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Oaristos, de Eugênio de Castro

by Lucas Gomes

A obra Oaristos,
coletânea poética de Eugênio de Castro que introduz em Portugal uma nova corrente
estética de nome Simbolismo, foi considerada um escândalo literário.

Eugênio de Castro não pensava adotar os princípios filosóficos dos simbolistas
franceses, naquela época fonte de imitação, nem desejou modelar-se pelo espírito
da décadence. Mas antes quis aproveitar o seu aspecto expressivo, pela
novidade do estilo e dos temas. Oaristos é uma tomada de posição contra os
lugares-comuns que caracterizavam a poesia portuguesa, as rimas habituais, o
vocabulário pobre. E propõe uma nova maneira.

Essa nova maneira, desfavorável ao excesso ultra-romântico e parnasiano,
encontrou-a Eugênio de Castro no simbolismo. Este apelou para o vago, o
misterioso, o ímpar, aquilo que não tem possibilidade de ser transformado numa
perfeita jóia lapidada. Nada do velho culto romântico da natureza, do idealismo
amoroso, nada de emotividades exaltadas e ocas, desprezo pela postura e
linguagem solenes.

Diz Eugênio de Castro que o vocabulário dos Oaristos é escolhido e
variado. Empregou vocábulos raros porque às perífrases prefere “o termo preciso”,
porque pensa “como Baudelaire, que as palavras, independentemente da idéia que
representam, têm a sua beleza própria”.

Numa carta a Pinheiro Chagas, Eugênio de Castro falou sobre Oaristos:
“livro de revolta, feito com alma ardente e mocidade viva, pendão vermelho de
combate contra a sensaboria, contra a chateza da poesia do meu tempo. (…)
Livro novo, diferente de todos os livros, abrindo um caminho, achando uma
solução, dizendo coisas novas por processos novos”.

Ao prólogo de Oaristos faltou a segunda intenção do simbolismo. Ensinou a
fazer versos, deu diretrizes, mas apenas a nível formal. Os temas das poesias do
livro desenvolveram-se através da sugestão do espaço real ou fictício que foi dado
pela musicalidade das palavras. No poema Sonho as palavras criaram uma
atmosfera sensual, as complexidades do real estavam harmonizadas numa síntese
superior. Mas o fundamento filosófico, a linha-guia do pensamento, estavam
simplesmente ausentes. Notou-se uma exacerbação das imagens, da sonoridade, em
detrimento de uma idéia, do tema em si.

Poema escolhido:

Um Sonho

Na messe, que
enlourece, estremece a quermesse…
O sol, o celestial girassol, esmorece…
E as cantilenas de serenos sons amenos
Fogem fluidas, fluindo à fina flor dos fenos…

As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros…
Cornamusas e crotalos,
Cítolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves.

Flor! enquanto na messe estremece a quermesse
E o sol, o celestial girassol esmorece,
Deixemos estes sons tão serenos e amenos,
Fujamos, Flor! à flor destes floridos fenos…

Soam vesperais as Vésperas…
Uns com brilhos de alabastros,
Outros louros como nêsperas,
No céu pardo ardem os astros…

Como aqui se está bem! Além freme a quermesse…
– Não sentes um gemer dolente que esmorece?
São os amantes delirantes que em amenos
Beijos se beijam, Flor! à flor dos frescos fenos…

As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros…
Cornamusas e crotalos,
Cítólas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves…

Esmaiece na messe o rumor da quermesse…
– Não ouves este ai que esmaiece e esmorece?
É um noivo a quem fugiu a Flor de olhos amenos,
E chora a sua morta, absorto, à flor dos fenos…

Soam vesperais as Vésperas…
Uns com brilhos de alabastros,
Outros louros como nêsperas,
No céu pardo ardem os astros…

Penumbra de veludo. Esmorece a quermesse…
Sob o meu braço lasso o meu Lírio esmorece…
Beijo-lhe os boreais belos lábios amenos,
Beijo que freme e foge à flor dos flóreos fenos…

As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros…
Cornamusas e crotalos,
Cítolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves…

Teus lábios de cinábrio, entreabre-os! Da quermesse
O rumor amolece, esmaiece, esmorece…
Dá-me que eu beije os teus’ morenos e amenos
Peitos! Rolemos, Flor! à flor dos flóreos fenos…

Soam vesperais as Vêsperas…
Uns com brilhos de alabastros,
Outros louros como nêsperas,
No céu pardo ardem os astros…

Ah! não resistas mais a meus ais! Da quermesse
O atroador clangor, o rumor esmorece…
Rolemos, b morena! em contactos amenos!
– Vibram três tiros à florida flor dos fenos…

As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros…
Cornamusas e crotalos,
Citolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves…

Três da manhã. Desperto incerto… E essa quermesse?
E a Flor que sonho? e o sonho? Ah! tudo isso esmorece!
No meu quarto uma luz luz com lumes amenos,
Chora o vento lá fora, à flor dos flóreos fenos…

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