Hélio Pólvora, escritorHélio Pólvora (1928) costuma identificar-se como “um pobre homem de Itabuna”, parodiando Eça de Queiroz. Diz também que saiu do “ventre dos cacauais”. Itabuna é uma cidade ao sul da Bahia, centro comercial da Região Cacaueira.
Pólvora aprendeu as primeiras letras com a mãe, decifrando manchetes de jornais. Mais adiante leu a pequena biblioteca familiar, fez o curso primário na cidade e o secundário, a partir de 1942, em Salvador, Bahia. Voltou à sua aldeia em 1947, praticou jornalismo em Voz de Itabuna, um semanário, e a 16 de Janeiro de 1953 chegava ao Rio de Janeiro – cinco dias antes da morte de Graciliano Ramos, com quem pretendia conversar. Passou por quase todas as redações cariocas, assinou rodapés de crítica literária e iniciou-se na prosa de ficção.
Alguns livros: Os Galos da Aurora (1950), Estranhos e Assustados (1966), Noites Vivas (1971), Massacre no km 13 (1978), O Grito da Perdiz (1982), Mar de Azov (1986) e Xerazade (1990) – todos eles de histórias curtas e novelas.
Retornou à Bahia após 32 anos. Ainda faz jornalismo em Salvador e atualmente preside a Fundação Cultural de Ilhéus.
Leonardo Campos – É uma pergunta que está tornando-se trivial, mas creio que seja fundamental fazê-la: segundo sua visão experiente com a literatura, ainda há espaço para a mesma na vida das pessoas após toda essa revolução tecnológica em que estamos inseridos?
Hélio Pólvora – Creio que ainda há espaço, neste nosso mundo globalizado, alienado, hedonista. Mas os escritores de tutano, outrora apontados nas ruas como celebridades, outrora competidores de atrizes e divas na mídia, vivem hoje em catacumbas, sem rádio de pilha e muito menos telefones móveis. Encontram-se ao redor de fogueiras e, acocorados, lêem entre si o que escreveram na pedra. Mais do que nunca, a literatura é doença, é fatalidade.
LC – Em sua opinião, quem é o melhor representante da literatura brasileira de todos os tempos?
HP – Machado de Assis, um mulato pobre, autodidata, que aprendeu a escrever. E como! Não há outro. Este, no conto, está à atura de Edgar Poe, Maupassant, Tchékhov. E deixou três romances que marcam presença no ficcionismo daquele século.
LC – Baseado em textos e algumas entrevistas suas, nota-se certa admiração pelo escritor Graciliano Ramos. Isso é fato ou apenas coincidência?
HP – Graciliano é o expoente do romance de 30. Com a virtude suprema de ter avançado do regionalismo estreito para os desfiladeiros da arte psicossocial. É verdadeiro, enxuto, expressivo. Com grande economia verbal, dá lições de densidade, de significados.
LC – Como o senhor classifica as adaptações de obras literárias? Acredita que adaptações colaboram com a disseminação e facilitação dos textos para a sociedade?
HP – Adaptação de obra literária será sempre uma “leitura” particular atribuída ao roteirista. É a visão dele, que não será necessariamente a do autor, nem a do leitor-ouvinte- espectador. Mas, em país de leitores escassos, as adaptações ajudam a empurrar a literatura goela a baixo, a divulgá-la. Uma advertência, porém: existem adaptações criminosas, que falseiam e deturpam. Melhor ficar com o original. Eu só admito adaptações para o teatro e o cinema.
LC – Quem o senhor não indicaria como boa leitura hoje?
HP – Ah, muitos escritores… Há mais escritores do que leitores. Todos imitam os orangotangos: esmurram o peito e urram. Já não tenho tempo para os escritores novos, quase todos donos da verdade, senhores de descobertas e conquistas, sinalizadores de vanguardas que só existem para eles. Há alguns bons copistas. O mais detestável, no entanto, é essa literatura de auto-ajuda, além do famigerado best-seller. Contribui para imbecilizar ainda mais a sociedade.
Créditos: Leonardo Campos, Graduando em Letras Vernáculas com Habilitação em Língua Estrangeira Moderna – Inglês – UFBA | Membro do grupo de pesquisas “Da invenção à reivenção do Nordeste” – Letras – UFBA | Pesquisador na área de cinema, literatura e cultura