 60 do século XIX uma nova crise na região do Prata se transformaria no em longo e sangrento
conflito conhecido como a Guerra do Paraguai. Este episódio durante algum tempo, foi entendido pelo lado
brasileiro como uma luta realizada contra o ditador Solano López e seus planos expansionistas. Mais
adiante, na década de 1960, segundo a versão de historiadores como o argentino León Pomer, a razão da
guerra seria relacionada aos interesses ingleses, que viam com desagrado a crescente autonomia paraguaia.
Assim, havia uma emergente necessidade, por parte do Governo inglês, de desarticular o Paraguai, mantendo
o controle econômico sobre a América Latina.


O Comércio inglês oferecendo produtos manufaturados ao mundo

Recentemente a historiografia passou a concentrar-se mais atentamente na situação
de cada país envolvido no conflito, bem com nas relações que mantinham entre si
sem, entretanto, negar a significativa influência do capitalismo inglês, naquela
época, na América Latina. De acordo com esta linha historiográfica, formara-se
uma zona de disputas e discórdias em torno dos rios Paraguai e Uruguai que remonta
à época das Américas portuguesa e espanhola. As tensões prosseguiram com outros
contornos no decorrer do tempo. Com o término da dominação espanhola, no início
do século XIX, surgiram na região do vice-reinado do Prata, após muitas lutas,
o Uruguai, o Paraguai, a Bolívia e a Argentina.

Neste período coexistiram na Argentina correntes políticas divergentes. Uma delas era composta pelos
comerciantes de Buenos Aires, que defendiam um Estado centralizado e unitário, pois, pelo porto de Buenos
Aires, controlariam o comércio exterior e, conseqüentemente, as rendas dos tributos sobre as importações.
A outra corrente era federalista, sendo composta pelos grandes proprietários rurais, pequenos industriais
e um grupo de comerciantes mais voltados para o mercado interno. Defendiam, através do Estado
descentralizado, que suas rendas não fossem submetidas aos tributos estabelecidos pela burguesia comercial
de Buenos Aires.


Postos de comerciantes no rio Paraná, no século XIX

O Uruguai, por sua vez, nascera em 1828, após conflitos que envolveram o Brasil,
em uma área onde os ingleses tinham diversos interesses financeiros e comerciais.
Disputando o poder político uruguaio formaram-se duas facções: os blancos, grupo
composto por proprietários rurais, e os colorados, ligados aos comerciantes, simpatizantes
das idéias liberais.

Quanto à Província do Paraguai, desde 1810, recusava-se a submeter-se à burguesia formada pelos
comerciantes do porto de Buenos Aires. Sua independência seria definida quando da designação para a
Presidência de Carlos Antonio López, em 1842. Aos poucos o Paraguai procurava crescer vinculando-se ao
mercado externo. Buscando romper o isolamento do país, Carlos Antonio López instalou linhas telegráficas,
construiu estradas de ferro, modernizou a esquadra, estabeleceu fábricas de tecidos, papel, tinta e
pólvora. Por volta de 1862, seu filho Francisco Solano López ascendeu ao poder, procurando novas
alternativas para prosseguir no desenvolvimento do Paraguai.

O Governo imperial do Brasil via com preocupação alguns aspectos deste quadro político traçado por seus
vizinhos da América Latina. Temia, por exemplo, que a Argentina, transformada em uma República forte, fosse
capaz de causar problemas junto à “inquieta” Província do Rio Grande do Sul. Por outro lado, quanto ao
Uruguai, a preocupação relacionava-se às medidas de repressão ao contrabando na fronteira, já que muitos
gaúchos, criadores de gado, tinham interesses econômicos naquele país. O Governo do Brasil chegou,
inclusive, a promover acordos secretos com os colorados com os quais tinha interesses comuns. Comentava-se
que alguns “acertos” teriam sido intermediados por Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá,
proprietário de um banco no Uruguai.

Com o Paraguai, o Brasil volta e meia via-se envolvido em atritos e desentendimentos. Algumas divergências
relacionavam-se às questões de fronteira e à vontade do Brasil em garantir o acesso a Mato Grosso pelo Rio
Paraguai. Uma viagem, por terra, do Rio de Janeiro até Mato Grosso demorava, em média, quatro meses e meio.
Já a ligação fluvial cobria o percurso em menos tempo.


Imperador D. Pedro II sendo aclamado pela população por se negar a pedir desculpas à Marinha Britânica

No início da década de 60 do século XIX, uma sucessão de fatos definiria algumas
posições e acirraria antigas rivalidades. Em 1863 o Governo imperial, após inúmeros
incidentes que envolveram a atuação do embaixador inglês e a ação da Marinha inglesa
fundeada no Rio de Janeiro que apreendera embarcações brasileiras, rompeu relações
diplomáticas com a Inglaterra. Isto distanciou a posição brasileira dos interesses
ingleses gerando um clima de “exaltação patriótica”, no dizer de Bóris Fausto.
Na Argentina reunificada, Bartolomeu Mitre era eleito Presidente. A política assumida
pelo novo governante argentino que agradou ao Gabinete do Brasil, conduzido neste
momento pelos liberais, incluía a aproximação com os colorados uruguaios e, também,
a defesa da livre navegação nos rios da bacia do Prata. Solano López, por sua
vez, aliou-se aos blancos, então no poder no Uruguai, e aos adversários de Mitre
na Argentina.

Segundo a historiadora Lilia Moritz Schwarcz (…) “o cenário da guerra estava montado e só faltava o
estopim” que surge em setembro de 1864 quando uma esquadra comandada pelo Almirante Tamandaré é enviada ao
Uruguai, onde os blancos estavam no poder, para averiguar supostas violências praticadas contra brasileiros
que lá moravam.

Fonte: Secretaria da Educação do Rio de Janeiro

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